O Tribunal Europeu de Direitos Humanos (CEDH, na sigla em francês) examina pela primeira vez na quarta-feira (29/03), denúncias feitas por aposentados suíços e um ex-prefeito francês contra a França e a Suíça por omissão diante da mudança climática. Se o CEDH der ganho de causa aos demandantes, a jurisprudência poderia ser aplicada a outros Estados da UE.
Os membros da associação “Les Aînées pour la protection du climat suisse” (Anciãos pela proteção do clima suíço), que reúne mais de 2.000 membros com uma idade média de idade de 73 anos, denunciam as consequências do aquecimento global na sua saúde.
Já a França está sendo processada pelo ex-prefeito de uma cidade no norte do país ameaçada pelo aumento do nível das águas.
A primeira audiência começou às 9h15 (07h15 GMT) com o exame do caso suíço, com a casa cheia, um público de 400 pessoas, entre as quais muitos membros da associação.
“Estamos lutando há anos”, disse à AFP Bruna Molinari, de 81 anos, que mora no sul do cantão de Ticino, na Suíça. “Chegamos tão longe e espero que o tribunal nos dê razão para que a Suíça faça mais do que o que fez até agora.”
O caso é examinado pela Grande Câmara, formação suprema do Tribunal, composta por 17 juízes e presidida pela irlandesa Siofra O'Leary.
Para Jessica Simor, advogada dos requerentes, eles “já estão sofrendo os efeitos das mudanças climáticas” e a Suíça não está tomando medidas suficientes para combater o aumento das temperaturas, “duas vezes mais altas” neste país do que a média mundial”, diz.
“O calor mata”, martelou a advogada, “aumenta o risco de problemas renais, ataques de asma, doenças cardiovasculares (…)”, completou.
Esta audiência perante a CEDH é “um acontecimento histórico”, sublinhou na abertura Anne Mahrer, 64 anos, uma das porta-vozes dos “Anciãos pela proteção do clima suíço”, apoiados pelo Greenpeace Suíça.
A ação da associação teve início em 2016, com uma série de recursos que não tiveram sucesso.
Os ativistas recorreram então à CEDH para denunciar várias violações de artigos da Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos Humanos, em particular o que garante o direito à vida.
Jeanne Menjoulet/Flickr
Franceses se manifestam contra a mudança de clima nas ruas de Paris
Jurisprudência
O segundo caso, analisado na tarde desta quarta-feira, é um pedido do ex-prefeito de Grande-Synthe (norte da França), Damien Carême, hoje eurodeputado pelo partido Europa Ecologia-Os Verdes (EELV).
Em 2019, ele havia recorrido, em nome próprio e como prefeito, ao Conselho de Estado francês — um órgão que funciona como Tribunal Supremo para a Justiça Administrativa — por “inação climática“, considerando que sua cidade, localizada no litoral, estava ameaçada de submersão.
O mais alto tribunal administrativo deu razão ao município, em julho de 2021, deixando nove meses para a França “tomar todas as medidas úteis” para diminuir pela metade “a curva de emissões de gases de efeito estufa” para respeitar os objetivos do Acordo de Paris (-40% até 2030 em comparação com 1990).
O pedido de Carême em seu próprio nome foi, no entanto, rejeitado e ele recorreu à CEDH.
O eurodeputado de 62 anos sustenta que a “deficiência” da França em relação aos seus objetivos o afeta “diretamente”, pois “aumenta os riscos de que sua casa seja afetada” pelo aumento do nível das águas, indica o Tribunal em comunicado de imprensa.
“O interesse é extremamente alto”, disse à AFP a ex-ministra francesa do Meio Ambiente Corinne Lepage, advogada de Carême. Se a CEDH concordar com Carême, “esta jurisprudência seria aplicável em todos os Estados do Conselho da Europa”.
A Corte só deverá proferir suas decisões nos dois casos dentro de vários meses.
Além destes dois processos, o TEDH vai examinar, provavelmente depois do verão, outro grande caso climático, o de jovens portugueses que acusaram o seu país e outros 32 Estados por sua suposta inação contra o aquecimento global.