Os Estados Unidos anunciaram na noite desta quarta-feira (18/10) a maior flexibilização nas sanções contra a Venezuela desde o início do bloqueio contra o país sul-americano. Através de seis licenças gerais, o Departamento do Tesouro norte-americano liberou temporariamente transações do setor de petróleo, gás e ouro venezuelano.
Além disso, medidas de alívio também envolvem negociações de títulos nacionais no mercado de ações e permissões à companhia aérea estatal venezuelana Conviasa, que foi liberada para voar aos EUA em missões de repatriação de migrantes.
A decisão foi justificada por Washington como sendo uma resposta ao acordo assinado entre governo e oposição da Venezuela nesta terça-feira (17/10) em Barbados, que definiu o período para a realização das eleições presidenciais venezuelanas e estabeleceu outras regras sobre o pleito.
Desde que assumiu a necessidade de voltar a negociar com Caracas por um problema na demanda por combustíveis, a Casa Branca vinha citando a elaboração de um cronograma eleitoral como uma espécie de requisito que deveria ser apresentado pelo governo venezuelano para a eliminação de sanções.
Agora, segundo o Escritório para Controle de Ativos Estrangeiros (OFAC, na sigla em inglês), a renovação das novas licenças está condicionada ao cumprimento do acordo eleitoral. “O Departamento do Tesouro está preparado para modificar ou revogar as autorizações a qualquer momento se representantes do [presidente Nicolás] Maduro falharem em seguir seus compromissos”, disse o órgão em nota.
O governo venezuelano celebrou as suspensões e classificou o ato como uma vitória diplomática e um primeiro passo para a “suspensão total do bloqueio”. Na noite desta quarta-feira, Maduro disse que ambos os países encontraram um caminho para o fim das sanções e espera que possam “virar a página”.
“Digo aos Estados Unidos que sempre quisemos e ainda queremos relações de respeito. Parem com seus ódios contra o projeto revolucionário, contra a Venezuela soberana, seu desejo de vingança. Vamos virar a página e reconstruir uma relação de respeito e de cooperação”, disse.
Fim do bloqueio?
Apesar de beneficiar as áreas mais importantes da economia venezuelana e de ter surpreendido inclusive figuras da oposição pela amplitude de seu alcance, as licenças emitidas pelos EUA nesta quarta-feira não representam o fim do bloqueio contra a Venezuela.
Isso porque elas são apenas licenças gerais, que podem ser revogadas unilateralmente pelo Departamento do Tesouro. Além disso, todas as mais de 900 sanções contra o país sul-americano “seguem vigentes e nós continuamos a responsabilizar criminosos”, disse a OFAC em nota.
Apesar do caráter temporário, essa foi a mais numerosa e mais significativa emissão de licenças feita pelos EUA desde que o país iniciou formalmente o bloqueio contra a Venezuela, em 2014, durante o governo do democrata Barack Obama. Até então, a maior licença havia sido concedida à gigante energética Chevron, em dezembro do ano passado, quando ela foi autorizada a retomar suas operações em território venezuelano.
No entanto, as medidas anunciadas nesta quarta-feira devem permitir a “produção, extração, venda e exportação de petróleo de gás da Venezuela e o fornecimento de bens e serviços relacionados”. Além disso, a licença autoriza o pagamento em dinheiro por essas atividades e também novos investimentos no setor.
Prensa presidencial
Nicolás Maduro e Jorge Rodríguez celebram acordo com oposição e alívio nas sanções dos EUA
Na prática, essas disposições deixam sem efeito a proibição total determinada pelo ex-presidente Donald Trump em 2019 que proibiu qualquer negociação que envolvesse a estatal petroleira da Venezuela PDVSA e suas subsidiárias. A medida teve um efeito grave na crise econômica do país, já que praticamente bloqueou as atividades petroleiras venezuelanas. Segundo dados oficiais, o país sofreu uma redução de 98% no ingresso em dólares nos últimos 10 anos.
Ainda não está claro qual seria o impacto econômico das licenças recém emitidas, mas segundo a vice-presidente venezuelana, Delcy Rodríguez, o Estado não teria problemas em receber por eventuais transações já que as medidas também autorizam a utilização do Banco Central da Venezuela e do Banco da Venezuela para realizar pagamentos.
O esclarecimento feito por Rodríguez tem relação com o fato de que os EUA seguem sem reconhecer formalmente o governo Maduro e, portanto, mantêm relações oficiais apenas com as instituições fictícias criadas pela oposição durante o período em que Juan Guaidó foi considerado “presidente interino”. Entre essas “instituições” estaria um Banco Central paralelo.
“As licenças também autorizam o BCV e o BdV para as transações financeiras relacionadas a operações de petróleo e gás em nosso país. Essa autorização vai permitir os mecanismos de pagamento. Isso é um primeiro passo para restabelecer a legalidade internacional em relação às liberdades econômicas e financeiras”, disse a vice-presidente.
As licenças da OFAC ainda permitem negociações com a estatal mineira venezuelana Minerven no comércio internacional de ouro. Outra liberação foi a transação de títulos venezuelanos no mercado secundário de ações.
Além disso, a companhia aérea estatal Conviasa foi autorizada a realizar voos de repatriação de migrantes venezuelanos que estão nos EUA. A participação da empresa faz parte de um acordo prévio assinado entre Washington e Caracas que prevê também voos norte-americanos à Venezuela trazendo cidadãos do país. Nesta quarta-feira, o primeiro voo que fez parte desse acordo aterrissou no aeroporto internacional de Caracas trazendo 131 venezuelanos provenientes do Estado do Texas.
Opositores soltos
Na madrugada desta quarta-feira, o chefe da delegação opositora na mesa de diálogo, Gerardo Blyde, anunciou a liberação de cinco políticos opositores que estavam presos no país. Segundo Blyde, as solturas também fazem parte das negociações com o governo. “É um longo processo que agora começa a acontecer”, disse.
Entre os liberados estão o ex-deputado Juan Requesens, preso há cinco anos e condenado em 2022 pela tentativa de assassinato contra o presidente Nicolás Maduro que ocorreu em 2018, e Roland Carreño, ex-assessor de Juan Guaidó que foi preso em 2020 acusado de planejar atos de sabotagem contra a indústria petroleira. Além deles foram soltos Marco Antonio Garcés, acusado de facilitar a entrada de espiões norte-americanos na Venezuela, Eurinel Rincón e Mariana Barreto.
A liberação dos cinco políticos foi celebrada não apenas pela delegação opositora nos diálogos, mas também por outras figuras da direita como o ex-candidato à Presidência Henrique Capriles e por outros partidos da oposição. Até o fechamento desta matéria, o governo venezuelano ainda não havia comentado a soltura dos presos.