Durante a campanha eleitoral que reconduziu Michelle Bachelet à Presidência do Chile, a líder de esquerda prometeu reformar a lei antiterrorista do país, criada por Augusto Pinochet (1973-1990) e vigente até hoje. A intenção era dar maior proteção ao povo mapuche, que, desde o final da ditadura, foi alvo de mais de dois terços dos casos em que o Estado chileno aplicou essa lei.
As dezenas de bombas que explodiram em Santiago desde julho deste ano, especialmente a do atentado que feriu 13 pessoas numa estação do metrô em setembro, porém, levaram o atual governo a tentar incluir na nova lei antiterrorista uma reforma do sistema de inteligência, cujo coração é a ANI (Agência Nacional de Inteligência, órgão que substituiu os serviços secretos como a DINA e a CNI, responsáveis pelas torturas e assassinatos durante a ditadura).
Agência Efe
A reforma da lei antiterrorista do país, vigente desde a ditadura Pinochet (1973-1990), foi uma promessa da presidente Bachelet
Responsável por esse trabalho, o ministro do Interior e da Segurança Pública, Rodrigo Peñailillo, programou para o fim de setembro a apresentação das novas medidas. No entanto, o anúncio vem sendo seguidamente adiado.
No começo do debate, antes da série de bombas na capital, o governo contava com o respaldo das frentes partidárias de esquerda e dos movimentos sociais, por levar adiante o tema em favor de um novo trato com as comunidades mapuches. Com a inclusão da reforma da ANI, porém, começaram a surgir questionamentos, sobretudo de organismos historicamente ligados à defesa dos direitos humanos, devido à uma ideia apresentada por Peñailillo, de que a inteligência chilena voltaria a utilizar agentes infiltrados em organizações sociais e grupos políticos apartidários.
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A jornalista Gabriela Zuñiga, porta-voz da AFDD (Associação de Familiares de Detidos Desaparecidos do Chile), afirmou que “por muito que apoiemos iniciativas importantes do governo de Bachelet em matéria de direitos humanos, não podemos esconder o temor de que voltemos a ver práticas do Estado que não deveriam nem sequer ser cogitadas, porque ainda há feridas abertas de outros tempos”. Sua declaração faz alusão ao fato de que, dias antes de Peñailillo falar sobre novos planos para a ANI, a presidente anunciou o projeto de derrogação da Lei de Anistia.
Por outro lado, também existem pressões de direita sobre as iniciativas do ministro do Interior. Apesar de ser um dos líderes da oposição, o senador Alberto Espina (do partido Renovação Nacional, o mesmo do ex-presidente Sebastián Piñera) passou a ser um dos mais insistentes defensores da restruturação da ANI, segundo os parâmetros inicialmente cogitados por Peñailillo, e o cobra insistentemente em suas declarações públicas. “Estamos esperando a firmeza do ministro em concretizar as esperanças que gerou nos chilenos quando afirmou que irá combater o terrorismo desde a raiz, torcendo para que ele não ceda à pressão dos que defendem os ‘violentistas’”, disse em entrevista para o canal estatal TVN, no último domingo (26/10).
[Vigente até hoje, lei antiterrorista chilena foi criada ainda durante a ditadura de Augusto Pinochet]
Nesta quinta-feira (30/10), Peñailillo ganhou um pouco mais de tempo, durante a visita de Estado da presidente Michelle Bachelet à Espanha, quando assinou um tratado de cooperação em temas de segurança e prevenção ao terrorismo com seu colega Mariano Rajoy, e que levará uma delegação de autoridades espanholas ao Chile, na próxima semana, para uma série de reuniões com especialistas e autoridades responsáveis pelas políticas de segurança pública chilena.
Assim, a assessoria de imprensa do Ministério do Interior comunicou que a apresentação do novo projeto de lei antiterrorista será finalmente na próxima segunda-feira (3/11), aproveitando o regresso de Bachelet de sua viagem à Europa, enquanto as medidas para a reformulação dos organismos de inteligência e combate do terrorismo só serão decididas e anunciadas durante o mês de novembro, logo de se observar a experiência espanhola e adaptar algumas de suas medidas.