Dois bancos dos Estados Unidos não abriram suas portas nesta segunda-feira (13/03). O Silicon Valley Bank (SVB), da Califórnia, e o Signature Bank, de Nova Iorque, foram fechados por autoridades norte-americanas após elas constatarem que as instituições não tinham recursos para garantir os depósitos feitos por seus correntistas. Os bancos estavam quebrados.
O fato despertou um alerta no mercado financeiro global. Investidores passaram a temer um efeito sistêmico similar àquele que deu origem à crise de 2008, iniciada com a falência do Lehman Brothers, também dos EUA.
Segundo economistas ouvidos pelo Brasil de Fato, não há indícios de que algo parecido possa ocorrer agora, até porque o governo norte-americano agiu rápido para conter a crise. É possível, inclusive, que as quebras nos EUA tenham efeitos positivos sobre a economia brasileira, acelerando um ciclo de redução da taxa básica de juros, a Selic.
Hoje, a Selic está em 13,75% ao ano – a maior taxa de juros real do mundo. Ela chegou a tal patamar pois o Banco Central brasileiro resolveu elevá-la para tentar conter a inflação, que subiu por conta dos efeitos da pandemia sobre a economia, entre outras coisas.
Também por conta da pandemia, a inflação subiu em outros países do mundo, como os EUA. Lá, o Banco Central local, o Federal Reserve (conhecido como Fed), também aumentou os juros. E essa elevação foi uma das causas da falência do SVB, até então o 16º maior banco norte-americano.
Investimento frustrado
O SVB havia investido em títulos do governo norte-americano antes da elevação dos juros. Esses títulos eram pré-fixados e tinham juros compatíveis com a realidade antes da pandemia e do surto inflacionário.
Quando o Fed elevou os juros, aqueles títulos comprados pelo SVB perderam valor, pois previam remuneração abaixo daquela que passou a ser praticada. O banco começou a perder dinheiro, seus correntistas passaram a temer pelos recursos que tinham depositado lá e, por fim, ele acabou quebrando.
“Houve uma procura maciça de retirada de recursos e as ações do banco se valorizaram. As pessoas ficaram preocupadas, começaram a retirar recursos do banco. Essa corrida de retirar depósito fez com que o banco perdesse parte do patrimônio e não tivesse mais a garantia de que teria recursos para salvar o dinheiro de correntistas”, explicou economista Miguel de Oliveira, diretor-executivo da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac).
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Fato despertou um alerta no mercado financeiro global
Para André Roncaglia, economista e professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), as falências vão forçar o Fed a repensar sua política de juros. Antes da quebra dos bancos, agentes do mercado financeiro previam novas elevações da taxa básica norte-americana. Agora, apostam que ele deva se manter estável – entre 4% e 4,75% ao ano.
Se os juros nos EUA não sobem, disse Roncaglia, cria-se uma espaço para que a taxa de juros no Brasil não suba ou até caia. Na semana que vem, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central brasileiro vai se reunir para discutir a Selic. Levando em conta o baixo crescimento no Brasil e novo o cenário nos EUA, cresce a chance de corte.
“Ter um Banco Central norte-americano subindo menos os juros implica para o Brasil um espaço maior para que o Banco Central brasileiro possa iniciar ou acelerar o processo de corte de juros por aqui”, resumiu Roncaglia.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), afirmou nesta segunda-feira, ao comentar sobre eventuais consequências da quebra dos bancos norte-americanos sobre o país, que o Brasil tem espaço para reduzir juros para estimular sua economia.
Efeito sistêmico
Roncaglia ressaltou que seu prognóstico sobre a Selic pode mudar se a crise nos EUA tornar-se sistêmica. Disse também que não se pode ver como essencialmente positiva a quebra de um banco importante na maior e mais influente economia do mundo.
Ainda assim, Roncaglia afirmou que a queda de juros no Brasil poderia trazer benefícios em série para o país. Com a Selic mais baixa, a economia tende a crescer mais, estimulando investimentos, gerando mais empregos e mais renda.
O economista lembrou também que, mesmo que o Copom reduza a Selic nos próximos meses, ela ainda estará muito acima da média mundial. Assim, permanecerá atrativo para o investidor estrangeiro aplicar seus recursos no Brasil. Com a chegada desses recursos, a cotação do dólar tende a cair – e a inflação também tende a baixar.
“A gente pode ter a taxa de câmbio ajudando bastante a desinflacionar a economia”, afirmou. “O câmbio está bastante elevado. A redução do câmbio pode ajudar a diminuir os preços dos produtos importados aqui dentro, dando suporte a uma queda de juros ainda maior.”
Oliveira, da Anefac, acrescentou que empresas brasileiras já se manifestaram informando que não estão expostas a problemas ligados ao SVB, o qual tradicionalmente detinha recursos de startups. Isso, disse ele, também minimiza eventuais problemas que a quebra da instituição poderia causar no país.
Ainda segundo Oliveira, o sistema bancário brasileiro é extremamente concentrado e conservador. Ele não crê que bancos nacionais sejam prejudicados pelas falências
Procurado, o Banco Central não comentou a quebra do SVB e do Signature. A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) não respondeu aos questionamentos do Brasil de Fato.