Quarta-feira, 11 de junho de 2025
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No começo, parecia uma piada. Assim que aconteceram os atentados contra a revista satírica Charlie Hebdo no começo de janeiro (07/01) e no supermercado judeu (09/01), fazendo 17 vítimas em Paris, a emissora televisiva Fox News passou a dedicar horas de sua programação diária para explicar aos norte-americanos como a Europa está tomada por muçulmanos. Na ótica da emissora, estes seriam os responsáveis por provocar distúrbios e caos, além de planejar instalar a lei islâmica em grandes porções do território europeu.

Maior canal de notícias dos EUA — ultrapassou a CNN —, a Fox News relatou ao telespectador que a França, e, mais especificamente, a capital Paris, estava cheia de “no-go zones” (áreas proibidas). Nestas “terras de ninguém”, não seria permitida a presença tanto da polícia quanto de cidadãos não-muçulmanos. Entrevistado pela emissora norte-americana, o também jornalista Nolan Peterson confirmou a existência das regiões, qualificando-as de “lugares que dão medo”.

“Eu fui para o Afeganistão, o Iraque, a região Caxemira na India, e era igual”, continuou o ex-correspondente de guerra, acrescentando que, nestas zonas da capital francesa, os jovens andavam com camisetas estampadas com a figura de Osama bin Laden.

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Em inglês, assista trecho do programa noticioso da Fox News sobre as 'no-go zones' em Paris:

Na cobertura de 'Charlie Hebdo', tevê dos EUA teve que se retratar por ter dito que as 'no-go zones', em pleno centro parisiense, levariam a Europa ao fim

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O jornalista exibiu então um “mapa oficial” das 751 “no-go zones”. Em Paris, estão, por exemplo, a Praça Republique, o Boulevard Magenta, o bairro Belleville, e as ruas perto do cemitério Père-Lachaise — todas regiões com grande movimentação de pessoas. A informação foi repetida muitas vezes durante vários dias, provocando risos e raiva na internet. Nos dias seguintes, a Fox continuou: desta vez, pedindo a ajuda de um correspondente local. Das ruas de Paris, o jornalista Greg Palkot explicou que nestas zonas, a criminalidade era muito alta, e que a lei em vigor já não era a do resto do país, mas sim a sharia, a lei islâmica. A Fox News explicou ainda que, na Grã-Bretanha, existem cidades inteiras “proibidas”, como Birmingham, onde 100% da população seria muçulmana. No final, todos os programas jornalísticos da emissora eram encerrados com a seguinte conclusão : “A Europa acabou”.

Também em inglês, âncora da 'Fox News' pede desculpas pela divulgação das informações sobre as 'no-go zones' em Paris:

A resposta francesa

Na França, um programa de informação com toque humorístico, “Le Petit Journal”, produzido por Canal +, lançou uma campanha para exigir desculpas da emissora norte-americano. Sem resposta dos responsáveis da Fox, “Le Petit Journal” pediu, durante dias seguidos, que o público enviasse emails aos diretores da emissora exigindo desculpas. O jornalista Yann Barthès forneceu o email de vários deles, com um texto padrão em inglês. “Deste jeito, quem sabe não conseguimos entupir as caixas de emails até transformá-las em 'no-go zones' “, ironizou.

Tuíte do programa televisivo francês 'Le Petit Journal', exigindo que a emissora dos EUA se desculpe publicamente por ter divulgado informações incorretas:

Resultado: A Fox News acabou emitindo um pedido de desculpas — fato muito incomum na gestão da empresa —  por ter permitido que suas âncoras e convidados repetissem falsas alegações sobre as “no-go zones”. A declaração foi referida como uma “correção” pela jornalista Julie Banderas. “Ao longo desta última semana, fizemos alguns erros lamentáveis em relação à população muçulmana na Europa, especialmente em relação a Inglaterra e França. Para ser claro, não existe uma designação formal dessas zonas em qualquer país e nenhuma informação crível para apoiar a afirmação de que existem áreas específicas desses países que excluem os indivíduos com base unicamente em sua religião”.

Também sobre as 'no-go zones', assista a outro trecho da programação, em inglês, da emissora 'Fox News':

Em francês, é possível ver os diversos programas dedicados (em parte) à guerra contra a Fox News. Em ordem cronológica, é possível acessá-los aqui, aqui, aqui e aqui.