Dono do site de desinformação Infowars, o ativista de extrema direita americano Alex Jones foi condenado pela primeira vez pela Justiça dos EUA por espalhar informações falsas, negando a existência do pior atentado a uma escola na história dos Estados Unidos: o massacre de Sandy Hook, em 2012, em que 20 crianças com idade entre seis e sete anos e seis funcionários foram mortos por um jovem de 20 anos com livre acesso a armas de fogo.
A decisão da Justiça do estado do Texas sentenciou Jones nesta quinta-feira (05/08) ao pagamento de indenização no valor de US$ 4,11 milhões (R$ 21,4 milhões) à família de uma das crianças mortas no ataque. O valor total pode ser ainda maior, já que os pais, Neil Heslin e Scarlett Lewis, ainda aguardam decisão do tribunal em Austin sobre o valor de outras indenizações.
O jornalista alegou falsamente que o tiroteio em Sandy Hook havia sido uma “encenação” orquestrada por interessados em aumentar o controle sobre armas nos Estados Unidos – no país, famoso pelo acesso fácil a armas de fogo e massacres recorrentes, há menos cidadãos que armas em poder de civis.
O valor total da indenização nesse caso, que ainda não foi estipulado, poderá estabelecer um marco no futuro para outros processos contra Jones e o deixa sob pressão financeira. Também levanta dúvidas sobre a existência do Infowars no futuro – o site foi banido do YouTube, Spotify e Twitter por propagar mensagens que incitam o ódio.
A defesa de Jones havia pedido à Justiça que limitasse o valor das compensações a U$ 8 dólares. O próprio jornalista chegou a afirmar que qualquer sentença acima de US$ 2 milhões significaria a sua ruína.
Jones é amplamente conhecido em círculos de extrema direita e seu estilo serviu de modelo para imitadores mundo afora. Ele já foi chamado pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro, de “guerreiro” e suas publicações já foram compartilhadas por figuras do bolsonarismo como as deputadas Bia Kicis e Carla Zambelli. Em março de 2020, Jones entrevistou o filho do presidente da República sobre os perigos do “socialismo (…) e como o despertar global está acontecendo e levará a grandes coisas para os amantes da liberdade”
Além de espalhar mentiras sobre o massacre de Sandy Hook, Jones regularmente repete teorias conspiratórias sobre os atentados de 11 de Setembro, o ex-presidente Barack Obama, a pandemia de covid-19 e sobre uma suposta “Nova Ordem Mundial”. Mais recentemente, ele esteve diretamente envolvido no protesto de 6 de janeiro de 2020 que resultou na invasão da sede do Congresso americano por uma turba de extremistas.
Briana Sanchez/REUTERS
Alex Jones, dono do site "Infowars", durante julgamento em que foi condenado a indenizar família de uma das vítimas do massacre de Sandy Hoo
Família sofreu ameaças e intimidações
Neil Heslin e Scarlett Lewis haviam relatado em depoimento ao tribunal o sofrimento por que passaram ao longo de dez anos de trauma: primeiro com a morte do filho e, depois, ao terem sua casa alvejada por tiros, serem intimidados por pessoas estranhas na rua e receberem ameaças pela internet e pelo telefone – tudo, afirmam, foi incentivado por Jones e seu site Infowars.
A mãe da criança chegou a confrontar Lewis em um dos momentos do julgamento. “É incrível que nós tenhamos que estar aqui fazendo isso, que tenhamos que implorar para que você seja punido e pare de mentir.”
Ao longo do processo, o jornalista também foi confrontado pela defesa da família ao alegar que não usava emails. A defesa, porém, apresentou uma correspondência do Infowars em que um funcionário relatava receitas de US$ 800 mil dólares em um único dia com a venda de produtos no site.
Durante o julgamento, a empresa de Jones, Free Speech System, controladora do portal Infowars, entrou com pedido de falência. Pais das vítimas de Sandy Hook afirmam que o movimento foi uma estratégia para evitar as indenizações e alegam que o jornalista tirou US$ 62 milhões da companhia e criou dívidas inexistentes no valor de US$ 65 milhões – valor que seria inteiramente devido a uma outra companhia controlada por Jones, a PQPR Holdings.
Não é o único julgamento que o jornalista deve enfrentar no estado do Texas – ele responde a processo semelhante em Connecticut movido por parentes de outras vítimas e um agente do FBI, o serviço de inteligência norte-americano, que cuidava das investigações sobre o atentado, e a um segundo processo na cidade de Austin.
Em pronunciamento em vídeo, Jones, que anteriormente chegou a enquadrar os processos contra ele na Justiça como ataques à sua liberdade de expressão, declarou: “Eu admito que eu espalhei desinformação, mas não o fiz de propósito. Pedi desculpas às famílias, e o tribunal entendeu isso. Foi errado o que fiz a essas famílias, mas não o fiz de propósito”. Sua defesa também tentou eximir o jornalista da responsabilidade pelo assédio que o casal Neil Heslin e Scarlett Lewis passaram a sofrer após as mentiras espalhadas pelo Infowars.