A “Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito“, documento que apela pela democracia no Brasil em resposta aos ataques e ameaças do presidente Jair Bolsonaro, foi lançada na manhã desta quinta-feira (11/08) na Faculdade de Direito da USP, no Largo São Francisco, em São Paulo.
O evento reuniu a leitura da carta pelo ex-ministro da Justiça no governo de Fernando Henrique Cardoso, José Carlos Dias, que não se resumiu a São Paulo, mas também em atos em mais de 40 cidades brasileiras, incluindo a maioria das capitais dos estados e o Distrito Federal.
“No Brasil atual não há mais espaço para retrocessos autoritários. Ditadura e tortura pertencem ao passado. A solução dos imensos desafios da sociedade brasileira passa necessariamente pelo respeito ao resultado das eleições”, declara o documento.
Leitura da Carta às Brasileiras e aos Brasileiros – Estsdo Democrático de Direito Sempre.
Perto de completar 1 milhão de pessoas, as adesões continuam.https://t.co/SHekj3BMqe pic.twitter.com/201S4RDshg— Faculdade de Direito da USP (@de_usp) August 11, 2022
Assinada por todos os candidatos à Presidência nas eleições de 2022, menos Bolsonaro, o manifesto afirma que “estamos passando por momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições”.
Além de diversas organizações sociais e econômicas, como banqueiros do Itaú Unibanco e CEO da empresa de cosméticos Natura, e movimentos que integram entre os assinantes da carta, a Associação Brasileira de Mídia Digital (ABMD), da qual Opera Mundi integra, também está entre os signatários.
Em resposta aos ataques e ameaças do presidente, a declaração afirma que as eleições com o processo eletrônico de apuração “têm servido de exemplo no mundo”.
“Tivemos várias alternâncias de poder com respeito aos resultados das urnas e transição republicana de governo. As urnas eletrônicas revelaram-se seguras e confiáveis, assim como a Justiça Eleitoral”, completa.
Além da assinatura de figuras políticas, artistas como Chico Buarque, Anitta, Fernanda Montenegro, Caetano Veloso e Wagner Moura fazem parte das mais de 950 mil assinaturas do texto.
Fazendo referência aos 45 anos da “Carta ao Brasileiros” de 1977, que denunciava a ilegitimidade do governo militar da época, o manifesto foi elaborado por ex-alunos da Faculdade de Direito da USP. É possível assinar a Carta em defesa do Estado Democrático de Direito no site oficial do Estado de Direito Sempre.
Twitter/Faculdade de Direito da USP
Evento reuniu a leitura da carta pelo ex-ministro da Justiça no governo de FHC, José Carlos Dias
Leia a carta na íntegra
Carta às brasileiras e aos brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito!
Em agosto de 1977, em meio às comemorações do sesquicentenário de fundação dos cursos jurídicos no país, o professor Goffredo da Silva Telles Junior, mestre de todos nós, no território livre do Largo de São Francisco, leu a Carta aos Brasileiros, na qual denunciava a ilegitimidade do então governo militar e o estado de exceção em que vivíamos. Conclamava também o restabelecimento do estado de direito e a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.
A semente plantada rendeu frutos. O Brasil superou a ditadura militar. A Assembleia Nacional Constituinte resgatou a legitimidade de nossas instituições, restabelecendo o estado democrático de direito com a prevalência do respeito aos direitos fundamentais.
Temos os poderes da República, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, todos independentes, autônomos e com o compromisso de respeitar e zelar pela observância do pacto maior, a Constituição Federal.
Sob o manto da Constituição Federal de 1988, prestes a completar seu 34º aniversário, passamos por eleições livres e periódicas, nas quais o debate político sobre os projetos para o país sempre foi democrático, cabendo a decisão final à soberania popular.
A lição de Goffredo está estampada em nossa Constituição “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.
Nossas eleições com o processo eletrônico de apuração têm servido de exemplo no mundo. Tivemos várias alternâncias de poder com respeito aos resultados das urnas e transição republicana de governo. As urnas eletrônicas revelaram-se seguras e confiáveis, assim como a Justiça Eleitoral.
Nossa democracia cresceu e amadureceu, mas muito ainda há de ser feito. Vivemos em país de profundas desigualdades sociais, com carências em serviços públicos essenciais, como saúde, educação, habitação e segurança pública. Temos muito a caminhar no desenvolvimento das nossas potencialidades econômicas de forma sustentável. O Estado apresenta-se ineficiente diante dos seus inúmeros desafios. Pleitos por maior respeito e igualdade de condições em matéria de raça, gênero e orientação sexual ainda estão longe de ser atendidos com a devida plenitude.
Nos próximos dias, em meio a estes desafios, teremos o início da campanha eleitoral para a renovação dos mandatos dos legislativos e executivos estaduais e federais. Neste momento, deveríamos ter o ápice da democracia com a disputa entre os vários projetos políticos visando convencer o eleitorado da melhor proposta para os rumos do país nos próximos anos.
Ao invés de uma festa cívica, estamos passando por momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições.
Ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o estado democrático de direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional.
Assistimos recentemente a desvarios autoritários que puseram em risco a secular democracia norte-americana. Lá as tentativas de desestabilizar a democracia e a confiança do povo na lisura das eleições não tiveram êxito, aqui também não terão.
Nossa consciência cívica é muito maior do que imaginam os adversários da democracia. Sabemos deixar ao lado divergências menores em prol de algo muito maior, a defesa da ordem democrática.
Imbuídos do espírito cívico que lastreou a Carta aos Brasileiros de 1977 e reunidos no mesmo território livre do Largo de São Francisco, independentemente da preferência eleitoral ou partidária de cada um, clamamos às brasileiras e brasileiros a ficarem alertas na defesa da democracia e do respeito ao resultado das eleições.
No Brasil atual não há mais espaço para retrocessos autoritários. Ditadura e tortura pertencem ao passado. A solução dos imensos desafios da sociedade brasileira passa necessariamente pelo respeito ao resultado das eleições.
Em vigília cívica contra as tentativas de rupturas, bradamos de forma uníssona:
Estado Democrático de Direito Sempre!!!!