Documentos divulgados na noite desta quinta-feira (04/10) por comitês do Congresso dos Estados Unidos revelam que diplomatas norte-americanos teriam reforçado o pedido feito pelo presidente Donald Trump para que a Ucrânia investigasse a atuação do filho do pré-candidato democrata à Casa Branca Joe Biden no conselho de a uma empresa de gás no país.
A investigação teria sido imposta pelo governo norte-americano como condição para a realização de uma visita de Estado do presidente ucraniano, Volodymyr Zelenskiy, à Casa Branca.
A denúncia surgiu com a divulgação de uma série de mensagens de texto, por parte dos investigadores do Congresso, após uma sabatina de 10 horas com um dos diplomatas, Kurt Volker, que deixou o cargo de enviado especial à Ucrânia após o escândalo que levou ao início de um processo de impeachment de Trump na Câmara dos Representantes.
O conteúdo das mensagens evidencia o que seria uma oferta por uma troca de favores por parte dos norte-americanos, na qual Trump se beneficiaria da investigação sobre um de seus principais adversários políticos e favorito à concorrer á presidência pelo Partido Democrata.
Segundo as mensagens, três diplomatas norte-americanos teriam deixado claro ao governo ucraniano que uma possível melhora nas relações entre Kiev e Washington iria depender da cooperação de Zelenskiy na busca por informações sobre negócios do filho de Joe Biden, Hunter Biden, na Ucrânia. Os norte-americanos avaliaram que essas informações poderiam ser prejudiciais à campanha do senador democrata.
Em mensagem de texto antes de uma conversa telefônica entre Trump e Zelenskiy no dia 25 de julho, Volker escreveu ter ouvido da Casa Branca que “presumindo que o presidente Z convença Trump de que vai investigar […] acertaremos a data para a visita a Washington”.
Um assessor da presidência ucraniana deu sinais de concordar com o inquérito, que teria como alvo a empresa de gás Burisma, onde Hunter Biden atuou como membro do conselho administrativo ao mesmo tempo em que seu pai liderava a diplomacia do governo do ex-presidente Barack Obama com Kiev.
Apesar de uma desconfiança sobre possíveis atos de corrupção, não há até o momento provas de que o ex-vice ou seu filho tenham cometido irregularidades.
“O telefonema ocorreu bem”, disse Andrey Yermak em mensagem a Volker após a conversa entre os dois lideres. O ucraniano sugeriu diversas datas no mês de setembro para o encontro entre Trump e Zelenskiy. Os entraves surgiram quando o assessor ucraniano tentou selar o encontro antes de declarar oficialmente a abertura do inquérito sobre Biden.
“Quando tivermos uma data, convocaremos uma coletiva de imprensa para anunciar a visita e delinear nossa visão para uma renovada relação EUA-Ucrânia, incluindo entre outras coisas, Burisma e investigações sobre interferência nas eleições”, escreveu Yermak duas semanas aos a conversa telefônica entre Trump e Zelenskiy. “Me parece bom”, respondeu Volker.
Shealah Craighead/White House
Diplomatas reforçaram pedido feito por Trump para que Ucrânia investigasse filho de democrata
Volker e outros dois embaixadores – William “Bill” Taylor, encarregado de negócios da embaixada dos EUA na Ucrânia, e Gordon Sondland, embaixador norte-americano na União Europeia – discutiram a declaração que Zeneskiy emitiria em apoio à investigação. Em meio às negociações, Sondland afirmou que Trump “realmente quer o resultado”.
O presidente norte-americano deixou em suspenso o envio de 250 milhões de dólares em ajuda militar à Ucrânia, que conta com o financiamento para reforçar a defesa contra a Rússia, em meio a uma prolongada insurgência de separatistas pró-Moscou no leste do país.
Taylor, o diplomata de patete mais alta na embaixada norte- americana em Kiev, expressou preocupação com a medida. “Estamos agora afirmando que a assistência de segurança e o encontro na Casa Branca estão condicionados às investigações?”, escreveu.
“Este é, para mim, o cenário de pesadelo”, afirmou dias depois a seus colegas em mensagem de texto. A medida, segundo Taylor, já havia abalado a confiança dos ucranianos nos norte- americanos.
Os congressistas democratas em Washington iniciaram o processo do impeachment de Trump após um delator anônimo revelar o conteúdo do telefonema entre Trump e Zelenskiy, onde o norte- americano pressiona o presidente recém-empossado para interferir nas eleições norte- americanas ao buscar informações prejudiciais a Biden.
As mensagens demostram que, um mês após o telefonema, Trump cancelou a visita de Zelenskiy e enviou diplomatas para tentar resgatar os esforços e marcar um encontro do líder ucraniano com o vice-presidente Mike Pence ou o secretário de Estado, Mike Pompeo. O que se seguiu foram várias tentativas de reparar os danos, com trocas de acusações.
Taylor disse a Sondland que contava com ele para “fazer o que é correto”, ao que ele respondeu: “Bill, eu nunca disse que era correto.”
“Como disse ao telefone, acho uma maluquice suspender a ajuda militar para obter ajuda em uma campanha política”, afirmou Taylor. Sondland, por sua vez, disse que não era este o caso, e que Trump deixou claro que “não se trata de forma alguma de quid pro quo [troca de favores]” e sugeriu que encerrassem a discussão via mensagem de texto.
Ao divulgar as mensagens, a presidência do comitê democrata no Congresso afirmou que elas são apenas uma parcela do total do material fornecido por Volker, que esperam divulgar em sua totalidade em breve.