Após 11 anos de espera, o governo argentino vai poder, finalmente, processar o padre Franco Reverberi Boschi, que desde 2011 se encontra na Itália. Isso por que, na última segunda-feira (31/07), o ministro da Justiça italiano, Carlo Nordio, autorizou sua extradição à Argentina.
Mesmo com 85 anos, ele será extraditado, e o procurador Dante Vega, responsável pelo pedido de extradição enviado em outubro de 2021, poderá levá-lo ao banco dos réus por conta do assassinato do ativista político José Guillermo Berón.
A ordem de execução foi enviada ao governo argentino na terça-feira (01/08). Segundo documento o qual Opera Mundi teve acesso, após a assinatura da documentação, a Interpol tem 45 dias para concordar com as autoridades argentinas sobre data, horário e modalidade da extradição.
O ministro Nordio assinou o documento baseado na sentença da Corte de Apelação do tribunal de Bolonha de 10 de julho, que autorizava a extradição do padre. O chefe da pasta considerou que os “crimes para os quais a extradição foi solicitada estão entre aqueles previstos no acordo de cooperação bilateral Argentina-Itália”.
Para o ministro, não há “motivos para acreditar que a pessoa (Dom Fraco), uma vez entregue, será submetida a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes ou, em qualquer caso, a atos que possam dar origem a uma violação de seus direitos fundamentais, conforme consagrados na Convenção para a Proteção dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais (CEDH) e/ou na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (Carta de Nice)”.
Sobre a condição de saúde do padre de 85 anos, Norbio ressaltou que os especialistas – ouvidos pela Corte de Apelação de Bolonha – concluíram que o estado de saúde de Dom Franco é “compatível com sua transferência compulsória para a Argentina, desde que certas precauções sejam tomadas para esse fim, incluindo a limitação da duração da viagem, escolhendo um voo direto e providenciando – ainda que como medida de precaução – uma bomba de oxigênio para a viagem”
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Mais de 30 mil pessoas foram mortas durante a última ditadura militar argentina (1976 e 1981)
Quem é Dom Franco Reverberi Boschi
Na época da ditadura do general Jorge Videla (1976 e 1981), Dom Franco era capelão militar e trabalhava na Casa Departamental, um centro clandestino de detenção. Segundo relatos de testemunhas, ele assistia sessões de tortura com a Bíblia nas mãos induzindo os prisioneiros políticos a colaborarem com seus torturadores.
Após a redemocratização na Argentina, e com o avanço das investigações contra os responsáveis por crimes cometidos durante a sangrenta ditadura de Videla, Dom Franco foi para a Itália durante o processo do Ministério Público de Mendoza, em 2010. O nome do padre entrou para a lista de procurados da Interpol em 2012.
O argentino sempre negou ter ciência de que pessoas contrárias à ditadura argentina fossem torturadas em San Rafael. No entanto, cinco testemunhas descreveram com detalhes o que sofreram na prisão clandestina, confirmando a presença do padre. Um deles, Roberto Flores, disse que o sacerdote não participou da violência diretamente, mas impassivelmente, com a Bíblia na mão.
Já Mário Bracamonte disse tê-lo visto quatro vezes: “lembro-me de que em uma tarde fomos submetidos a uma surra particularmente violenta. O chão da sala estava vermelho de sangue. Dom Franco ordenou que limpássemos com nossos corpos. Era inverno, a temperatura era de 10 graus abaixo de zero”.
Ainda de acordo com a testemunha, em uma noite, Bracamonte foi torturado por quatro horas. Em um determinado momento, viu Franco, que lhe disse: “o que você está olhando? Cão!”.