Fazio frio nesta terça-feira (8) quando o ex-presidente chileno Eduardo Frei Ruiz-Tagle entrou no Cemitério Geral de Santiago acompanhado de familiares e aliados políticos para homenagear o pai, o também ex-presidente Eduardo Frei Montalva, morto em janeiro de 1982. Na véspera, um juiz havia pedido a prisão de quatro supostos assassinos, alegando que o cristão-democrata, que governou o Chile de 1964 a 1970, não foi vítima de septicemia, como alegaram as autoridades na época, e sim envenenado progressivamente até falecer.
Rodrigo Aranga/AFP (08/12/2009)
Frei, acompanhado da família, visita mausoléu onde o pai está enterrado, em Santiago
“Existe um antes e um depois. Nunca ninguém tinha atentado contra a vida de um ex-presidente”, declarou visivelmente emocionado Eduardo Frei, com um cravo na mão. Ele, que é candidato da coligação de centro-esquerda Concertação para as eleições de domingo (13), cancelou todas as atividades de campanha previstas na oitava região, no sul do país.
O anúncio surgiu quando o candidato já tinha decidido enfocar na última semana o tema dos direitos humanos. No sábado (5), Frei divulgou 17 compromissos relacionados aos direitos humanos, aproveitando a oportunidade para criticar reuniões de seu principal adversário, o conservador Sebastian Piñera, com militares aposentados. Paralelamente, a presidente Michelle Bachelet anunciou a inauguração de um Museu da Memória às vésperas do segundo turno.
Herdeiros de Pinochet
A Concertação busca aumentar a polarização entre Eduardo Frei e Sebastian Piñera, com o debate sobre o regime militar e as violações de direitos humanos. A estratégia tem como objetivo lembrar que, apesar da distância reivindicada por Piñera com o general Augusto Pinochet, muitos de seus aliados colaboraram diretamente com o ditador.
Martin Bernetti/AFP (02/12/2009)
Piñera participa de carreata em Santiago
São eles os principais líderes da Renovação Nacional (RN) e da União Democrata Independente, os dois partidos que formam a coligação Aliança por Chile. “Todos os membros do entorno de Piñera são herdeiros de Pinochet”, declarou recentemente o ex-presidente Ricardo Lagos numa entrevista ao diário espanhol El Pais.
“Desta maneira, tentamos atrair eleitores distantes do núcleo duro da Concertação, que é de mais ou menos 20% na população”, explica um membro do Comitê de campanha de Frei, reconhecendo as dificuldades. Pela primeira vez desde o restabelecimento da democracia, a centro-esquerda chega à eleição divida. Frei tem que competir com o deputado Marco Enríquez-Ominami, 36 anos, e com Jorge Arrate. Os dois saíram do partido socialista para poder ser candidatos, quando a Concertação rejeitou a proposta de primárias.
“Não dá para comparar as pesquisas eleitorais no Chile, porque não existe uma metodologia única”, disse Marta Lagos, diretora do instituto Latinobarómetro. “Mas todas as pesquisas apontam para uma vantagem grande de Piñera, o que não significa que o eleitorado chileno seja mais à direita que antes. Pelo contrário, os três candidatos de esquerda somados juntam mais de 50% dos votos”, insiste a analista política.
Segundo pesquisa nacional do Centro de Estudos da Realidade Contemporânea (Cerc), divulgada hoje (9), Piñera tem 44,1% das intenções contra 31% de Frei. Enríquez-Ominami tem 17,7%. Nas projeções para o segundo turno, Piñera teria 49% contra 32% de Frei. Contra Ominami, o conservador venceria por 47% a 35%.
Futuro
A aritmética, porém, não é tão simples. No comando da campanha, que impressiona pelo silêncio, vários militantes reconhecem a dificuldade de acreditar num candidato como Frei. “Não é meu candidato, estou aqui porque o partido manda, mas para mim, ele é velho demais, e já foi presidente, já teve sua oportunidade, não representa o futuro”, admite um deles, pedindo anonimato.
A socialista Paula Narvaiz deixou um cargo no governo de Bachelet há quatro meses quando o comando de campanha lhe ofereceu ser porta-voz. “É verdade que temos um problema de comunicação, não podemos seguir com o discurso dos fundadores da Concertaçao, não funciona mais”, afirmou ao Opera Mundi, lembrando que esta eleição é a primeira organizada após a morte do general Augusto Pinochet, em dezembro de 2006.
Michelle Bachelet
Para ela, Frei tem que se apresentar ao eleitorado como uma ponte. “Já tivemos a transição democrática. Depois, a transição de gênero, com a eleição de uma mulher. Agora, o Chile precisa de uma transição geracional e Frei pode ser este homem que abre a porta aos jovens”, explica.
O comando de campanha não está muito preocupado pela falta de interesse dos mais jovens. Eles representam menos de 10% dos eleitores, já que uma maioria sem sequer está inscrita nos registros eleitorais.
“As pessoas mais velhas valorizam o trabalho da Concertaçao e reconhecem que trabalhamos bem durante os últimos vinte anos”, acrescenta Narvaiz, revelando o outro eixo da estratégia de campanha: conseguir a transferência da popularidade de Michelle Bachelet, que tem mais de 80% de opiniões positivas nestes últimos meses de mandato.
O governo soube lidar com a crise econômica e financeira, multiplicando os subsídios à construção e as ajudas aos bancos para evitar uma explosão do desemprego. Michelle Bachelet fica também na mente da população como a presidente dos programas sociais para as camadas mais pobres da sociedade, particularmente as mulheres. “Vamos ver este domingo se os eleitores consideram que esta herança e da Michelle ou da própria Concertação”, resume Marta Lagos, que não esconde seu ceticismo.
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