O diretor-geral da Organização Internacional do Trabalho (OIT) se declara “razoavelmente otimista” sobre a possibilidade de um acordo com a Fifa para que os direitos trabalhistas sejam levados em consideração no momento de definir as sedes das Copas do Mundo, depois das críticas ao Mundial de 2022 no Catar.
A agência da ONU propõe “uma revisão diligente dos países candidatos” a organizar a Copa, afirmou em entrevista à AFP Gilbert F. Houngbo, que se encontrou no domingo (04/12) em Doha com o presidente da Federação Internacional de Futebol (FIFA), Gianni Infantino.
“Todas as discussões que tivemos até o momento me levam a acreditar que a Fifa está mais que decidida a garantir que, nos próximos Mundiais, a questão social e o respeito às normas de trabalho sejam fundamentais”, afirmou Houngbo.
“Temos conversado há vários anos e queremos assegurar que nossa cooperação continuará”, destacou Infantino em um comunicado. “A intensificação da relação entre a Fifa e a OIT também faz parte do legado da Copa do Mundo de 2022”, acrescentou.
O Mundial de 2026 será disputado nos Estados Unidos, México e Canadá. Para a edição de 2030, duas candidaturas conjuntas já foram anunciadas: Espanha e Portugal, que adicionaram a Ucrânia ao projeto, e um projeto da América do Sul (Uruguai, Argentina, Paraguai e Chile). Em setembro, o Egito anunciou que estava em consultas com Grécia e Arábia Saudita sobre uma eventual candidatura.
“O mundo ganharia se o processo de candidatura e escolha da sede da Copa do Mundo, assim como dos Jogos Olímpicos ou de outros esportes, levasse em consideração a situação dos países”, destacou Houngbo, ex-primeiro-ministro do Togo.
Condições precárias
Desde que o Catar foi escolhido em 2010 como sede da Copa de 2022, o país é muito criticado pela questão dos direitos humanos, em particular pelas condições de vida e trabalho de centenas de milhares de migrantes procedentes do sul da Ásia e da África.
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Agência da ONU propõe "revisão diligente dos países candidatos" a organizar a Copa
“Ouvi muitas críticas, mas o Catar se saiu melhor do que outros países neste sentido”, disse Houngbo. “Para nós, o que é muito importante é reconhecer o trabalho feito e este trabalho tem sido, sinceramente, muito positivo”, acrescentou.
O diretor da OIT destaca o fim do sistema “kafala”, que tornava os trabalhadores quase propriedade dos empregadores. Também citou a limitação dos horários de trabalho nos períodos de temperatura mais alta, a adoção de um salário-mínimo mensal de QAR 1.000 (equivalente a aproximadamente R$ 1.500) e a criação de “comitês” de diálogo entre as empresas e seus funcionários.
Ele também reforçou a necessidade de avanços “na aplicação das reformas porque algumas empresas prosseguem com práticas contrárias à lei”.
Houngbo lembrou o fundo de compensação por salários que não foram efetuados, criado em 2018. “Até outubro de 2022, o fundo pagou mais de US$ 350 milhões, o que atesta o compromisso do governo, mas que também reflete também a dimensão do problema”, disse.
“Não há informação confiável”
Com números que vão de 414 falecidos entre 2014 e 2020, segundo as autoridades do Catar, a milhares de vítimas fatais desde 2010, de acordo com várias ONGs, o total de mortos em acidentes de trabalho nas obras da Copa é um tema que provoca muitas questões.
“A opinião pública precisa saber a verdade e, muitas vezes, esta verdade é dizer que, sinceramente, não há informação confiável”, disse o diretor da OIT. “Na próxima fase de nossa cooperação com as autoridades do Catar, vamos enfatizar a questão da compilação e análise de dados”, anunciou Houngbo.
A presença da OIT em Doha, que começou em 2018, deve prosseguir, a princípio, até 2023. “Vamos tornar o escritório algo permanente, não apenas para continuar com o trabalho que temos feito aqui, mas eventualmente para cobrir a região ou até além”, disse.