Uma semana após a pior tragédia ocorrida no Mediterrâneo em uma década, responsável pela morte de 78 migrantes, segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM), o Dia Mundial do Refugiado acontece nesta terça-feira (20/06).
Além do naufrágio com o barco que zarpou da costa da Líbia transportando cerca de 750 pessoas, em direção à Itália, o cenário migratório de 2023 também é marcado pelas mais de 40 mil pessoas que deram entrada em território europeu via mar Mediterrâneo, entre os meses de janeiro e abril.
Apesar dos dados, o professor Gabriele De Angelis, doutor em teoria política e investigador sobre as problemáticas de asilo na União Europeia na Universidade Nova de Lisboa, afirma a Opera Mundi que “apesar de parecer algo extraordinário” o fenômeno migratório é comum, uma vez que “desde que há notícias de suas existência, o ser humano se desloca de um local a outro”.
“O problema atual consiste no fato do mundo ser organizado em países que exercem um controle de fronteiras”, afirma De Angelis sobre quando o comum fenômeno migratório torna-se “chocante”.
Segundo o especialista, “crise migratória é um termo utilizado quando se olha para o fenômeno migratório do ponto de vista dos países e das comunidades que recebem migrantes e refugiados. Indica a chegada de um grande número de pessoas, e requer um esforço que ultrapassa momentos 'normais'. É um termo que, em si, não significa grande coisa, senão o susto (ou ausência dele) das populações ou dos governantes dos países de destino perante os movimentos migratórios”.
Twitter/Sea-Watch International
Europa "resiste à ideia de se estruturar para dar resposta a um fenômeno que é permanente"
Assim, o que pode ser visto como um “termo neutro” na análise do pesquisador, é comumente utilizado em momentos de grande deslocamento de migrantes vindos da Líbia ou da Tunísia, mas não de outras regiões.
“No seguimento da invasão russa da Ucrânia, milhões de pessoas atravessaram a fronteira para se estabelecerem em diferentes países europeus, e ninguém falou em ‘crise migratória'”, aponta De Angelis sobre o conflito responsável pela evasão de 18,4 milhões de ucranianos.
De Angelis entende que a primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni, não necessariamente tem se apropriado de um discurso antimigratório inédito, mas tem continuado uma tendência de diferentes governos italianos nas últimas décadas.
Nesta terça-feira (20/06), Meloni encontrou-se com o presidente da França, Emmanuel Macron, em uma reunião bilateral que, entre outros assuntos, abordou a questão migratória.
Na ocasião, o presidente francês mencionou a necessidade de fortalecer a política comum do bloco europeu sobre a questão dos refugiados. Já Meloni declarou que os movimentos de migração até a Europa são “a escravidão do terceiro milênio”, na compreensão de que as rotas migratórias no Mediterrâneo são feitas por “redes criminosas”.
A Opera Mundi, o pesquisador português afirma que os países europeus “resistem à ideia de se estruturarem para dar uma resposta a um fenômeno que é permanente”. Em sua análise, eles focam, na verdade, em “continuar o controle de fronteiras”.
O pesquisador avalia que o que tem, de fato, preocupado a União Europeia é “a externalização do controle de fronteiras através de acordos com os países fronteiriços, por exemplo, com a Turquia e com a Líbia, a recusa de entrada a potenciais requerentes de proteção internacional, o apoio da extremamente duvidosa guarda costeira da Líbia, e a inação perante as torturas e as detenções ilegais de migrantes”.