Apesar do frio e do mau tempo, centenas de estudantes, militantes, representantes de organizações sindicais e de direitos humanos da Argentina lotaram a Plaza de Mayo, enquanto outros plantaram uma árvore na esquina das ruas 66 e 137 de La Plata, capital da província de Buenos Aires. A causa da manifestação feita ontem (18) são os três anos de desaparecimento do argentino Jorge Julio López.
Naquela mesma esquina, o aposentado, que é testemunha de um processo chave contra os crimes cometidos na última ditadura da Argentina (1976-1983), foi visto pela última vez com vida. A justiça argentina desconhece seu paradeiro e também não sabe dos seqüestradores. Esse caso não resolvido não provoca medo apenas nas testemunhas, mas também problemas entre os próprios membros do poder judiciário, conforme denunciam as entidades de direitos humanos.
“Juízes e promotores brigam por não terem uma resposta”, denunciou a advogada do coletivo Justiça Já Guadalupe Godoy. A causa havia sido encaminhada primeiro para um juiz da província de Buenos Aires, depois passou para as mãos de um juiz federal, Arnaldo Corazza, que em fevereiro passado se recusou a continuar com o caso porque a família de López fez críticas a ele por conta da falta de progressos.
Em março, outro juiz federal, Manuel Blanco, pegou o processo e ordenou ao promotor Sergio Franco que fizesse a investigação, mas o funcionário recusou por três vezes, Nesta semana, seis meses depois, a Câmara Federal de Investigação retificou que Franco deveria apurar o crime. O coletivo de Godoy apresentou uma denuncia à Corte Suprema da Argentina por “atraso e falta de Justiça”.
Foto: Wikipedia
Memória da ditadura
López era um militante peronista de um bairro periférico de La Plata, Los Hornos, onde participava de cursos de alfabetização e primeiros auxílios em una sede partidária. Em 1976 foi seqüestrado por ordem do ex-chefe da Polícia da província de Buenos Aires Miguel Etchecolatz. Por seis meses esteve desaparecido até que sua detenção foi oficializada e passou mais dois anos na prisão.
Desde que recuperou a liberdade foi escrevendo as memórias do cativeiro, e por isso se tornou uma testemunha com informações precisas e detalhadas sobre tortura e assassinatos para o julgamento Etchecolatz, o primeiro repressor, processado depois da anulação das leis de anistia de 1986 e 1987. Em 18 de setembro de 2006, López desapareceu quando ia aos tribunais de La Plata para acompanhar o julgamento do militar.
“Vamos pela terceira ou quarta desaparição de López. Desapareceu em 76, depois em 2006, meses depois desapareceu dos meios de comunicação e das agendas oficiais e não oficiais dos políticos e agora tentam fazê-lo desaparecer da justiça”, lamentou Nilda Eloy, ao jornal espanhol El País. Ela é outra testemunha contra Etchecolatz.
Em companhia do prefeito de La Plata, Esteban Bruera, os dois filhos de López e a esposa, Irene Savegnago, rebatizaram ontem o Centro Cultural Los Hornos com o nome do pai. Também anunciaram a criação da Fundação Julio López, que ensinará carpintaria, eletricidade, mecânica de carros, hidráulica, confecção, cabeleireiro e cozinha aos vizinhos.
“É uma forma de continuar com os ideais do meu pai, com o que ele fazia nos anos 70,quando foi seqüestrado pela primeira vez”, disse Rubén López em entrevista ao jornal de La Plata El Día.
Divulgação
Impunidade
Na manifestação na Plaza de Mayo, os organizadores disseram que, apesar da retomada dos julgamentos de repressores do regime, o país ainda vive sob a repressão.
“Reafirmamos que o seqüestro de Julio López foi possível porque continua existindo o essencial do aparato repressivo da ditadura, e dizemos que os responsáveis por não tê-lo desmantelado são os governos, desde Alfonsín até Cristina Kirchner”, expressava o documento oficial lido ontem.
Para eles, o fato de Lopéz ter sido seqüestrado e o caso continuar sem solução contribui para crimes parecidos no futuro, pois coloca o país diante da impunidade.
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