O famoso artista Paul LeRoy Bustill Robeson, ou simplesmente Paul Robeson, perde em 16 de agosto de 1955 apelação em um tribunal federal para obrigar o Departamento de Estado dos Estados Unidos a conceder-lhe um passaporte. A continuada e cruel perseguição do governo a Robeson ilustraram diversos pontos cruciais do clima vivido no país durante o auge da Guerra Fria.
Robeson, nascido em Princeton, Illinois, era o mais notável artista afro-americano do mundo, célebre por seu trabalho nos teatros da Broadway, em filmes, e por sua extraodinária potência de um belíssimo tom de voz baixo-baritono.
Robeson interpreta “Old Man River” no filme Showboat (O Barco das Ilusões):
Além de ator, Robeson foi atleta – atuou profissionalmente no futebol americano no Milwaukee Badgers, e também no basebol, bola ao cesto e atletismo – , escritor e ativista de direitos políticos e civis. Foi o primeiro ator negro a interpretar Otelo, de Shakespeare, na Broadway e sua vida no palco foi também marcada pela brilhante performance na ópera Porgy and Bess de Ira e George Gershwin.
Astro conceituado em sua época, tanto no teatro, quanto no cinema – ficou célebre a atuação em O Barco das Ilusões (Showboat) de 1936 ao lado de Irene Dunne e Allan Jones – Robeson foi responsável por abrir as portas para outros atores negros, tais como Sidney Poitier e Harry Belafonte.
No auge da fama, Robeson decidiu tornar-se um ativista político contra o fascismo e o racismo. Adepto dos ideais socialistas, foi perseguido pelo macartismo, investigado pelo FBI e o M15 britânico. O arquivo de Paul Robeson no FBI é, até hoje, um dos mais extensos, se não o mais extenso, já produzidos para um membro do meio artístico.
Robeson estava tão desalentado com a segregação e o racismo nos Estados Unidos que deixou o país em 1928 para viver na Europa até a eclosão da Segunda Guerra Mundial em 1939. Durante sua estada no exterior, tornou-se admirador da União Soviética, particularmente em relação à pública e oficial rejeição do racismo e da discriminação.
Robeson discute a peça Otelo, de Shakespeare:
Em 1939, quando retornou da Inglaterra para os EUA, Robeson se tornou a voz da nação norte-americana, quando cantou “Ballad for Americans”, uma cantata patriótica escrita por John Latouche e musicada por Earl Robinson. Esta canção voltaria a ser gravada por outros artistas mais tarde, porém, foi a interpretação de Robeson que ficou marcada na memória do povo americano para sempre.
Durante a Segunda Guerra Mundial, quando os Estados Unidos estavam aliados à União Soviética na Guerra contra a Alemanha hitlerista, os pontos de vista de Robeson eram tolerados e ele fez numerosas apresentações aos combatentes norte-americanos em vários pontos do planeta. Após a guerra, porém, com o desenrolar da Guerra Fria, as declarações públicas de Robeson em apoio à União Soviética começaram a lhe causar problemas.
Passaporte
Em 1950, tentou renovar seu passaporte para poder viajar pelo mundo e cumprir contratos de recitais de canto e atuações em palcos de teatro. O Departamento de Estado insistiu que Robeson assinasse uma declaração juramentada de que não era membro do Partido Comunista e que era cidadão fiel aos Estados Unidos.
Robeson recusou-se resolutamente a produzir tal declaração e imediatamente entrou com uma ação em tribunal federal a fim de obter o pretendido passaporte. Em agosto de 1955, um juiz federal sentenciou que o Departamento de Estado agia dentro dos preceitos legais ao recusar a Robeson o passaporte. Após a sentença, Robeson declarou que era “totalmente absurdo” que “não me seja permitido viajar devido a minha amizade – aberta e proclamada – ao povo soviético e aos povos de todo o mundo.”
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Robeson era visto como uma pessoa perigosa porque intercalava nas apresentações comentários acerca das relações inter-raciais nos Estados Unidos. Antes e depois das performances costumava dar entrevistas condenando a segregação e a discriminação racial no país. Para alguns formadores de opinião norte-americanos que viam o baixo estágio das relações raciais como o ‘calcanhar de Aquiles’ da nação em termos de propaganda de guerra com a União Soviética, as manifestações de um renomado artista afro-americano denunciando a segregação e alimentando a campanha soviética era absolutamente inaceitável.
Impedido de cantar nos EUA e impossibilitado de viajar para o estrangeiro, após ter seu passaporte revogado, Robeson teve de esperar quase uma década para poder cantar de novo.
Em 1958, Robeson finalmente conseguiu ganhar sua causa judicial e o passaporte lhe foi de má vontade concedido. O prejuízo à carreira de Robeson no entanto já havia ocorrido. O retorno de Robeson, em 1958, deu-se em um concerto no Carnegie Hall. Daí por diante deu continuidade à carreira musical até sua última grande performance em público, em 1965, quando apesar da saúde já debilitada, cantou com maestria We Are Climbing Jacob's Ladder, durante um show feito em sua homenagem.
O FBI jamais deixou de acompanhar estreitamente os passos de Robeson até sua morte em 1976.
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