O governo brasileiro busca associar a presidência do G20 em 2024 a avanços na agenda do financiamento climático para os países em desenvolvimento. A meta é encaminhar soluções sobre o tema para a próxima Cúpula das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP29), que acontece no Azerbaijão, no fim do ano, e cujo foco das negociações será o aporte de recursos para as nações mais pobres promoverem a transição ecológica.
Nas vésperas da primeira série de reuniões dos ministros das Finanças do G20, um fórum de dois dias reuniu alguns dos maiores especialistas do mundo sobre o assunto, em São Paulo. Sandra Guzmán, fundadora do Climate Finance Group para a América Latina e o Caribe lembrou que a falta de subsídios leva a maioria dos países do grupo, em especial os latinoamericanos e africanos, a realizarem muito mais investimentos na indústria fóssil do que nas renováveis – inclusive o próprio Brasil.
“O Brasil pode ter um papel importante, construindo pontes entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, e atuando para reconstruir a confiança no nível internacional que nós precisamos para encarar todos esses problemas”, frisou.
Natalie Unterstell, especialista em financiamento do Instituto Talanoa, lembrou que um recente relatório da Comissão de Finanças da Convenção do Clima avaliou em pelo menos US$ 5,8 trilhões as necessidades dos países em desenvolvimento até 2030 – dos quais mais da metade deverão ser assegurados pelo setor privado e 25% por bancos multilaterais.
“No entanto, a mobilização do financiamento privado tem sido bastante modesta, mundo afora. É fácil falar. Não tem sido fácil fazer”, apontou. “A economia convencional, a velha economia, mobiliza muito bem o capital e faz as coisas fluírem. Agora, a gente precisa tirar, deslocar esses recursos para a economia que a gente precisa que nasça, que aconteça, e que já está em curso”, incitou.
Calendário do financiamento nas COPs
Na COP29, os países se comprometerão com uma nova cifra anual de financiamento para os países em desenvolvimento – depois que os prometidos US$ 100 bilhões por ano a partir de 2020 sequer foram cumpridos, pelos países ricos. O problema é que, desde então, estimativas atualizadas da ONU apontam que o valor necessário disparou: seria de pelo menos US$ 2,4 trilhões por ano.
O sucesso desta discussão será fundamental para determinar o nível da ambição da conferência seguinte, a COP30 em Belém, quando novas promessas de redução de emissões serão submetidas, em uma espécie de atualização do Acordo de Paris.
Twitter/Amcham Brasil
Janet Yellen, secretária do Tesouro dos EUA, e Marina Silva, ministra do Meio Ambiente do Brasil, discutiram planos de transição verde
Enquanto isso, um dos focos da agenda brasileira do G20, a reforma das instituições multilaterais como o FMI e o Banco Mundial, converge com o objetivo de facilitar a arrecadação e entrega de recursos adicionais aos países que precisam do dinheiro para a transição energética.
“Existe uma conversa muito importante sobre a reforma das instituições, do papel do FMI, do que pode ser a regulação do sistema financeiro e novas formas de mobilizar recursos e como canalizá-los. Essa conversa, apesar de ser mais ampla do que a questão do clima, é fundamental para os investimentos em clima porque os riscos e custos de se investir em mudança do clima são, muitas vezes, uma das barreiras para efetivar o financiamento”, salientou Maria Netto, diretora-executiva do Instituto Clima e Sociedade.
“Não será apenas uma questão de abrir um escritório de mudanças climáticas no FMI ou nos bancos de desenvolvimento. As instituições financeiras internacionais precisarão ser profundamente reformadas, com mudanças nos propósitos delas, que deveriam passar a ser proteger florestas, investir nas pessoas, criar empregos, e serem pensadas da base para o topo, e não do topo para a base”, complementou Guzmán.
Parceria para financiar projetos no Brasil
Durante os dois dias de Fórum Brasileiro de Finanças Climáticas, nesta segunda (26/02) e terça (27/02), foi anunciado um importante acordo para beneficiar a transição verde no Brasil. A Glasgow Financial Alliance for Net Zero (GFANZ) – que atua junto a quase 700 instituições financeiras do mundo para mobilizar recursos para o financiamento climático – se uniu ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e ao Bloomberg Philanthropies para apoiar projetos no país.
Mark Carney, enviado especial do secretário-geral da ONU para Ação e Finanças Climáticas e co-presidente da iniciativa, ressaltou que o financiamento é única maneira de dar escala a soluções que reduzam efetivamente as emissões de gases de efeito estufa, em vez de alternativas menos eficientes no combate à crise climática como o comércio de créditos de carbono.
“Sim, nós podemos precificar o carbono e termos um mercado de CO2. E sim, o Brasil é um líder na bioeconomia. Mas tudo que a natureza nos dá não tem um preço”, disse. “No fim das contas, os mercados não têm valor, mas as pessoas têm, e muito do que está acontecendo com a natureza é resultado das nossas decisões. As pessoas estão no centro dessa transição climática.”