Após vários dias sem resposta e de um evidente constrangimento, o governo do premiê socialista Pedro Sanchez esclareceu, através de um comunicado do Ministério da Defesa publicado no sábado (23/12) à noite, que se opõe a uma ampliação da missão da operação europeia Atalanta, que luta contra a pirataria no Oceano Índico desde 2008.
O ministério lembra que a missão Atalanta está atualmente limitada apenas à Espanha e a um único navio, a fragata Victória, e destaca que a retomada dos ataques piratas na região “exige o máximo investimento” desta missão.
“A natureza e os objetivos da missão Atalanta (…) nada têm a ver com aqueles que se pretende alcançar no Mar Vermelho”, insiste ainda o ministério.
O governo espanhol considera, portanto, “indispensável” a criação de uma missão “nova e específica” dedicada à proteção do tráfego marítimo comercial no Mar Vermelho.
A iniciativa deve ter “um âmbito de ação, meios e objetivos próprios, decididos pelos órgãos competentes da União Europeia”, continua a nota, acrescentando que “Espanha não se opõe de forma alguma à sua criação”.
Questionado neste domingo (24/12) pela AFP, porta-voz do Ministério da Defesa esclareceu, no entanto, que a Espanha “não participará” desta operação da UE. O ministério não explicou os motivos desta recusa, anunciada logo após um telefonema na sexta-feira (22/12) do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, para Sánchez.
A Casa Branca sublinhou num comunicado de imprensa que a conversa se baseou, em particular, “(na condenação) dos atuais ataques dos houthis contra navios comerciais no Mar Vermelho”, um assunto que o governo espanhol não mencionou ao relatar a conversa dos dois chefes de Estado por telefone.
Questões internas
De acordo com a imprensa espanhola, a recusa de Madri de se envolver nesta missão liderada pelos Estados Unidos explica-se provavelmente por razões políticas internas.
Sánchez precisa lidar, dentro da coligação governamental, com um partido de esquerda radical, o Sumar, muito hostil à política externa americana.
Numa entrevista para rádio na última quinta-feira (21/12), a líder desta legenda, Yolanda Díaz, também vice-presidente do governo, considerou a rapidez dos países ocidentais em proteger o comércio marítimo internacional “extremamente hipócrita”, contrastando-a com a sua impotência para proteger a população civil de Gaza dos bombardeamentos israelenses.
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O Ministério da Defesa da Espanha se negou a participar da força multinacional para patrulhar o Mar Vermelho
Guardiões da Prosperidade
A criação desta coligação militar no Mar Vermelho, denominada “Guardião da Prosperidade” e liderada pelos Estados Unidos, foi anunciada pelo ministro da Defesa norte-americano, Lloyd Austin, na segunda-feira (18/12) em Washington.
Austin disse que vinte países participariam nesta coligação, incluindo a Espanha. Segundo o site de notícias El Confidencial e o diário El País, este anúncio causou descontentamento no governo espanhol, que não foi consultado previamente.
A porta-voz do governo espanhol, Pilar Alegría, alertou que a Espanha “nunca participaria numa operação [de forma] unilateral” e exerceria “a máxima cautela”.
A formação desta coalizão constitui uma fonte adicional de tensão para as relações entre Madri e Washington, recentemente perturbadas por um caso de espionagem. A Espanha expulsou discretamente dois agentes americanos que se infiltraram nos serviços secretos espanhóis.
No seu comunicado de imprensa, o Ministério da Defesa considera, no entanto, oportuno esclarecer que “Espanha é e será sempre um aliado sério e confiável” das missões militares da UE, da Otan e das Nações Unidas, “como demonstram os 3 mil homens e mulheres das forças armadas espanholas” atualmente empenhados em missões de paz.
Drones derrubados
No sábado (23/12), os Estados Unidos anunciaram que quatro drones que seguiam em direção a um destroyer americano no sul do Mar Vermelho foram derrubados. Tudo indica que eles tenham sido lançados de áreas do Iêmen controladas pelos houthis.
“Esses ataques são os 14º e 15º contra navios comerciais dos rebeldes houthis desde 17 de outubro”, disse o Comando Central americano (Centcom) em uma mensagem no X, antigo Twitter.
On December 23 two Houthi anti-ship ballistic missiles were fired into international shipping lanes in the Southern Red Sea from Houthi controlled areas of Yemen. No ships reported being impacted by the ballistic missiles.
Between 3 and 8 p.m. (Sanaa time), the USS LABOON (DDG… pic.twitter.com/jcBisbXBaS
— U.S. Central Command (@CENTCOM) December 24, 2023
Os rebeldes houthis, aliados do Irã, que controlam a maior parte do Iêmen, estão atrapalhando o comércio marítimo mundial ao atacar navios que passam pelo Estreito de Bab el Mandeb, no extremo sul do Mar Vermelho, em resposta à guerra liderada por Israel em Gaza.
O Comando Central americano disse ter respondido aos pedidos de socorro de dois navios atacados neste fim de semana.
Um navio-tanque de bandeira norueguesa relatou ter evitado por pouco um ataque de drone e um navio-tanque de propriedade gabonesa e de bandeira indiana disse que foi atingido.
Dois mísseis balísticos também foram “disparados contra rotas marítimas internacionais no sul do Mar Vermelho, a partir de áreas do Iêmen controladas pelos huthis”. “Nenhum navio foi atingido” por esses disparos, informou o Centcom na mensagem.
(Com informações da AFP)