Mais de 50°C no Vale da Morte nos Estados Unidos, um recorde histórico de 45,3°C na Catalunha, mais de 43°C em Phoenix por 24 dias: sem as mudanças climáticas, essas ondas de calor teriam sido “quase impossíveis”. É o que diz um estudo publicado pela rede científica World Weather Attribution (WWA) nesta terça-feira (25/07).
Segundo os pesquisadores da WWA, as mudanças climáticas, causadas pelas emissões de CO2 e provocadas por atividades humanas, “tornaram as ondas de calor mais quentes, mais longas e mais frequentes”. O fenômeno aumenta a probabilidade de recordes de temperatura na China, por exemplo, “em ao menos 50 vezes”.
“As ondas de calor recentes já não são eventos excepcionais” e as que vão ocorrer “serão ainda mais intensas e mais frequentes se as emissões não forem reduzidas rapidamente”, concluem os investigadores.
De acordo com o estudo, se fenômenos naturais como os anticiclones ou o El Niño podem contribuir para o desencadeamento de ondas de calor, mas “o aumento das temperaturas do planeta com o uso de combustíveis fósseis é a principal razão da gravidade do fenômeno”.
Caráter emergencial
Para chegar a essas conclusões, os autores do estudo – sete cientistas holandeses, britânicos e americanos – basearam-se em dados meteorológicos históricos e modelos climáticos. O objetivo era comparar o clima de hoje e o aquecimento global de 1,2°C com o de antes. Os resultados, produzidos em caráter emergencial, são publicados sem passar pelo longo processo de revisões, mas combinam métodos aprovados por pares.
Os cientistas analisaram períodos em que o calor foi considerado “mais perigoso – particularmente entre 12 a 18 de julho no sul da Europa, de 1° a 18 de julho no oeste dos Estados Unidos, Texas e norte do México, e de 5 a 18 de julho no centro e leste da China.
A pesquisa chegou à conclusão de que o aquecimento global piora a intensidade das temperaturas: com ele, as ondas de calor na Europa são 2,5°C mais quentes, as da América do Norte aumentam 2°C e as da China 1°C, afirmou a WWA. Os resultados confirmam estudos de outras entidades, como a Nasa e o observatório europeu Copernicus que indicaram recentemente que julho de 2023 “pode ser tornar o mais quente já medido”.
Twitter/World Meteorological Organization
Aquecimento global piora intensidade das temperaturas, segundo estudo
“No passado, tais eventos teriam sido aberrantes. Mas no clima de hoje, eles podem se repetir aproximadamente a cada 15 anos na América do Norte, a cada 10 anos no sul da Europa e a cada 5 anos na China”, explicou Mariam Zachariah, cientista do Imperial College London, que participou do estudo da WWA.
Segundo ela, as ondas de calor “se tornarão mais frequentes ainda e acontecerão em cada dois a cinco anos” se o aquecimento global atingir 2°C. A cientista adverte que o fenômeno pode ocorrer daqui a 30 anos, “a menos que todos os países signatários do Acordo de Paris coloquem totalmente em prática seus compromissos atuais para reduzir rapidamente suas emissões”.
Ondas de calor podem ser tornar “a norma”
A climatologista britânica Friederike Otto reforça o alerta. Para ela, esse início de verão no Hemisfério Norte pode “se tornar a norma”. Caso a neutralidade do carbono não seja alcançada, esse período poderá até mesmo “ser considerado fresco” em algumas décadas.
Otto sublinha que os resultados deste estudo “não são uma surpresa”. “Do ponto de vista científico, é até monótono porque só confirma o que havíamos previsto. Mas o que não previmos é o quanto somos vulneráveis diante dos efeitos do aquecimento global. Porque isso mata pessoas”, martelou.
Por outro lado, a cientista acredita que ainda há tempo para agir. “É urgente parar de queimar combustíveis fósseis e trabalhar para reduzir nossas vulnerabilidades. Se não o fizermos, dezenas de milhares de pessoas continuarão a morrer”, disse Otto.
Por isso, segundo ela, é “absolutamente essencial” a adoção de legislação internacional sobre a eliminação gradual de energias fósseis na 28ª Conferência Climática das Nações Unidas (COP), em novembro, em Dubai.