O projeto de lei do governo britânico que visa deportar migrantes que chegaram ilegalmente ao Reino Unido para Ruanda é “incompatível” com as obrigações do país em matéria de direitos humanos, alertou nesta segunda-feira (12/02) uma comissão parlamentar do país. O projeto, entretanto, é considerado a base da política de combate à imigração ilegal do primeiro-ministro conservador, Rishi Sunak.
Em meados de janeiro, Sunak declarou que o projeto era de “prioridade nacional urgente” e esperava poder implementar a medida, considerada controversa, antes das eleições legislativas marcadas para este ano. O primeiro-ministro britânico havia conseguido aprovar na Câmara dos Comuns, instância baixa do Parlamento, a autorização para deportação de estrangeiros em situação ilegal no Reino Unido para Ruanda.
Entretanto, após analisar o projeto, a comissão composta por doze membros, trabalhistas e conservadores de ambas as câmaras do Parlamento, julgou que ele é “fundamentalmente incompatível” com as obrigações do Reino Unido em termos de direitos humanos.
A medida já havia sido criticada tanto pelo chefe da Igreja Anglicana como pelas Nações Unidas.
O projeto de lei foi elaborado em resposta ao Supremo Tribunal Britânico, que havia considerado ilegal enviar migrantes para Ruanda, decidindo que o país não poderia ser considerado seguro para eles. Apoiado por um novo tratado entre Londres e Kigali, o texto redefine Ruanda como um país terceiro seguro e impede o regresso dos migrantes aos seus países de origem.
“Os direitos humanos são universais”
A comissão parlamentar mista se diz preocupada com “a obrigação dos tribunais de considerarem Ruanda como um país 'seguro' e com a limitação do acesso aos tribunais para recorrer das decisões”. Além disso, “não está claro” que os migrantes deportados para Ruanda possam ter “garantias” de não serem enviados para um país onde possam ser perseguidos.
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Imigrantes 'ilegais' fazem viagens perigosas e chegam às praias britânicas
“Os direitos humanos são universais”, sublinha a comissão. Mas o projeto de lei “mina este princípio essencial ao negar a um grupo específico as proteções garantidas pela legislação em matéria de direitos humanos”, afirmam os parlamentares. De acordo com o relatório da comissão, com este projeto os organismos públicos seriam “autorizados a agir em violação da Convenção Europeia dos Direitos Humanos”.
“Se o Reino Unido adotar legislação que não respeita os seus próprios compromissos internacionais em matéria de direitos humanos, prejudicará seriamente a sua capacidade de influenciar outros países a respeitar o direito internacional”, acrescenta a comissão neste relatório.
O projeto divide opiniões mesmo dentro do partido Conservador, sendo criticado por uma parte dos parlamentares, enquanto outros apelam a medidas ainda mais duras.
Em linhas gerais, o governo britânico quer desencorajar a vinda de mais refugiados e imigrantes para o Reino Unido. Ruanda fica a 6.500 quilômetros da Inglaterra, e a decisão sobre um pedido de asilo político pode levar vários meses e até anos. A ideia é que apenas depois dessa resposta oficial, os estrangeiros seriam autorizados a imigrar; se forem rejeitados, poderão continuar em Ruanda ou migrar para outro país.
Atualmente, os imigrantes que chegam ao Reino Unido de barco são mantidos em hotéis e até em navios de guerra desativados. Eles ficam numa espécie de limbo migratório, sem autorização para trabalhar, ou seja, sem ter uma renda, até que a papelada seja aprovada. Custa dinheiro aos cofres públicos britânicos pagar pela alimentação e acomodação dessas pessoas, o que gera um acalorado debate político em plena crise econômica enfrentada pelo país.