Antes mesmo da divulgação do resultado oficial das eleições, o presidente boliviano, Evo Morales, passou boa parte da segunda-feira (7) reunido com seu gabinete ministerial e diretores das empresas estatais para planejar o segundo mandato, que terá início oficial em 24 de janeiro de 2010. Dentre as prioridades futuras está a industrialização da Bolívia, com base no gás, no ferro e no lítio – o país possui a maior reserva mundial do mineral, usado em baterias de longa duração.
“Há dois temas capitais que o governo deve cumprir: a industrialização, para que deixemos de produzir e exportar só matérias-primas como hidrocarbonetos e minérios, e a justiça social, que se resume numa luta frontal contra a pobreza”, afirmou Evo ontem (foto abaixo).
Martín Alipaz/EFE
O plano de governo prevê a instalação de uma planta de liquefação de gás natural (GTL) para converter gás em diesel e de processamento de amoníaco e uréia em Cochabamba, região central do país. Também está prevista a construção de uma planta para a industrialização de ferro e três novas hidrometalúrgicas, para explorar cobre (La Paz) e zinco (Oruro e Potosí), além da exportação de mutum.
“Não vamos mais vender somente o minério como no passado, vamos industrializar essas riquezas”, afirmou ao Opera Mundi Saul Villegas, diretor de recursos evaporíticos, setor responsável pela exploração das reservas de lítio da estatal Corporação Mineira da Bolívia.
“Cada primeira fase de industrialização, até obtermos o cloridatro de lítio e também cloreto, sulfato de potássio e ácido bórico, será feita pelo estado. Cem por cento estatal. Nas fases seguintes, como fábricas de baterias de carros e fertilizantes, estamos abertos à participação, mas através de empresas de maioria estatal”.
Considerado o “ouro branco” do século 21, devido ao potencial de uso em automóveis elétricos, as reservas do minério ultrapassam nove milhões de toneladas, segundo Villegas. Hoje em dia, uma tonelada de cloridrato de lítio vale seis mil dólares.
Villegas conta que, desde o ano passado, diversas empresas fizeram propostas, de olho no lítio boliviano. “Vieram empresas de todo tipo. Empresas sérias, outras não sérias, propostas do tipo, “nós vamos fazer a exploração e vocês ficam só olhando”, contou.
Segundo ele, a mineradora brasileira Vale apresentou uma das propostas “mais sérias” – que, no entanto, foi rechaçada. “Foi preciso o presidente ser bem incisivo e deixar claro que até o cloridatro vai ser 100% boliviano. Agora, mudaram de tom”.
Villegas garante que até março do próximo ano será inaugurada a primeira planta experimental onde será pesquisado o melhor método de industrialização. A produção em escala industrial, com investimentos puramente estatais e quantidade de 30 mil toneladas ao ano, deve ter início em 2013 e 2014.
“Só depois das pesquisas vamos poder saber se poderemos seguir esse caminho sozinhos ou teremos limitações técnicas e financeiras e precisaremos de parceiros para as outras etapas de industrialização”, explicou.
Consolidação da mudança
O atual governo dá sinais de que não pretende esperar para dar início à consolidação do “processo de mudança”, iniciado no primeiro mandato, em 2006. “É um processo irrefreável”, disse Evo ontem.
Um dos principais desafios será reescrever as leis do país, que agora devem se adequar à nova Constituição, aprovada em janeiro. A Carta Magna estabelece, dentre outros, a realização de eleição para magistrados, limite de 5 mil hectares para novas propriedades, o direito das comunidades sobre recursos naturais e o reconhecimento da justiça comunitária praticada por algumas etnias indígenas.
“No dia 6 de janeiro faremos uma primeira reunião em Cochabamba com toda a bancada de candidatos eleitos do MAS (Movimento ao Socialismo ) para começarmos a aperfeiçoar os projetos de lei e a organizar a agenda do primeiro ano de legislatura”, disse o deputado eleito por La Paz, Héctor Arce. O mandato dos deputados tem início oficial apenas em 22 de junho.
As novas leis irão regulamentar o funcionamento dos três poderes e diversas instituições como Órgão Eleitoral, forças armadas e polícia. Além disso, haverá um novo código do sistema educativo e do comércio.
Uma nova lei de hidrocarbonetos também está sendo preparada para regulamentar empresas privadas, como a Petrobras, tornando-as prestadoras de serviço e não mais concessionárias. O Ministério de Hidrocarbonetos reuniu há um mês algumas empresas do setor para discutir a nova lei, que pode incluir também benefícios fiscais.
Morales afirmou ainda nesta segunda-feira que as outras prioridades do governo serão a luta contra a pobreza e o desemprego. E deixou claro mais uma vez que já está em campanha para eleger o maior número de prefeitos e governadores nas eleições do próximo ano. O MAS pretende obter a maioria das administrações regionais dominadas pela enfraquecida oposição.
“Estou falando com os movimentos sociais para decidir como fazer campanha nas cidades. Porque no campo o MAS é o primeiro partido a ganhar tantas prefeituras, ali o que vale é a reputação do candidato. Na cidade é diferente, precisamos trabalhar nisso”, disse em entrevista coletiva nesta terça-feira.
(Atualizada para correção de informação sobre o limite para propriedades rurais)
NULL
NULL
NULL