A ex-presidente autoproclamada da Bolívia Jeanine Áñez foi condenada nesta sexta-feira (10/06) a 10 anos de prisão por violação de deveres e resoluções contrárias à Constituição quando assumiu o poder em 2019, em meio a uma crise social e política no país gerada com a renúncia de Evo Morales.
Depois de deliberar por mais de oito horas, o Tribunal de Primeira Instância de La Paz determinou que Áñez cumpra sua pena na prisão de Miraflores, onde está detida preventivamente há mais de um ano.
O tribunal também anunciou uma sentença de 10 anos de prisão contra o ex-comandante das Forças Armadas, Williams Kaliman, e o ex-comandante da polícia, Yuri Calderón, cujo paradeiro é desconhecido.
Áñez assumiu o comando interino do país como segunda vice-presidente do Senado em 12 de novembro de 2019, dois dias após a renúncia de Morales e de todos os funcionários na linha de sucessão presidencial, durante uma crise política e social que eclodiu após as eleições de outubro daquele ano, marcadas pelas denúncias de fraudes em favor do então presidente.
Depoimentos na prisão
Na manhã de sexta-feira, os juízes do tribunal foram ao presídio para recolher o último depoimento de Áñez e depois fizeram o mesmo na prisão onde estão dois ex-chefes militares acusados de ajudar a ex-presidente interina a chegar ao poder.
Com estas diligências, o tribunal encerrou a fase de debate do julgamento e, no início da tarde, os juízes anunciaram que iriam “deliberar ininterruptamente” até que fosse emitida “a resolução correspondente”.
A denúncia de “golpe de Estado” que levou à prisão de Áñez foi apresentada em novembro do ano passado pela ex-parlamentar Lidia Patty, do Movimento ao Socialismo (MAS), partido de Morales e do atual presidente da Bolívia, Luis Arce, que tomou posse em novembro de 2020.
Julgamento à distância
Áñez acompanhou o julgamento virtualmente da prisão. Segundo as autoridades, a medida foi necessária devido à pandemia de covid-19, embora depois tenham argumentado que havia “risco de fuga”, apesar dos pedidos insistentes de sua defesa para que ela pudesse comparecer pessoalmente às audiências.
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Áñez está presa preventivamente desde março de 2021
“Não foi um governo fácil porque eu tinha o governo, mas nunca tive poder, tive bloqueios na Assembleia Legislativa, portanto foi simplesmente um governo de transição”, disse Áñez em seu depoimento.
Áñez afirmou que não tinha a “ambição” de assumir a Presidência e que apenas cumpriu o seu dever e que, na sua opinião, o “único ambicioso” foi Morales, “que não respeitou a Constituição” desde 2016, quando ignorou os resultados de um referendo que lhe negou a aspiração a um quarto mandato consecutivo.
Ao longo das audiências, a ex-presidente autoproclamada apresentou diversos problemas de saúde, que segundo a parte acusadora foram manobras para adiar o julgamento.
Áñez foi presa em 13 de março de 2021 em uma operação liderada pelo comandante geral da polícia boliviana, Jhonny Aguilera, em sua cidade natal, Beni.
Em princípio, a Justiça abriu um processo pelos crimes de sedição, terrorismo e conspiração devido à crise pós-eleitoral de 2019, que acabou levando à renúncia de Morales. Desse caso derivou o processo “Golpe de Estado II”, pelo qual a ex-presidente interina foi condenada agora.
O que ocorreu em 2019
Morales havia sido reeleito em 20 de outubro de 2019 para um quarto mandato seguido, sob suspeitas de fraude eleitoral. A Organização dos Estados Americanos (OEA) recomendou a convocação de novas eleições por conta de adulteração de atas e falsificação de assinaturas, assim como os Estados Unidos e a União Europeia. Um estudo independente apresentado em junho de 2020, porém, apontou falhas da análise estatística feita pela OEA sobre a eleição boliviana.
Após a renúncia, Morales exilou-se no México e depois na Argentina, e regressou ao país em novembro de 2020, após a vitória de Arce.
Quando Morales renunciou, Áñez era então a segunda vice-presidente do Senado e assumiu a presidência do país em meio ao vácuo de poder. Ela permaneceu no cargo até a realização de novas eleições.