A esquerda e a maioria do governo na Assembleia Nacional francesa chegaram a um acordo, nesta quinta-feira (24/11), sobre a maneira como o direito ao IVG (interrupção voluntária da gravidez) será inscrito no artigo 66 da Constituição francesa. A questão ainda está sendo examinada pelos parlamentares na Assembleia Nacional.
A emenda foi adotada nesta quinta-feira (24/11), por 226 votos a favor, 12 contra e 15 abstenções. Ela insere a frase “a lei garante a efetividade e a igualdade ao acesso ao direito à interrupção voluntária da gravidez”, modificando a proposta inicial da líder dos deputados do partido de extrema esquerda A França Insubmissa, Mathilde Panot.
Alguns deputados discordavam de uma frase proposta pela deputada: “ninguém pode negar o direito à interrupção voluntária da gravidez e à contracepção. A lei garante a qualquer pessoa que faça o pedido o acesso livre e efetivo a esse direito.”
Mesmo sendo favoráveis à constitucionalização do aborto, alguns parlamentares consideraram que a frase incluía o direito à contracepção na Constiuição – questão que já havia provocado polêmica na Assembleia. Segundo os deputados, um texto parecido foi rejeitado em outubro no Senado, cujo aval é indispensável para mudanças constitucionais.
De acordo com Panot, apesar da mudança, a decisão “previne” uma “regressão” conservadora. Ela faz alusão aos Estados Unidos e a alguns países da Europa, onde decisões de Cortes de Justiça reduziram o acesso à prática. No plenário, a deputada de extrema esquerda citou a escritora e filósofa Simone de Beauvoir: “bastará uma crise política, econômica ou religiosa para que os direitos das mulheres sejam colocados em questão.”
Ela lamentou, entretanto, que a menção à contracepção tenha sido deixada de lado. Segundo ela, os métodos contraceptivos são, com frequência, alvo dos ataques dos parlamentares contrários ao aborto, citando como exemplo, a Polônia.
Richard Ying
Ela insere a frase ‘a lei garante a efetividade e a igualdade ao acesso ao direito à interrupção voluntária da gravidez’
Superando divergências
O deputado Erwan Balanant, do partido de centro MoDem, assinou a nova versão do texto, aprovada hoje. Segundo ele, o acordo mostra que os parlamentares são capazes de “superar suas divergências políticas” em relação a certos assuntos.
Os partidos de direita e extrema direita tentaram dificultar a adoção da emenda, sugerindo centenas de modificações, muitas vezes sem nenhuma relação com o assunto. A esquerda, assim como o ministro da Justiça Eric Dupond-Moretti, denunciaram uma estratégia de “obstrução.”Apesar disso, 40 dos 55 deputados de extrema direita do partido Reunião Nacional presentes foram a favor da emenda após a mudança da frase, votada nesta quinta-feira.
Na França, o aborto cirúrgico pode ser realizado até o fim da 14ª semana de gravidez, ou seja, 16 semanas de amenorreia. O aborto por medicamentos é autorizado até o fim da sétima semana de gravidez. O procedimento é totalmente reembolsado pela Seguridade Social. Menores de idade devem pedir a autorização de um dos pais ou do responsável legal. O IVG foi legalizado na França em 1975,através da lei conhecida como “Lei Veil”, em referência à então ministra da Saúde, Simone Veil.