É importante aprofundar o significado, os limites e os riscos das políticas de inclusão social nas universidades públicas em geral e nas estaduais paulistas em particular.
Um debate que ocorre mesmo entre os que defendem as cotas sociais, pela via do renda ou pela origem na escola pública, é o das relações entre estas e as cotas étnicas.
Confesso que durante algum tempo não estive convencido das cotas étnicas, embora defensor convicto das cotas sociais. Meu raciocínio era que pretos, pardos ou índios não eram vetados no ingresso à universidade porque o fossem, mas porque eram pobres. Assim, um boa política de cotas sociais traria, automaticamente, a inclusão desses setores.
Curiosamente, quem me convenceu foi um deputado republicano durante as avaliações dos quarenta anos de ações afirmativas nos EUA. Ele afirmou não conseguir avaliar com precisão o quanto aquelas ações haviam sido boas para the black people, mas estar convencido que eram muito importantes para os alunos, professores e funcionários brancos.
Traduzo: certamente importa para alunos e alunas PPI estar nas salas de aula das melhores universidades públicas do país. Sim, importa que a filha do porteiro possa chegar ao doutorado. Mas talvez seja ainda mais importante, considerada o caráter estrutural do racismo, que alunos – e professores e funcionários – brancos passem a conviver, cotidianamente, com a sua presença na sala de aula e nos espaços até então domínio exclusivo, ou quase, da branquitude.
Também importa debater quanto e como, apesar dos sofismas meritocráticos, a universidade terá a ganhar em qualidade com sua a sua presença, no ensino, na pesquisa e, talvez sobretudo, na extensão.
Mas é fundamental, neste momento, alertar para os impasses e riscos de brutal regressão nesses ainda tímidos avanços civilizatórios.
Sabemos que além do ingresso é fundamental viabilizar a permanência desses alunos na universidade e isso custa dinheiro. Para as estaduais, ao menos enquanto Doria não conseguir avançar sobre o percentual do ICMS, há que escolher de onde tirar recursos para fortalecer a permanência. Mas e as universidades federais que não terão, muitas delas, nem mesmo condições de funcionar o ano inteiro?
E o que esperar de um governo cujo ministro da Economia, com o “mérito” de ter nascido em família rica, que pode pagar seu doutorado em Chicago e que se gaba de ler Keynes no original, propõe, como solução para o crescimento galopante da miséria e da fome no Brasil, o aproveitamento “racional” dos restos de comida das mesas e restaurantes da classe média?
Em lugar de uma política social, os genocidas e demofóbicos oferecem aquilo que a nossa tradição rural sempre conheceu como a “lavagem para os porcos”.