A Penny é uma das principais cadeias de supermercados baratos da Alemanha, ao lado da Aldi, Lidl e Netto. De 31 de julho a 5 de agosto, porém, ela está propositalmente abrindo mão de seu principal diferencial de venda: preços por vezes imbatíveis.
Nessa semana, em todas as suas filiais da Europa, a freguesia terá que pagar os “custos verdadeiros” de nove produtos selecionados. Ou seja, bem mais caro: o iogurte de fruta orgânico custa 31% a mais; o queijo maasdam de fabricação convencional, quase o dobro, com um aumento de 91%. Só o bife à milanesa vegano continua custando quase o mesmo, com apenas 5% de acréscimo, ou 0,14 euro adicional.
A campanha Wahre Kosten (curto verdadeiro) visa mostrar o que essas mercadorias realmente valem, levados em conta todos os custos adicionais para a natureza e o clima, ao longo da cadeia de produção. Entram no cálculo fatores como emissões de micropoeira ou dos gases-estufa metano e dióxido de carbono, assim como o emprego de fertilizantes e pesticidas.
“Esses efeitos até agora não se refletem no preço de venda, mas custam indiretamente dinheiro a nossa sociedade”, explicam os pesquisadores da Escola Superior Técnica de Nurembergue e da Universidade de Greifswald, que acompanham a ação da Penny e calcularam os preços dos nove artigos.
Assim, os gases causadores do efeito estufa impulsionam as mudanças climáticas e, por conseguinte, eventos meteorológicos extremos “por cujos danos nós todos pagamos com impostos ou prêmios de seguro mais altos”. Outro custo oculto é o tratamento da água potável contaminada pelo uso de fertilizantes. As estimativas incluíram também os fatores solo e saúde.
Quanto mais ‘animal’, maior o custo ambiental
A organização ambientalista Greenpeace computa em 6 bilhões de euros por ano os danos ecológicos e climáticos decorrentes da produção de carne e laticínios na Alemanha. Via de regra, quanto mais “animal” um artigo é, mais alto seu custo real, explica a especialista em sustentabilidade Amelie Michalke, da Universidade de Greifswald. Já nos produtos vegetais, “os custos consequenciais são quase marginais”.
Mesmo nos alimentos orgânicos, nem todos os ônus ambientais estão contidos nos preços de venda normais. No entanto, a diferença desses produtos para os “custos verdadeiros” é, em média, de 1,15 euro – menos do que o 1,57 euro entre estes e os produtos convencionais.
A Penny já realizou uma campanha semelhante em 2020, também com a intenção de despertar maior consciência sobre os danos ao meio ambiente decorrentes da produção de alimentos. A diferença entre o “custo verdadeiro” e o preço usual será revertida para um projeto de proteção do clima e preservação de fazendas familiares na região dos Alpes.
Na prática, a cadeia de descontos não parte do princípio de que muitos vão comprar os artigos mais caros. “Contamos com uma queda de faturamento de alguns milhões”, revelou o presidente da companhia, Stefan Görgens, na abertura da campanha.
O empresário reconhece que muitos já sofrem com a presente alta dos preços dos alimentos, porém, é preciso encarar uma “mensagem incômoda”: se ninguém agir, os preços ficarão ainda muito mais altos no longo prazo.
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Campanha Wahre Kosten (curto verdadeiro), da rede de supermercados Penny, visa mostrar o que as mercadorias realmente valem
‘Jogada de lavagem verde’
Para a organização de proteção do consumidor Foodwatch, a ação não passa de “pura jogada de relações públicas”: enquanto exige “preço verdadeiro” de meros nove de seus artigos, a Penny teria reduzido ao mínimo o de outros alimentos com grande impacto ambiental e climático, como a carne.
Também o secretário-geral da Federação dos Agricultores Alemães, Bernhard Krüsken, criticou a campanha como “projeto de lavagem verde de uma rede de descontos que, de resto, pouco se importa com preços justos”.
O porta-voz da Penny Andreas Krämer se recusa a aceitar o rótulo de mero instrumento de publicidade para a campanha. Para uma empresa, afirma, é importante desenvolver uma atitude em relação às questões ambientais, a fim de permanecer atraente também para a clientela de amanhã e depois de amanhã, já que “nós sabemos que do setor de descontos também se espera sustentabilidade”.
Krämer não nega que, paralelamente à campanha, alguns produtos ficaram bem mais baratos, e atribuiu o fato a excessos de produção. A Penny não coloca absolutamente seus parceiros sob pressão, assegura o porta-voz, mas, ao mesmo tempo, tem pouca influência sobre a atribuição de preços dos intermediários ou da produção.
Pouco interesse pelos ‘custos verdadeiros’
As organizações ambientalistas Greenpeace e BUND, em princípio, louvam a campanha Wahre Kosten. No entanto: “a ação precisa ser seguida de medidas fundamentais. Isso é um dever tanto para as redes de supermercados quando para o governo federal”, ressalta Matthias Lambrecht, especialista em agricultura do Greenpeace.
Ele sugere, por exemplo, que Berlim exima os alimentos vegetais do imposto de valor agregado (IVA), como incentivo a uma mudança dos hábitos de consumo. Também o BUND e a Federação das Centrais de Consumidores (VZBV) são a favor de uma reforma do IVA, assim como de um amortecimento das altas dos preços, sobretudo para os cidadãos com menos recursos financeiros.
De fato, por diversas vezes, o ministro da Agricultura Cem Özedmir já propôs um direcionamento do consumo através dos preços. Porém, suas propostas de imposto zero para frutas, verduras e leguminosas, por exemplo, não encontraram ressonância no governo.
Numa consulta representativa do instituto de pesquisa de opinião YouGov, poucos fregueses da Penny se mostraram inclinados em pagar mais pelos produtos incluídos na campanha. No total, apenas 16%, sendo o entusiasmo especialmente fraco entre os acima dos 55 anos: desses, apenas 8% aceitam os “custos verdadeiros”.
Segundo o economista ambiental Tobias Gaugler, da Universidade de Nurembergue, contudo, as reações dos consumidores também fazem parte do experimento: se quase ninguém está disposto a aceitar os custos mais altos, será preciso encontrar outras formas de “reduzir as atuais distorções de preços no comércio”.