A Tribunal de Justiça de Buenos Aires, de primeira instância, autorizou o Ministério Público a iniciar uma investigação contra o pré-candidato presidencial de extrema direita Javier Milei por supostas irregularidades cometidas dentro do partido A Liberdade Avança (LLA, por sua sigla em espanhol), fundado e presidido por ele.
O caso foi revelado por ex-aliados de Milei, que o acusam de cobrar uma taxa de até US$ 50 mil aos interessados em ser candidatos a cargos legislativos pela sua legenda. O responsável pela investigação, segundo a imprensa local, será o procurador federal Ramiro González.
Um dos denunciantes é o empresário têxtil Juan Carlos Blumberg, que renunciou recentemente à sua militância no LLA.
Em entrevista transmitida nesta terça-feira (04/07) por um canal de televisão local, Blumberg afirmou que uma assessora de Milei havia cobrado uma taxa de US$ 50 mil para que ele formasse parte da lista de candidatos do LLA à assembleia legislativa da Provincia de Buenos Aires (região metropolitana da cidade de Buenos Aires, mas que não inclui a capital, que possui status de distrito federal).
Inicialmente, o político de extrema direita (que também é deputado, eleito pelo Distrito Federal de Buenos Aires) admitiu o esquema e ainda justificou seus métodos, dizendo que seu partido financia suas próprias campanhas com esse dinheiro, pois supostamente rechaça recursos do fundo eleitoral (distribuídos entre as principais forças políticas do país), por coerência com suas convicções ideológicas. Essa versão é falsa, segundo o diário Página/12, que mostrou documentos e declarações comprovando que o LLA também utiliza recursos do fundo eleitoral.
Em publicação nas redes sociais, Milei disse que “querem falar de financiamento? Como os demais se financiam? De onde tiram seu dinheiro? Quanto gastam? Não seria bom que vocês jornalistas averiguassem isso? Ou preferem seguir questionando o único que faz as coisas de forma diferente e que usa seu próprio dinheiro? Nós naturalizamos o desvio do dinheiro que pagamos em impostos para as campanhas eleitorais, e questionamos os que se financiam com seu próprio esforço. Os ladrões perseguindo os honestos. Uma Argentina diferente é impossível com os mesmos de sempre”.
Porém, outro ex-aliado acusou o extremista e a situação mudou de figura. A segunda denúncia partiu do influencer Matías Cerdá, que seria candidato a prefeito da cidade de Vicente López, também na Província de Buenos Aires, mas que desistiu da campanha por considerar que a venda de candidaturas por parte de Milei não impunha nenhum tipo de regulação – o que é irônico, já que o discurso do partido é ultraliberal, defendendo parâmetros extremos de liberdade.
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Ex-aliados acusam Milei de vender candidaturas dentro do seu partido e usar dinheiro arrecadado em benefício próprio
“Percebi que o partido começou a incorporar gente pesada nas listas legislativas, me refiro a gente com ficha policial, com histórico de delitos penais, cujos nomes manchariam a chapa e afetariam os demais candidatos”, reclamou Cerdá.
Foi então que a narrativa de Milei mudou, passando a negar que os valores cobrados eram os referidos nas denúncias e adotando a estratégia de acusar seus acusadores: segundo a nova versão, o conflito teria começado a partir de uma suposta exigência de Blumberg, que queria ser candidato a governador da Província de Buenos Aires. “Como nós dissemos que não, ele perdeu a cabeça e passou a espalhar mentiras”, alegou.
Contudo, as críticas à organização liderada pelo deputado ultraliberal não são uma novidade, nem se resumem apenas à venda de candidaturas eleitorais.
Em fevereiro deste ano, Mila Zurbriggen, ex-líder do coletivo Geração Libertária (que funciona uma espécie de “juventude” do LLA) anunciou seu desligamento devido à cobrança de taxas para os que queriam passar ao partido, e também descreveu um “método claramente sexista” para determinar as lideranças dentro da legenda de extrema direita. “Tudo lá dentro era por dinheiro ou por sexo”, acusou a ex-militante.
Na mesma época, o advogado Carlos Maslatón, também dissidente do LLA, já havia criticado seu antigo líder, pelo mesmo motivo.
O jornal argentino Página/12 resgatou o caso de Maslatón em reportagem recente, na qual o advogado, que também defende um discurso ultraliberal, comentou esta nova polêmica envolvendo Milei.
“O problema não é vender as candidaturas, eu não tenho nenhum problema com isso. O problema é que ele e a irmã (Karina Milei) criaram um modelo de franquia política, com o qual vendem os espaços nas listas eleitorais, e esse dinheiro não vai para o caixa do partido, nem para as campanhas, e sim para os bolsos deles”, frisou Maslatón.
A investigação do Ministério Público a todas essas possíveis irregularidades envolvendo o partido de Milei transcorrerá paralelamente à sua pré-candidatura presidencial.
Em 13 de agosto acontecerão as eleições prévias obrigatórias da Argentina, que deverão oficializar o extremista como candidato presidencial do LLA, iniciando sua campanha para o primeiro turno, programado para o dia 22 de outubro.
Com informações do Página/12.