A morte de Henry Kissinger, ocorrida nesta quarta-feira (29/11), teve a ampla repercussão que se esperava nos diferentes países do mundo, exceto no Chile, onde os principais diários da imprensa local publicaram textos marcados pelo pouco destaque à influência do diplomata norte-americano justamente nesse país, como um dos principais apoiadores estrangeiros do golpe de Estado de 1973, contra o presidente socialista Salvador Allende.
O caso mais curioso é o do jornal El Mercurio, o de maior circulação em Santiago, que dedicou apenas metade de uma linha, no quarto parágrafo do seu obituário, para tratar do tema, e sequer mencionou os nomes de Allende e do ditador que o substituiu, Augusto Pinochet.
“(Kissinger) desempenhou um papel importante nas intervenções que os Estados Unidos realizaram em diversos países latino-americanos através dos seus serviços de inteligência durante os Anos 70, favorecendo o estabelecimento de regimes autoritários, como foi o caso do Chile, com o golpe militar, ou o chamado ‘Processo de Reorganização Nacional’ da Argentina”, escreveu o periódico chileno.
Vale acrescentar que o próprio El Mercurio tem uma história de envolvimento com o golpe de 1973, já que seu dono na ocasião, o já falecido empresário Agustín Edwards viajou aos Estados Unidos após a posse de Allende como presidente e chegou a ser recebido na Casa Branca pelo então presidente Richard Nixon (1969-1974) e pelo próprio Kissinger.
Biblioteca Nacional do Chile
Kissinger foi um dos maiores apoiadores estrangeiros do golpe de Estado que iniciou a ditadura de Augusto Pinochet no Chile
Documentos desclassificados pela Agência Central de Inteligência norte-americana (CIA) revelaram anos depois que o chileno pediu apoio financeiro para os movimentos que buscavam forçar a derrubada do governo de Allende, e que foi atendido.
Outro jornal de grande circulação no Chile, o La Tercera, deu um pouco mais espaço ao tema: apesar de sua matéria principal também dedicar poucas linhas ao envolvimento de Kissinger com o golpe, também foi publicada uma segunda matéria específica só sobre o apoio do diplomata aos grupos antiallendistas.
Porém, essa segunda matéria teve pouquíssimo destaque dentro da página web diário, que preferiu enfatizar um artigo sobre “o que Anthony Bourdain pensava de Henry Kissinger”, no qual conta que o falecido chef e escritor novaiorquino tinha fortes críticas aos males que o diplomata provocou, não no Chile, mas sim no Camboja.