Ao lado do presidente português, Rebelo de Sousa, o brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva se esforçou neste sábado (22/04) para atenuar os comentários sobre a guerra na Ucrânia que provocaram uma onda de reprovações dos ocidentais nos últimos dias. Sousa, por sua vez, manteve o posicionamento português ao lado da União Europeia e da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), mas destacou que as divergências com Lula “não afetam em nada” as relações entre os dois países.
O assunto dominou uma entrevista concedida pelos dois mandatários depois da reunião que mantiveram em Lisboa, nesta manhã. ”Faz tempo que o meu país tomou a decisão de que nós condenamos a Rússia pela ocupação e por ferir a integridade territorial da Ucrânia – isso logo nos primeiros dias”, explicou-se Lula. “Eu nunca igualei os dois países, porque eu sei o que é a integridade territorial, e todos lá achamos que a Rússia errou”, completou. “Entretanto, nós não somos favoráveis à guerra, nós queremos a paz”, ressaltou o presidente brasileiro, ao responder a jornalistas.
No entanto, ao ser questionado se mantém as declarações de que, ao entregar armas para Kiev, a Europa estaria contribuindo para continuidade do conflito, o petista respondeu: “Se você não fala de paz, você contribui para a guerra.”
Lula explicou que “conversou com [Olaf] Schultz, com [Emmanuel] Macron, com [Joe] Biden, com Xi Jinping” sobre a proposta de promover o diálogo para encaminhar o fim do conflito ucraniano, que se arrasta há 14 meses na região do Donbass. Até agora, porém, a iniciativa do petista não suscitou maior adesão dos interlocutores internacionais.
Rússia e Ucrânia “não querem parar”
“A Rússia não quer parar e Ucrânia não quer parar. Nós vamos ter que encontrar um grupo de países que possam formular uma relação de confiança. A ideia de que a guerra para, senta na mesa e conversa, que a gente vai encontrar um resultado muito melhor”, argumentou. “É melhor encontrar uma saída em torno de uma mesa do que continuar tentando encontrar a saída do campo de batalha.”
Lula afirmou que foi nesse contexto que o Brasil se recusou a contribuir com armamentos para Kiev se defender da invasão russa, ao contrário do que têm feito diversos países europeus, entre eles Portugal. “O Brasil estaria na guerra e o Brasil não quer participar da guerra”, disse Lula, ao relembrar que o chanceler alemão solicitou a colaboração militar brasileira quando esteve em visita a Brasília, em fevereiro.
Twitter/Lula – Foto de Ricardo Stuckert
Presidente Lula ao lado de seu homólogo português, Marcelo Rebelo de Sousa
Lula também relembrou que, no seu primeiro mandato, em 2002, também rejeitou um pedido do então presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, para o Brasil se associar à guerra no Iraque iniciada pelo republicano, após os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001.
Rebelo de Sousa destaca relações bilaterais
Ao seu lado, o presidente português buscou chamar a atenção para o histórico de aproximação que liga Lisboa e Brasília. “A posição portuguesa é diferente. Entendo que uma eventual via do caminho para a paz supõe previamente o direito da Ucrânia de poder reagir à invasão, recuperar o que puder ser recuperado – tendencialmente tudo o que puder, da sua integridade territorial, por uma questão de princípio, que é não beneficiar o infrator. Por uma posição de princípio que é ficar claro que violações de certos princípios, certos valores da ordem internacional, não são tratados de forma diversa, conforme o violador é mais ou menos poderoso”, alegou Rebelo de Sousa, que recepcionou o brasileiro no Palácio de Belém.
“Mas isso não afeta em nada a comunidade brasileira que existe em Portugal, a comunidade portuguesa que existe no Brasil, as ligações entre passado, presente e futuro com o Brasil”, complementou o líder português.
Lula reafirmou que o assessor especial para assuntos internacionais, Celso Amorim, deve ir em breve a Kiev para abordar o tema com o governo ucraniano – depois de já ter visitado Moscou, em março. A viagem ainda não tem data para acontecer. O presidente também não revelou qual será a missão de Amorim no país.
“Eu não fui à Rússia e não vou a Ucrânia. Eu só vou quando houver possibilidade de efetivamente ter um clima de construção de paz”, salientou, ao ser questionado se ele próprio poderia fazer a viagem. “A gente vai ter que convencer as pessoas que você pensa que não querem parar, parar. Nós estamos numa situação em que a guerra da Rússia e da Ucrânia não estão fazendo bem à humanidade, porque tem problema de energia, de fertilizantes, de comida. E está fazendo mal também até no Brasil. Eu quero é construir uma forma de colocar os dois na mesa”, frisou.