Nem mesmo a fina garoa sobre a Avenida Paulista foi capaz de amenizar o calor que se instalava no começo da noite desta quarta-feira (29/11). O maior centro comercial do Brasil foi preenchido de bandeiras palestinas, faixas exigindo o “fim do Estado de Israel” e gritos: “Estado de Israel, Estado assassino. E viva a luta do povo palestino”.
No Dia Internacional da Solidariedade ao Povo Palestino, famílias, organizações e coletivos pisaram nas ruas do centro de São Paulo para protestar, mais uma vez, contra as ações do Estado de Israel.
“Hoje completa 76 anos desde que o sionismo arrancou uma resolução profundamente lesiva criada pela Organização das Nações Unidas, que construía um futuro Estado dentro de um país que buscava sua emancipação. O plano de partição da ONU abriu o caminho, dentro do direito internacional, para a limpeza étnica e o genocídio que já vinha sendo promovida gradativamente pelo sionismo”, explicou o militante ativista e internacionalista Thiago Ávila a Opera Mundi. “É um processo danoso, tanto é que a própria ONU, mais de 20 anos depois, arrependida, cria o Dia da Solidariedade ao Povo Palestino. Porque cometeu um equívoco. Não se deve criar um país dentro de outro ignorando o povo originário”.
Apenas em São Paulo, pelo menos 80 entidades, entre coletivos judaicos, movimentos populares, universidades, sindicatos, partidos e militantes antissionistas mobilizaram o ato à favor da causa palestina. A manifestação contou com a participação de mais de 5 mil pessoas, mesmo com as chuvas que passaram a ganhar intensidade ao longo da noite.
“A luta contra o genocídio, limpeza étnica, ideologia racista e supremacista não é uma batalha só da esquerda ou de determinados grupos religiosos. É uma batalha da humanidade’, acrescentou Ávila sobre a participação de diversas comunidades no ato, incluindo a judaica, ressaltando que o povo judeu também é “uma das grandes vítimas” do cenário, uma vez que tem sua “fé sequestrada pela ideologia racista e supremacista”.
Rocio Paik/ Opera Mundi
Em meio às movimentações, um pai, junto com duas crianças que seguram uma placa escrita “As vidas de crianças palestinas importam”, chama a atenção. É o Rafat Husein, cozinheiro do restaurante Al Janiah, com seu filho de 7 anos e sua filha, de 9. Com familiares no território atacado por Israel, os pequenos, que nasceram no Brasil, mas têm cidadania palestina, acompanham orgulhosamente seu pai na marcha. Rafat se reconhece como um “militante independente” e está presente em todos os atos solidários à causa palestina: “É um momento de unidade. Devemos libertar a Palestina imediatamente’.
Rocio Paik/Opera Mundi
Famílias, sindicatos e coletivos se reúnem na Avenida Paulista em solidariedade ao povo palestino
‘Continuamos resistentes, continuamos resilientes’
Militante às causas humanitárias desde seus 16 anos, Mohamad Said Mourad, nascido no Líbano, hoje tem 72 e diz que passou a vida acompanhando as questões da Palestina: “Eles sempre foram alvo de notícias falsas”.
Contra a conduta de Israel, o militante conta que chegou a fundar o independente jornal Jerusalém, que funcionou entre 1983 a 1987 e, mesmo sendo muitas vezes alvo de ameaças e censura, foi premiado por cobrir o cenário político e social do Oriente Médio sob uma visão humanizada.
“A ONU não criou o Estado de Israel. Fez a partilha da Palestina. E de lá pra cá, verificamos uma limpeza étnica, massacre, genocídio, sob alegação de que [os israelenses] estão se autodefendendo”, critica Mohamad sobre as posições tomadas pelas autoridades de Tel Aviv e o Ocidente.
Rocio Paik/ Opera Mundi
Cessar-fogo, fim do genocídio e condenação a Israel
Cessar-fogo permanente, revogação dos acordos e relações diplomáticas entre Brasil e Israel, boicotes, fim do bloqueio de Gaza, fim da limpeza étnica, condenação de Israel, reparação de todo o patrimônio destruído na região, são as reivindicações em urgência feitas pelos manifestantes.
“Pelo fim do genocídio e massacre de uma população de mais de 2.3 milhões de pessoas; assim como pela população da Cisjordânia que enfrenta diariamente prisões, ocupações de suas terras e ataques de Israel, ocasionando destruição e assassinatos”, declara o centro cultural Al Janiah envolvido na organização da manifestação em solidariedade ao povo palestino.
Para além de São Paulo, outras 24 cidades brasileiras também convocaram atos nesta data para condenar as hostilidades sobre Gaza, Cisjordânia e Jerusalém Oriental. Ataques estes que ganharam intensidade no dia 7 de outubro, após a primeira ofensiva lançada pelo Hamas contra o território israelense, deixando mais de 15 mil palestinos mortos, sobretudo, crianças e mulheres, que compõem a maior parte das fatalidades.
Sob orientação de “eliminar o Hamas”, as forças armadas do Estado judeu têm bombardeado inclusive residências, hospitais, escolas e campos de refugiados, fato que foi configurado como “crime contra a humanidade” e foi severamente condenado por líderes da comunidade internacional.
“Estamos aqui cumprindo uma missão histórica importante. Nós e e o mundo fomos às ruas hoje para dizer que nós não vamos aceitar um genocídio. Enquanto os governos falham, as classes trabalhadoras e os povos se unem das mais variadas formas, seja indo para as ruas, seja mobilizando boicotes, sanções midiáticas, parando a produção da máquina de guerra. Essa união de várias ações têm capacidade de construir uma Palestina livre e um futuro para a humanidade”, conclui Thiago Ávila.