O STF (Supremo Tribunal Federal) autorizou nesta quinta-feira (6) a extradição do major uruguaio Manuel Cordeiro Piacentini. Acusado de envolvimento em diversos crimes durante a operação Condor, cooperação entre regimes militares sul-americanos para a perseguição de opositores na década de 1970, ele deverá ser entregue à Justiça da Argentina.
A decisão é um precedente que pode provocar uma reviravolta no caso de desaparecidos políticos no Brasil durante a Ditadura Militar (1964-1985). Por 6 votos a 3, os ministros entenderam que o sequestro de pessoas até hoje não encontradas, vivas ou mortas, é um crime em andamento, e, portanto, não está sujeito à prescrição ou anistia.
Foi com base nessa tese, levantada pelo então procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, que a Procuradoria Militar reabriu a apuração sobre o desaparecimento de 25 pessoas que estiveram presas no DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna), um dos principais centros de repressão do regime militar em São Paulo, entre 1969 e 1976.
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O caso
O julgamento da extradição de Piacentini foi retomado com o voto-vista do ministro Eros Grau, que seguiu a divergência iniciada por Cezar Peluso, entendendo que o militar reformado, hoje com 70 anos, deveria ser entregue à Argentina. Ele é acusado pela Justiça daquele país de ter seqüestrado, em julho de 1976, Simón Riquelo, filho de uma militante de esquerda morta pela ditadura argentina.
O menino tinha 20 dias de idade quando foi deixado na calçada de um hospital de Buenos Aires e posteriormente levado à adoção. Só aos 26 anos, Simón, rebatizado como Aníbal Armando Parodi, descobriu sua verdadeira identidade. Com esse novo entendimento, o prazo de prescrição do crime de sequestro só passou a contar quando Simón soube a verdade.
Em outubro do ano passado, Peluso rejeitou a tese defendida pelo relator do processo, ministro Marco Aurélio Mello, de que a Lei de Anistia brasileira impediria que o crime pudesse ser punido no país —o que é uma condição indispensável para a extradição. “Este Tribunal não pode dizer como outro Estado deve encarar seu passado e sua história”, afirmou na época.
Ele também discordou da argumentação do relator sobre a prescrição do crime, que não se trataria de seqüestro, mas de homicídio — delito cujo autor não pode ser mais punido passados 20 anos do crime. Marco Aurélio sustentou que o fato de ter sido declarada a “morte presumida” de Simon, meses após seu seqüestro, transformaria o caso em homicídio e não subtração de menor.
Prescrição
Peluso contra-argumentou que não houve uma sentença da Justiça argentina declarando o dia da suposta “morte” da criança, o que seria essencial para a determinação do prazo de prescrição. E como ele só tomou consciência em 2002, começaria a partir daí o prazo para prescrição.
Marco Aurélio havia usado a mesma tese para desqualificar o pedido com relação a outros dez desaparecimentos de que o major teria participado, já que essas pessoas nunca foram encontradas, e se enquadrariam, portanto, no conceito de morte presumida.
Além de Peluso e Eros Grau, votaram pela extradição de Piacentini, os ministros Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Joaquim Barbosa e Carlos Ayres Britto. Presidente do Supremo, o ministro Gilmar Mendes acompanhou o relator, assim como havia feito o ministro Menezes Direito. Ellen Gracie e Celso de Mello não votaram.
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