O vice-primeiro-ministro da Itália, Matteo Salvini, afirmou nesta semana que a “Europa está mudando”. O líder do partido populista de direita Liga saudou os resultados das eleições para o Parlamento Europeu, referindo-se ao desempenho das legendas lideradas pela francesa Marine Le Pen e pelo britânico Nigel Farage, bem como os votos recebidos pelo seu próprio partido.
Mas um olhar mais atento sobre os resultados da extrema direita – partidos caracterizados por políticas autoritárias, xenófobas e nacionalistas extremas – sugere que as mudanças foram mais sutis do que a retórica populista possa sugerir.
Em países que registraram uma votação pró-ultradireita muito baixa em 2014, os extremistas ganharam terreno neste ano. Em alguns locais, o pleito colocou esses partidos pela primeira vez em pé de igualdade com as principais forças de oposição.
Mas onde a extrema direita já tinha criado raízes, como na França e na Áustria, houve poucos sinais de um grande aumento para além dos níveis de apoio anteriores.
O partido francês Reunião Nacional (ex-Frente Nacional), de Le Pen, ficou em primeiro lugar na eleição europeia, com pouco menos de 24% dos votos. Mas isso foi, na verdade, um ligeiro decréscimo em comparação com seu resultado de 2014.
Nas eleições para o Parlamento francês, em 2017, recebeu cerca de metade desse apoio – 13%, sugerindo que o partido populista de direita possa ser atraente como voto de protesto, mas não quando se trata de escolher quem vai comandar o país.
Liz Fekete, diretora do instituto de estudos sobre racismo IRR, afirma que Le Pen se beneficiou do fracasso do presidente francês, Emannuel Macron, em cumprir sua promessa de ser uma alternativa ao establishment político.
Mas ela adverte contra a supervalorização do forte desempenho da Reunião Nacional nas eleições para o Parlamento Europeu. “Seus resultados podem estar sendo superestimados, porque as eleições europeias tendem a ter resultados bastante estranhos”, afirma Fekete.
No Reino Unido, o recém-formado Partido do Brexit, de Nigel Farage, também foi o primeiro colocado nas eleições para o Parlamento Europeu. Mas tendo poucas propostas políticas além da oposição à adesão do país à União Europeia, o sucesso do partido “de uma proposta só” não sugere um apoio generalizado a uma plataforma populista de direita mais ampla.
O próprio partido de Salvini saltou dos 6% que recebeu nas eleições europeias de 2014 para quase 34%. Porém, numa eleição nacional realizada no ano passado, a porcentagem de votos foi muito inferior: 17%. Isso foi suficiente para fazer dele o segundo maior partido no Parlamento do país, mas mostra os limites de sua base de apoio.
“Salvini é um poderoso orador e, ainda, manipulador da mídia e de imagens midiáticas”, diz Liz Fekete. “Ele conseguiu estabelecer uma hegemonia para suas ideias.”
Mas a especialista é cética em relação ao aumento de apoio, apontando para uma resistência crescente em resposta à fervorosa postura anti-imigração da Liga e seus movimentos para acabar com a dissidência.
“As figuras-chave estão emergindo como pessoas não corruptas e decentes, preparadas para assumir o sistema, e outras estão se mobilizando em torno delas”, afirma Fekete, que mencionou o exemplo de Domenico Lucano, ex-prefeito de Riace, que atraiu a atenção de todo o mundo quando recebeu refugiados em sua vila, em 2011.
Lucano enfrenta agora acusações criminais por ter colaborado com a imigração ilegal, e seu caso se tornou uma causa célebre para aqueles que se opõem à política de extrema direita de Salvini.
O país onde mais cresceu o apoio a um partido de extrema direita foi a Eslováquia: quase 120 mil eleitores (12%) votaram na sigla neonazista Nossa Eslováquia, ante os 9 mil votos nas eleições de 2014. Isso colocou a legenda em terceiro lugar, não muito atrás dos social-democratas, e rendeu a ela dois assentos no Parlamento Europeu.
A plataforma do partido, liderado por Marian Kotleba, inclui retórica contra a comunidade minoritária roma na Eslováquia, e entre seus principais membros estão pessoas associadas ao antissemitismo, nazismo e negação do Holocausto.
Um tribunal na Eslováquia se recusou a banir o partido no início do mês. Seu avanço nas eleições europeias vem após ter recebido 8% de apoio nas eleições nacionais de 2016, elevando a perspectiva de que poderia estar em uma trajetória ascendente.
Na Bélgica, o partido Vlaams Belang avançou depois de organizar a oposição ao pacto de migração da ONU, que, segundo a legenda, aumentaria a imigração.
Alemanha, Suécia e Espanha também viram aumentar os votos da extrema direita. Fekete disse que em alguns países eles foram impulsionados pelo menor comparecimento dos eleitores às urnas nas eleições europeias do que nas eleições nacionais.
Na Hungria, a votação no partido nacionalista Jobbik diminuiu, mas o partido governista Fidesz, que adotou uma posição de extrema direita sob o primeiro-ministro Viktor Orbán, recebeu 52% dos votos.
Na Grécia e na Dinamarca, os partidos de extrema direita perderam apoio em relação a 2014. Na Holanda, a legenda de extrema direita de Geert Wilders perdeu seus quatro assentos no Parlamento Europeu.
A porcentagem de votos no partido Aurora Dourada, na Grécia, caiu de 9% para pouco menos de 5%.
O Partido Popular, da Dinamarca, que recebeu 27% dos votos em 2014, obteve 11% nas eleições europeias deste ano. Esse colapso no apoio poderá ser confirmado nas eleições para o Parlamento do país na próxima semana, quando a legenda poderá perder sua posição de segundo maior partido.
Liz Fekete afirma que a extrema direita se fragmentou na Dinamarca e na Holanda, colocando em dúvida a ideia de Salvini de uma grande coalizão de partidos populistas de direita, que atraiu ampla cobertura da mídia.
Ela também observou que, no Reino Unido, o antigo partido de Nigel Farage, o Partido da Independência do Reino Unido (Ukip), foi demolido pelos eleitores depois de ter se virado à direita.
A DW analisou os resultados oficiais juntamente com dados do ParlGov, compilados por pesquisadores da Universidade de Bremen, para identificar os partidos de extrema direita que ganharam assentos nas eleições para o Parlamento Europeu realizadas na semana passada. Os pesquisadores categorizam os partidos em uma das oito classificações de acordo com suas posições econômicas e sociais.
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O político holandês Geert Wilders (e) e a francesa Marine Le Pen fazem selfie durante encontro na Alemanha em 2017.