Em editorial publicado em 6 de agosto de 2011, logo após mais um rebaixamento dos títulos do Tesouro norte-americano por agências de avaliação de riscos de crédito, a agência oficial de notícias chinesa, Xinhua, conclamou os Estados Unidos a perseguirem uma política fiscal responsável. Segundo a Xinhua, os EUA devem aprender a “viver de acordo com os próprios meios” e “curar seu vício de endividamento”.
Mais ainda, o editorial retomou o tema, já abordado repetidamente por autoridades chinesas no passado recente, da criação de uma nova moeda de reserva global, como opção para se evitar uma catástrofe provocada pelas idiossincrasias de um único país.
Como é sabido, a China é a maior detentora de títulos do Tesouro dos EUA, com investimentos nos dias de hoje de aproximadamente US$ 1.2 trilhão nesse ativo, do total de US$ 3.3 trilhões de reservas, ou cerca de 36% do total.
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A linguagem oficial da China demonstra grande preocupação sobre a maneira pela qual a crise fiscal norte-americana poderá afetar a economia global e pressiona os EUA a adotar medidas de curto e médio prazo para mitigar os potenciais efeitos deletérios da situação.
Essa linha é muito próxima daquela postulada por décadas pelos EUA, seus estados clientes e organismos multilaterais sob sua condução, como o FMI (Fundo Monetário Internacional). Contudo, tais países são hoje adeptos da máxima do faça o que eu mando e não o que eu faço. Como bem lembrou Honoré de Balzac, “os costumes são a hipocrisia das nações”.
A longo prazo, os chineses defendem a necessidade da criação de uma nova moeda de reserva global, independente das vicissitudes da política interna de qualquer país, e que sirva de instrumento para a prosperidade coletiva dos povos e não para a riqueza seletiva de uns poucos em detrimento dos muitos, como quer a doutrina do manifesto destino.
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Trata-se de proposta séria e de ação necessária, já que a situação do dólar norte-americano é notoriamente insustentável e ameaça levar o mundo para um abismo financeiro e econômico sem precedentes na história da Humanidade.
Por outro lado, as autoridades monetárias brasileiras não veem o problema da mesma perspectiva. Em primeiro lugar, o Banco Central do Brasil, detentor da quarta maior posição mundial em títulos do Tesouro norte-americano, concentra nesses papéis um percentual que é o dobro daquele mantido pelos chineses. Quem estará certo?
Colonizados mentalmente e habituados a ver a ótica financeira, e bem assim a História, sob as perspectivas dos norte-americanos, as autoridades financeiras brasileiras têm dificuldades na análise objetiva da crise dos EUA e colocam em sério risco os melhores interesses do Brasil.
Por exemplo, nosso Ministro da Fazenda fez declarações derisórias a respeito do rebaixamento dos títulos do Tesouro norte-americano pela agência de avaliação de riscos de créditos da China, mas calou-se quando, dias após uma agência americana fez o mesmo.
Pior ainda, a cegueira brasileira na avaliação correta da situação global é também induzida pelo oportunismo de lançar mão de um artificialismo no combate à inflação: o real supervalorizado.
*Durval de Noronha Goyos Jr. é advogado, árbitro do Brasil na OMC (Organização Mundial do Comércio), e professor de direito do comércio internacional. Texto originalmente publicado no Última Instância.
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