“Tomei conta da princesa Diana e dos meninos, era muito trabalho. Mas o que vem por aí promete ser muito maior.” Ken Wharfe não é só um consultor que trabalhou com a família real britânica por quase uma década. Ele é o homem que o príncipe William chama de “Tio Ken”. E até ele, um alucinado pelas bobagens do Palácio de Buckingham (também por fazer parte da indústria), disse a mim e outros jornalistas em uma conversa recente que a histeria tinha passado da conta. “É demais para mim. Antes era mais romântico e menos vulgar.” Pobre Tio Ken.
“Naqueles tempos só a mídia tradicional conseguia informações de nós. Hoje qualquer um pode gerar conteúdo sobre o assunto. Especialmente porque não há muito conteúdo para gerar”, disse o autor de “Diana: Closely Guarded Secret” (Segredo Protegido de Perto, em livre tradução para a obra, não traduzida para o português). As últimas duas semanas foram tão histéricas em Londres que quando não houve conteúdo para gerar, alguma crendice ganhava corpo.
Agência Efe (23/07)
Multidão se aglomera em frente ao Palácio de Buckingham, em Londres, no dia do nascimento de George Alexander Louis
Deixemos de lado a alucinação coletiva nas mídias sociais que gerou um pico de 25 mil tuítes por minuto. Segue uma lista das manchetes mais bizarras das últimas semanas. “O bebê será um leonino agressivo ou um canceriano sensível?” (Daily Mail); “Conheça o incrível homem que vai dar à luz ao bebê real” (Hello); “Nada de bebê: veja os cinco principais jogadores que se parecem com recém-nascidos” (The Mirror); “Bebê real é o primeiro a ter página na Wikipédia antes de nascer” (The Daily Beast); “Que tal um saquinho de vômito do bebê real como souvenir?” (CBC).
Nem o vetusto FT (Financial Times) escapou do Febeapá versão britânica.
Para algumas das fontes ouvidas pelo jornalão dos banqueiros britânicos, o nascimento de George Alexander Louis terá impacto “majoritariamente positivo” em uma economia que, com sorte, crescerá 0,9% em 2013 – metade da pior expectativa no Brasil. Outra previsão, da qual o FT desconfiou, aponta incremento de cerca de 300 milhões de dólares em vendas no varejo durante o período crítico para o útero da duquesa Kate Middleton. Segundo o FT, “o novo príncipe é um menino grande e bonito. Mas não devemos pensar nele para a recuperação econômica”.
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Para aqueles que são mais ansiosos, um aplicativo de celular foi desenvolvido, com direito a atualizações minuto a minuto e fotografias sem parar. Não, não foi um produto criado por um tradicionalista britânico ensandecido. A renomada Press Association viu no evento uma grande chance de lucrar – o aplicativo é gratuito, mas a propaganda não. O projeto também inclui a chance para que qualquer plebeu “realeze” a cara de seu pequeno no corpo de George.
“Todo mundo quer achar um ângulo para falar disso”, afirmou a jornalista canadense Zairah Khurshid, que cobriu o nascimento para uma TV do seu país. “Nas duas semanas que fiquei diante da maternidade eram basicamente as televisões e a mídia de fofoca. Quando veio o anúncio do nascimento todo mundo apareceu, até revistas de tecnologia.” George nasceu em 22 de julho.
Agência Efe (23/07)
Britânicos tiram fotos do pequeno George em frente ao hospital St. Mary, em Londres
O desespero por uma forma de tratar do assunto chegou ao nada real Brasil. A colunista social Hildegard Angel propagandeou “Bomba! Bomba! Príncipe George Alexander Louis de Cambridge tem antepassados baianos!” Segundo suas fontes, “antepassados de Sua Alteza Real… viveram no Brasil na primeira metade do século XIX”.
Diz Hildegard que o recém-nascido é “descendente direto da filha única de Alexander Cunningham, cônsul de Sua Majestade Britânica na Bahia. Charlotte Cunningham casou-se com James Brownell Boothby, um dos mais importantes membros da comunidade britânica em Salvador”. Os dois nunca tiveram filhos no Brasil, mas, como viveram em Salvador nalgum momento, geraram descendentes por causa da Bahia. É claro.
O nada foi tão dominante na cobertura do bebê real que um repórter da BBC não aguentou. Simon McCoy virou meme na internet por causa da sua sinceridade diante da maternidade.
“Teremos muito mais para falar, é claro. Mas nada será notícia, não estou no Palácio de Buckingham. Mas isso não vai nos parar”, disse ele ao vivo. “[Até que Kate e William saiam do hospital] estaremos especulando sobre esse nascimento real. Não há nenhum fato para apresentar no momento”.
Ao jornalismo, uma das maiores vítimas do bebê real, nossa solidariedade.