Os torcedores que forem ao Catar para ver de perto a Copa do Mundo de 2022, que começa neste domingo (20/11), conhecerão um país cujas diversas leis são restritas em temas de direitos civis.
Essa questão suscitou debates, inclusive quais os motivos que levaram a Federação Internacional de Futebol Associado (FIFA) escolher o país islâmico como sede do mundial de futebol masculino, o que também levanta a difusão de informações falsas ou exageradas a respeito de crimes e punições existentes no país.
Para compreender mais do país, é importante considerar o primeiro aspecto que é o fato de que algumas leis no Catar, incluindo as do código penal, são influenciadas pela Sharia, a lei islâmica que tem a fonte da sua jurisprudência nos princípios do próprio Alcorão e na religião do Islã.
Com isso, o resultado é uma legislação restritiva, especialmente com as mulheres e diversidades sexuais, embora os homens heterossexuais também estejam sujeitos a alguns limites – mas muito menos que os demais.
Opera Mundi separou alguns aspectos para conhecer melhor o país que recebe o Mundial de 2022, abordando a forma como as leis do Catar se aplicam em questões como sexualidade (para casais homo e heterossexuais), aborto e o consumo de álcool e drogas.
Sexualidade
O Catar qualifica a homossexualidade como crime. Assim como outras sociedades cristãs há séculos atrás, o país caracteriza como “sodomia” as relações entre pessoas do mesmo sexo, o que pode render pena de um a três anos de prisão.
Além disso, o artigo 290 do código penal diz que “quem fizer gestos, ousar dizer ou cantar coisas imorais ou praticar atos obscenos em espaços públicos ou abertos será punido com até seis anos de prisão e multa de até 3 mil riais”.
Vale destacar que o Rial do Catar, a moeda local, está mais valorizado que o Real brasileiro – essa multa de 3 mil riais do Catar seria equivalente a R$4,4 mil, na cotação de sexta-feira (18/11).
A Comissão Organizadora da Copa do Mundo assegura que essas leis não serão aplicadas aos torcedores estrangeiros que estiverem no Catar durante o evento, deste domingo a 18 e dezembro. Entretanto, o diretor da comissão, Nasser Al-Khater, pediu publicamente que a comunidade LGTBI+ evite “exibições públicas de afeto, porque são malvistos e isso vale para todos, não somente homossexuais”.
Wikimedia Commons
Abertura da Copa do Mundo 2022 será no estádio Al Bayt, neste domingo (20/11)
Esse argumento não é totalmente falso, mas as normas que afetam os casais heterossexuais coíbem principalmente as relações extraconjugais – as demonstrações públicas de afeto não são bem vistas, como disse o diretor Al-Khater, mas não chegam a ser consideradas crime.
Uma relação heterossexual fora do casamento pode render pena de prisão de até sete anos pela lei do Catar. Essa regra é menos dura para os homens, já que eles podem contrair matrimônio com mais de uma mulher, enquanto o contrário não é permitido.
Álcool e drogas
A lei islâmica proíbe o consumo de álcool, razão pela qual o código penal do Catar afirma, em seu artigo 270, que “ingerir qualquer bebida alcoólica em local público ou abrir loja ou casa para venda de bebidas alcoólicas será punido com pena de prisão até seis meses e multa até 3 mil riais”.
Para quem “importar, exportar ou produzir álcool” a punição será pior: até três anos de prisão e multa de até 10 mil riais (R$14,6 mil). As bebidas alcoólicas são vendidas apenas em bares, restaurantes e hotéis de luxo, são caras e apenas estrangeiros têm direito de comprá-las.
Ainda assim, essa situação é controversa, já que a FIFA diversas vezes enfrentou países com legislação semelhante e chegou a ameaçar nações que tentaram manter essa restrição, alegando que as marcas de cerveja que patrocinam o evento deveriam ter seus direitos respeitados – foi assim no Brasil, em 2014, quando houve uma disputa porque a marca de cervejas que patrocina os eventos da FIFA é diferente da que patrocina a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e a própria seleção.
No caso do consumo de drogas, o artigo 37, a Lei de Controle e Regulamentação de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópicas Perigosas, diz que “possuir, adquirir, comprar, receber, transportar, gerir, trocar ou vender estupefacientes e substâncias psicotrópicas perigosas será punido com pena de prisão de sete a 15 anos, além de multa de até 200 mil riais” (R$290 mil).
Já o uso pessoal, se não justificado por um médico, pode ser punido com prisão de dois a cinco anos e multa de até 100 mil riais (R$146 mil). Em alguns casos de dependência, o tribunal local pode impor a internação do usuário em um sanatório a ser determinado pelo Ministério da Saúde.
Aborto
Realizar um aborto ou provocar a interrupção da gravidez de uma mulher é crime no Catar, com pena de até sete anos de prisão – que pode ser agravado a até 10 anos se a pessoa que realizar o fizer sem o consentimento da mulher.
Contudo, existe uma exceção: em caso da gravidez colocar em risco a vida da gestante. Ainda assim, o procedimento para se requerer esse direito é considerado burocrático, com requisitos a serem cumpridos para se comprovar, através de diferentes exames, que a mulher realmente corre risco de perder a vida se continuar com a gestação.