O Japão começou a despejar água da usina nuclear acidentada de Fukushima no mar nesta quinta-feira (24/08), apesar das preocupações de pescadores e da forte oposição de Pequim, que imediatamente reforçou suas restrições comerciais em relação ao país. Mais de dez manifestantes que protestavam em frente à embaixada japonesa de Seul foram presos. Em Tóquio, os protestos foram diante da Tepco, operadora da central de Fukushima.
Pequim denunciou a ação “egoísta e irresponsável” de Tóquio e suspendeu todas as importações de frutos-do-mar japoneses, citando “segurança alimentar” como razão.
Em julho, a China já tinha proibido a importação de alimentos de dez distritos japoneses, incluindo Fukushima. Hong Kong e Macau tomaram medidas semelhantes no início desta semana. A China foi, no ano passado, o principal mercado de exportação para a pesca japonesa.
O despejo de água de Fukushima no Oceano Pacífico foi iniciado pouco depois das 13h, horário do Japão (04h GMT), pela Tepco, operadora da usina.
Esta primeira vazão deverá durar cerca de 17 dias e diz respeito a cerca de 7.800 metros cúbicos de água contendo trítio, uma substância radioativa que só é perigosa em doses altamente concentradas.
A Tepco planeja outros três despejos até o final de março de 2024, para volumes equivalentes.
No total, o Japão planeja liberar mais de 1,3 milhões de metros cúbicos de águas residuais armazenadas até agora no local da central elétrica de Fukushima Daiichi, provenientes de águas pluviais, águas subterrâneas e infiltrações necessárias para resfriar os núcleos dos reatores que derreteram após o tsunami de março de 2011, que devastou a costa nordeste do país.
Muitas precauções tomadas
O processo será bastante gradual – deverá prolongar-se até a década de 2050 – e o teor de água com trítio nas descargas diárias no mar não ultrapassará os 500 metros cúbicos.
A água foi previamente filtrada para remover a maior parte de substâncias radioativas, com exceção do trítio.
O Japão planeja despejar essa água com uma diluição significativa, para que o seu nível de radioatividade não exceda 1.500 becquerels (Bq) por litro.
Flickr/IAEA Imagebank
Águas foram usadas para resfriar os núcleos dos reatores que derreteram após o tsunami de março de 2011
Esse nível é 40 vezes inferior ao padrão nacional japonês para água tritiada, alinhado com o padrão internacional (60.000 Bq/litro). Também é cerca de sete vezes inferior ao limite máximo estabelecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para água potável (10.000 Bq/litro).
A Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), que supervisiona a operação de eliminação, deu luz verde em julho, considerando que o projeto cumpre as “normas internacionais de segurança” e que terá um impacto radiológico “insignificante para a população e para o ambiente”.
Protestos na Coreia do Sul
Mas muitos veem as coisas de forma diferente. Os pescadores japoneses temem, em primeiro lugar, um impacto na imagem dos seus produtos, o que já se faz sentir com as restrições chinesas adotadas no mês passado.
“O oceano é o bem comum da humanidade. O despejo forçado de água contaminada da central nuclear de Fukushima no mar é uma ação extremamente egoísta e irresponsável que desconsidera o interesse público internacional”, afirmou o ministério dos Negócios Estrangeiros chinês num comunicado.
O despejo de água tritiada no mar é, no entanto, uma prática comum na indústria nuclear em todo o mundo, e o nível anual de radioatividade dessas descargas das centrais nucleares chinesas é muito superior ao esperado em Fukushima Daiichi, observou Tóquio.
Analistas dizem que a posição linha-dura de Pequim em relação à água de Fukushima está provavelmente também ligada às já tensas relações sino-japonesas devido a muitas questões econômicas e geopolíticas.
Outros estados da Ásia-Pacífico com melhores relações com o Japão, como a Coreia do Sul, Taiwan, Austrália e até Fiji e as Ilhas Cook, manifestaram confiança na segurança do processo de rejeição controlado pela AIEA.
No entanto, protestos contra a descarga estão ocorrendo na Coreia do Sul. Mais de dez pessoas foram presas em Seul na quinta-feira por tentarem entrar na embaixada japonesa, disse a polícia local à AFP.
No Japão, num sinal de certa resignação da população sobre o assunto, uma manifestação de protesto na manhã de quinta-feira perto da central elétrica de Fukushima Daiichi reuniu apenas nove pessoas, notou a AFP no local.
“Uma boa política seria não fazer nada que seja potencialmente perigoso, sob o princípio da precaução”, disse à AFP a manifestante Ruiko Muto, de 70 anos, que vive na província de Fukushima.
“O mar já está muito poluído, penso que é realmente inaceitável permitir intencionalmente que isto continue”, acrescentou.