O governador do Estado venezuelano do Zulia, Francisco Arias Cárdenas, confirmou nesta terça-feira (04/06) que vai implementar um sistema de automatização entre supermercados para controlar a compra de produtos básicos. Com a medida, a venda de itens cujo preço é controlado pelo governo e que desaparecem rapidamente das prateleiras, seria monitorada pelo sistema, evitando que os consumidores superem a quantidade máxima de compra em diferentes supermercados.
O objetivo, segundo Cárdenas, é impedir o contrabando de produtos básicos para a Colômbia e evitar as longas filas nos comércios. O sistema, que seria implementado de forma piloto a partir da próxima semana em cerca de 60 supermercados dos municípios de Maracaibo e San Francisco, permitiria que dados como horário da compra e quantidade de produtos adquiridos por cada consumidor fossem registrados pelos caixas.
Luciana Taddeo/Opera Mundi
Fila no Grande Abasto Bicentenário, hipermercado em Caracas, que vende produtos a preços controlados ou subsidiados
Desta forma, 20 produtos da cesta básica e de higiene pessoal cujos preços são controlados pelo governo, como papel higiênico, pasta de dente, leite, açúcar, café, azeite, margarina, arroz e farinha de milho pré-cozida – ingrediente das tradicionais arepas – seriam monitorados. Segundo o jornal regional Panorama, considera-se limitar, por exemplo, a venda de frango a sete quilos por semana, ou cinco unidades de cada produto regulado, em igual período, para cada consumidor.
“Fizemos uma análise bem séria e todo este plano foi muito bem articulado”, garantiu o secretário de governo de Zulia, Blagdimir Labrador, explicando que o limite de unidades de cada produto será estipulado com base em dados do Ministério de Alimentação e do Índice Nacional de Nutrição quanto à média de consumo.
A medida foi rechaçada por opositores e comparada por alguns ao sistema cubano de racionamento de produtos subsidiados vendidos à população. Cárdenas, que é chavista, respondeu às críticas e afirmou que é preciso estabelecer normas. “Não estamos racionando, estamos garantindo que haja [nos supermercados] tudo o que é necessário para comer todos os dias”, garantiu.
Segundo o governador, os produtos monitorados serão somente os que têm preços controlados pelo governo e a medida garantirá a segurança alimentar local. “As pessoas precisam comprar um pacote de farinha todos os dias? É lógico que comprem uma garrafa de azeite todos os dias? Como controlamos?”, questionou, em declarações à imprensa local.
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De acordo com ele, mecanismos de controle de saída de alimentos à Colômbia, país com o qual o estado faz fronteira, já vêm sido aplicados, mas o governo está atuando para evitar que “pessoas de bem” façam filas ao lado de contrabandistas. “Estou disposto a correr os riscos de brigar com as máfias”, garantiu, afirmando em alguns centros de distribuição os produtos são desviados “pelos fundos, durante a noite”, para serem vendidos ao país vizinho.
Além do problema de contrabando, denunciado por Cárdenas, o Estado ainda sofre com “filas imensas” para as compras, brigas pela aquisição de produtos e a venda fora dos supermercados a valores muitos superiores aos determinados pelo governo. O problema também é vivido em outros Estados do país, apesar do gradual aumento da presença de alimentos e de produtos de higiene pessoal nos supermercados.
Caracas
Nesta terça-feira, Opera Mundi presenciou a disputada de consumidores pela farinha de milho pré-cozida no supermercado estatal Grande Abasto Bicentenário, em Caracas, apesar do constante abastecimento do produto no local. Um funcionário que distribuía os pacotes de farinha foi cercado por um grupo de pessoas ansiosas, que levantavam as mãos, pedindo o item. Minutos depois, o grupo se dispersou, deixando uma grande quantidade de pacotes para trás.
“Há quatro meses, um carregamento de 900 a mil quilos de farinha de milho pré-cozida, em um supermercado, durava cerca de dois dias. Agora dura duas horas”, afirmou o presidente da rede de Abastos Bicentenário e vice-ministro de Políticas Alimentares Rafael Coronado Patiño, que falava com a imprensa estrangeira no local. “Quando há abastecimento normal de um produto e começa a surgir um rumor de que ele vai faltar, as pessoas por nervosismo, por angústia, saem e compram mais do que precisam”, explicou.
Luciana Taddeo/Opera Mundi
Coronado: rumor de desabastecimento leva as pessoas a comprarem mais do que precisam “por nervosismo, por angústia”
As filas para os caixas do supermercado na capital venezuelana também eram longas. Inaugurado pelo governo venezuelano em 2010, o Grande Abasto Bicentenário vende produtos a preços controlados ou subsidiados. Segundo estimativas da rede, que conta com mais de 40 unidades em 15 estados do país, a diferença de preço em relação aos mercados tradicionais entre 25 e 30% na compra de alimentos. Com a recente aprovação de novos recursos para a rede, a quantidade de comércios e centros de distribuição deve ser ampliada.
Para evitar o desabastecimento da rede, alguns produtos têm compra limitada em uma quantidade máxima de itens. “Implementamos este mecanismo porque detectamos que algumas pessoas compram para revender”, explica, afirmando que o controle do número de itens se destina aos produtos cujos preços são controlados, como leite, azeite, farinha, margarina, açúcar. “É uma questão complexa, estamos fazendo o esforço para que todos possam levar alimentos aos seus lares”, explicou.
Luciana Taddeo/Opera Mundi
Venezuelanos disputam pacotes de farinha de milho pré-cozida no Grande Abasto Bicentenário, hipermercado em Caracas
Coronado afirmou que os meios de comunicação também contribuem para a sensação de temor na população de que os produtos vão desaparecer das prateleiras, e consequentemente, para as compras exageradas. “As pessoas ficam angustiadas e isso também desajusta a economia familiar, porque utilizam recursos para comprar produtos que têm estocado”, disse. “Há dificuldades, mas se tivesse desabastecimento, não teria produtos em nenhum lugar. Os ambulantes vendem todo tipo de produtos que faltam. Como é possível? Existe manipulação por um setor”, explicou.
Segundo o vice-ministro, existem problemas pontuais de produção, mas os diálogos do governo com o setor privado ajudaram a diminuir a ansiedade entre a população. “Isso ajudou também a melhorar as falhas de abastecimento que podiam estar acontecendo em alguns setores. As pessoas estão mais calmas, há um mês tinha muita angústia, as portas [dos supermercados] abriam e as pessoas entravam correndo. Mesmo nas redes privadas, há um comportamento normal quanto a esses ramos. Esta aproximação com o setor privado teve um efeito positivo”, atestou.