O governo cubano propôs aos Estados Unidos a realização de um novo acordo migratório entre os dois países, que substituiria o assinado em 1984 e renovado doze anos mais tarde. A proposta foi feita durante a reunião realizada em Nova York ontem (14), a primeira desde 2003, quando a administração Bush decidiu interromper esses contatos regulares.
Havana não deu grandes detalhes das razões que levaram a propor um novo acordo migratório, mas num comunicado publicado hoje (15) no diário oficial Granma, afirma-se que a ideia da proposta é “garantir uma imigração legal, segura e ordenada entre os dois países e cooperar da forma mais efetiva no enfrentamento ao tráfico ilegal de pessoas”.
Não houve uma resposta imediata por parte dos Estados Unidos à proposta e um porta-voz do Departamento de Estado se recusou a comentar o assunto ao Opera Mundi.
De todos os modos, aparentemente a delegação cubana queixou-se de que o acordo migratório vigente não pode ser cumprido integralmente, “enquanto exista a chamada Ata de ajuste Cubano e a política de pés secos-pés molhados” que, na ótica de Havana, “estimula as saídas ilegais e o contrabando de pessoas, ao dar-lhe um tratamento preferencial quando chegam aos Estados Unidos”.
O porta-voz do Departamento de Estado, Ian Kelly, referiu-se praticamente nos mesmos termos ao encontro, mas não fez referência à proposta cubana.
“A delegação norte-americana destacou o êxito em termos de cooperação migratória, ao mesmo tempo em que identificou aquelas onde ainda há dificuldades para implementar os acordos”, afirma o comunicado do Departamento de Estado, distribuído ao fim da tarde de ontem (14).
Segundo o mesmo, a agenda incluiu preocupações de Washington no sentido de que seus diplomatas em Havana tenham livre acesso ao resto do país, a melhoria nas condições de devolução dos cubanos repatriados e a necessidade de aumentar o numero de deportações de criminosos comuns.
Os Estados Unidos “vêem estes encontros como uma forma de conseguir resultados práticos que possam levar ao cumprimento total dos acordos entre os dois países e à segurança de nossos cidadãos”, acrescenta o texto.
Washington enviou ao encontro o subsecretário de Estado assistente para assuntos latino-americanos, Craig Kelly, enquanto Havana foi representada pelo antigo chefe de sua missão diplomática em Washington, Dagoberto Rodriguez.
O restabelecimento do diálogo foi proposto a Havana por Washington em maio passado, dentro de uma ampla política de degelo das relações, que a administração de Barack Obama quer implementar.
Em maio, o presidente anunciou também o levantamento de todo tipo de restrições de viagens e envio de remessas à ilha pelos cubano-americanos, proibidos de o fazer ou com grandes limitações desde 2002, por iniciativa do ex presidente George W. Bush.
Os cinco
No entanto, o lado cubano nunca reagiu com grande entusiasmo às propostas e gestos de Barack Obama, em parte porque considera que o primeiro passo de Washington para o reatamento deve ser a libertação de cinco cidadãos cubanos presos nos Estados Unidos desde 1998.
No fim de semana passado, o presidente do Parlamento cubano, Ricardo Alarcón, voltou a repetir a asseveração feita no mês passado no sentido de que a libertação dos cinco indivíduos “é o principal impedimento ao melhoramento de relações” e “a prioridade da diplomacia cubana”.
Segundo Alarcón, o presidente norte-americano tem o poder de ordenar a libertação do grupo e ao não o fazer, continua a “favorecer a manutenção do terrorismo” contra a ilha.
“Obama pode solucionar este caso retirando as acusações formuladas como fez em maio passado com três pessoas com as quais se encontrou grande quantidade de informação secreta transmitida a um governo estrangeiro, segundo informou o Wall Street Journal”, disse Alarcón, a um grupo de jornalistas.
Os cinco cubanos foram condenados a penas que oscilam entre prisão perpétua e 15 anos, acusados de espionarem instalações militares norte-americanas, participarem direta o indiretamente na queda de dois aviões civis com a consequente morte de seus quatro pilotos e seguirem as atividades de organizações anticastristas de Miami.
Segundo se soube durante o julgamento, realizado no ano 2000, o governo norte-americano tinha certo conhecimento prévio das atividades do grupo, mas nunca conseguiu provar que ele tivesse acesso à informação confidencial ou militar.
Uma fonte familiarizada com as discussões migratórias disse ao Opera Mundi que o tema dos cinco não faz parte da agenda.
Isto levou analistas a mostrarem certa frustração porque pensam que neste momento existem muitos outros temas que deviam ser abordados em reuniões conjuntas.
É o caso de Wayne Smith, um ex-diplomata norte-americano residente em Havana, tanto antes como depois do triunfo da revolução cubana. “É lamentável que as conversas sejam só sobre imigração, porque existe uma longa lista de temas que os dois países deveriam estar discutindo”, considerou Smith, hoje analista de assuntos cubanos do Center for International Policy.
“Não vejo como conversar só sobre imigração possa melhorar realmente as coisas”, acrescentou Smith, que neste momento organiza a visita a Havana de uma delegação para conversar sobre cooperação comum em situações de desastres naturais, como os furacões.
Encontros passados
Os encontros sobre imigração realizaram-se regularmente duas vezes por ano entre 1996 e 2003, até que a administração Bush decidiu as suspender.
O acordo entre os dois países implica a concessão de 20 mil vistos anuais a cidadãos cubanos para emigrarem aos Estados Unidos, ao mesmo tempo que Havana se compromete a receber os cubanos deportados, seja por crimes comuns ou imigração ilegal.
Paralelamente, existe outro acordo segundo o qual Washington devolve a Havana todos os cubanos capturados em mar aberto, tentando entrar nos Estados Unidos. Os que conseguem chegar a terra firme podem permanecer em território norte-americano de acordo com a chamada “Ata de Ajuste Cubano”, um mecanismo criado durante a Guerra Fria e que Havana critica constantemente, já que considera que é um estimulo à iilegal.
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