Em visita a Berlim, o presidente da Autoridade Nacional Palestina, Mahmoud Abbas, classificou nesta terça-feira (16/08) como “Holocausto” os frequentes ataques de Israel contra os palestinos, provocando indignação do chanceler federal da Alemanha, Olaf Scholz.
“Israel cometeu 50 massacres em 50 locais palestinos desde 1947”, disse Abbas, em entrevista coletiva ao lado de Scholz. “Cinquenta massacres, cinquenta Holocaustos”, acrescentou Abbas.
Scholz acompanhou as declarações com uma expressão petrificada, visivelmente irritado. No entanto, não fez nenhum comentário sobre o assunto durante a coletiva.
A polêmica declaração veio após Abbas ser questionado por um jornalista se pediria desculpas a Israel no 50º aniversário do ataque à equipe olímpica israelense por terroristas palestinos em Munique.
Abbas disse haver pessoas mortas pelo exército israelense todos os dias. “Se queremos continuar cavando no passado, sim, por favor”. No entanto, não se pronunciou diretamente sobre o ataque durante os Jogos Olímpicos de 1972, no qual 11 israelenses foram mortos.
Steffen Hebestreit, porta-voz de Scholz, declarou a conferência de imprensa encerrada imediatamente após a fala. A pergunta ao presidente da Autoridade Nacional Palestina já havia sido anunciada como a última da coletiva. Mais tarde, Hebestreit relatou que Scholz ficou indignado com a declaração de Abbas.
Horas depois, o próprio Scholz comentou a polêmica ao jornal alemão Bild. “Especialmente para nós, alemães, qualquer relativização do Holocausto é insuportável e inaceitável”, disse. Durante a Segunda Guerra Mundial, cerca de seis milhões de judeus foram assassinados no programa de extermínio promovido pelo regime nazista.
Em 5 de setembro de 1972, um esquadrão terrorista palestino entrou no complexo olímpico de Munique e fez reféns membros da equipe israelense. Onze atletas israelenses e um policial alemão morreram em uma operação fracassada de resgate.
O líder do partido de oposição União Democrata-Cristã (CDU), Friedrich Merz, disse que foi “incompreensível” a forma como Scholz tratou o incidente. Pelo Twitter, Merz afirmou que o chefe de governo deveria ter “claramente contrariado” o presidente da Autoridade Nacional Palestina. O político da CDU Armin Laschet chamou a fala de Abbas de “a pior gafe já ouvida na Chancelaria Federal”.
Janine Schmitz/photothek/picture alliance
Abbas fez declaração em coletiva de imprensa na Chancelaria em Berlim
Scholz critica acusações de “apartheid”
Na mesma coletiva, Abbas já havia feito outra declaração polêmica e sido repreendido por Scholz.
O presidente da Autoridade Palestina descreveu a forma como os palestinos são tratados pelo governo israelense como “apartheid”, levando Scholz a se distanciar imediatamente dos comentários.
“Quero dizer explicitamente neste momento que não adoto a palavra apartheid e que não acho que seja a maneira correta de descrever a situação”, disse Scholz.
Embora no passado a Alemanha tenha manifestado apoio à criação de um eventual Estado Palestino, sob o que é chamado de “solução de dois Estados”, Scholz disse nesta terça-feira a repórteres que “não seria o momento de mudar a situação”.
O apartheid é a doutrina de separação de grupos populacionais étnicos individuais, como o ocorrido na África do Sul até 1994. É reconhecido internacionalmente como um crime contra a humanidade.
Em 1967, Israel conquistou a Cisjordânia, Jerusalém Oriental e as Colinas de Golã na Guerra dos Seis Dias. A ONU classifica as áreas como ocupadas. Os palestinos as querem para seu próprio estado da Palestina – com Jerusalém Oriental como capital. O processo de paz entre Israel e os palestinos está parado desde 2014.
Polêmica com precedentes
Não é a primeira declaração controversa de Abbas sobre o tema. Em 2018, ele afirmou que os judeus não haviam sofrido historicamente por causa de sua religião, mas por terem sido banqueiros e credores de dinheiro. Abbas disse que os judeus que viviam na Europa sofreram massacres “a cada dez a 15 anos em algum país desde o século 11 até o Holocausto”.
“Dizem que o ódio contra os judeus não foi por causa de sua religião, foi por causa de sua função social. Então, a questão judaica que se espalhou contra os judeus em toda a Europa não foi por causa de sua religião, mas por causa de agiotagem e dos bancos”, disse Abbas na época. Dias depois, ele se desculpou pelas declarações antissemitas.
Abbas obteve um doutorado em História no Instituto de Orientalismo de Moscou, em 1982, na então União Soviética. Sua dissertação, intitulada A relação secreta entre o nazismo e o movimento sionista, atraiu críticas generalizadas de grupos judaicos, que o acusaram de negação do Holocausto. Em 2014, ele se defendeu das acusações de ser antissemita ao afirmar que o Holocausto foi “o pior crime da história moderna”.