A Corte Penal Internacional (CPI), localizada em Haia, na Holanda, decidiu retomar as investigações contra a Venezuela por supostos crimes de lesa-humanidade.
A decisão foi divulgada nesta segunda-feira (27/06) em comunicado publicado pelo tribunal e remonta a um processo que teve início em 2018 para investigar supostas violações de direitos humanos cometidas pelo Estado durante os protestos opositores de 2014 e 2017.
“A Corte concluiu que, apesar de a Venezuela estar dando alguns passos na investigação, seus procedimentos criminais domésticos não refletem de maneira suficiente as investigações do procurador [Karim Khan]”, diz o documento.
Ainda na segunda-feira, o governo venezuelano manifestou desacordo com a decisão e disse que a investigação faz parte de uma estratégia dos EUA para “instrumentalizar os mecanismos da justiça penal internacional com fins políticos, vinculados com a estratégia de mudança de regime”.
Caracas ainda reconheceu delitos cometidos por agentes de segurança, mas disse que eles não configuram crimes de lesa-humanidade e já estão sendo investigados e punidos pelo Judiciário venezuelano.
“Atores políticos nacionais e internacionais quiseram sustentar uma acusação de supostos crimes de lesa-humanidade que nunca ocorreram, a partir da manipulação deliberada de um conjunto reduzido de delitos contra os direitos humanos que foram ou estão sendo investigados e punidos pelas autoridades do Sistema de Justiça da Venezuela”, disse.
O governo venezuelano ainda prometeu recorrer da decisão para “defender a verdade e assegurar seus direitos como nação contra essa ofensiva que abertamente utiliza a institucionalidade da CPI com fins contrários a sua natureza”.
Entenda o caso
O processo contra a Venezuela em Haia teve início em 2018, quando Argentina, Canadá, Chile, Peru e Paraguai apresentaram uma denúncia conjunta ao tribunal pedindo que o país fosse investigado por supostos “crimes contra a humanidade cometidos em território venezuelano desde 12 de fevereiro de 2014”.
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Governo venezuelano manifestou desacordo com decisão e disse que investigação faz parte de estratégia dos EUA
Os países que encabeçaram o pedido formal de investigação faziam parte do extinto Grupo de Lima, mecanismo político criado pelos países sul-americanos e pelo Canadá para pressionar a Venezuela e derrubar o governo do presidente Nicolás Maduro.
À época, Argentina, Chile, Peru e Paraguai eram governados por presidentes de direita. Quando o peronista Alberto Fernández venceu as eleições argentinas, retirou o país do Grupo de Lima.
O processo teve amplo respaldo da oposição venezuelana, que serviu praticamente como a verdadeira requerente do processo. Segundo os opositores, agentes do Estado teriam cometido crimes contra a humanidade durante as tentativas de conter os protestos violentos realizados por manifestantes da direita nos anos de 2014 e 2017.
Na Venezuela, os protestos ficaram conhecidos como “guarimbas” e foram convocados por partidos e movimentos de direita que pediam a saída de Maduro da presidência. As marchas deixaram centenas de mortos e ficaram marcadas por táticas violentas empregadas pelos manifestantes como ataques a sedes de partidos de esquerda e assassinatos de militantes chavistas.
As investigações em Haia foram abertas oficialmente em 2021, fato que culminou com a assinatura de um memorando de entendimento entre Maduro e o procurador da CPI, Karim Khan. “Respeitamos sua decisão como Estado, apesar de termos lhe manifestado que não compartilhamos da mesma”, disse o presidente venezuelano, à época.
Meses depois, em abril de 2022, Khan notificou o tribunal e pausou as investigações após receber um pedido da Venezuela para que os supostos crimes continuassem sendo apurados pelas autoridades locais. A suspensão durou até novembro do ano passado, quando o procurador pediu à Corte para retomar as investigações.
No último dia 9 de junho, Khan esteve pela terceira vez na Venezuela desde o início do processo e teve reuniões com Maduro, com a vice-presidente, Delcy Rodríguez, e com a presidente do Tribunal Superior de Justiça (TSJ), Gladys Gutiérrez.