Um pequeno e simples presépio foi montado aos pés do altar. A Missa do Galo foi celebrada no domingo (24/12), à meia-noite, para marcar o nascimento do messias cristão, mas também para orar pela paz. A comunidade vive em constante medo. Um medo reforçado pelo que a Igreja Católica descreveu como o assassinato de dois paroquianos no interior da igreja, em 16 de dezembro, por um soldado israelense.
Khalil Sayegh é um cristão de Gaza. Embora esteja vivendo nos Estados Unidos, alguns de seus parentes se encontram atualmente nas instalações da igreja. “Eles estão aterrorizados”, denuncia. “Principalmente porque viram os atiradores matando as pessoas ao seu redor. Uma senhora idosa estava apenas indo ao banheiro, e foi morta no caminho. Então as pessoas, por algum tempo, enquanto os atiradores continuavam na igreja, não ousavam nem mesmo ir ao banheiro”, conta Sayegh.
Sem acesso à saúde
Estejam feridas ou doentes, nenhuma das pessoas abrigadas na igreja têm acesso a tratamento médico. E, por falta de cuidados, o pai de Khalil Sayegh morreu esta semana. Os médicos estimam que ele tenha tido um ataque cardíaco ou um derrame”, explica Saygh. “Se ele não tivesse sido negligenciado do ponto de vista médico, sua morte teria sido totalmente evitável”, ele acrescenta.
Para essa comunidade, portanto, a religião é o último refúgio. “Parece que as pessoas estão se voltando para Deus, porque estão perdendo a esperança na humanidade e na comunidade internacional. Os cristãos de Gaza sentem que o mundo inteiro os abandonou e os decepcionou. Então, eles se voltam para Deus com suas orações e lágrimas”, avalia Sayegh.
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A Igreja da Sagrada Família, a única igreja católica do território. Hoje, existem menos de 200 católicos e cerca de 1,5 mil cristãos
O Natal deveria ser uma celebração, mas, este ano, Khalil Sayegh está achando difícil encontrar motivação para comemorar.
“É realmente difícil pensar sobre essa questão. Eu me pergunto se há algum motivo para se alegrar, se há algum motivo para ter esperança. Quando vemos que o mundo tolera, em pleno século 21, tal crime, tal nível de atrocidade, é difícil ter esperança. Mas a história do Natal é sobre Deus encarnado na forma de um homem que vem a esta terra. A mensagem é que Deus sente a dor das pessoas que vivem nesta Terra, sejam elas palestinas, israelenses, sejam de qualquer outra parte do mundo”, contou Sayegh ao repórter Guilhem Delteil, da RFI.
Pouco acesso a alimentos e água potável
A Igreja da Sagrada Família está localizada na parte norte do enclave palestino, onde o acesso à ajuda humanitária é ainda mais difícil. Apesar da resolução das Nações Unidas que pede a entrega de ajuda humanitária em “larga escala”, o número de caminhões que entram no território sitiado por Israel não aumentou.
“Há um problema de alimentação. Há muito pouca água potável. Também não há água para lavar ou tomar banho, o que também é um problema que pode causar todos os tipos de doenças. Algumas pessoas feridas pelo exército israelense ainda estão na igreja. O exército cercou o local. Eles poderiam ter fornecido atendimento médico. Mas não o fizeram. Eles não os retiraram. A Cruz Vermelha também não os retirou e eles ainda estão sangrando. Pode-se dizer que eles os estão matando aos poucos”, relatou.