Estava marcada para às 9h30 da manhã desta segunda-feira (23/10), na Terceira Corte de Assis do Tribunal de Roma, a retomada do processo que julga o ex-militar uruguaio Jorge Nestor Troccoli, por crimes cometidos nos anos 1970/1980, no âmbito da operação Condor – uma rede de colaboração entre as ditaduras do cone sul para aniquilar opositores políticos aos regimes.
Ex-oficial do serviço secreto da marinha uruguaia (Fusna), ele responde pela morte e desaparecimento do casal ítalo-argentino Rafaela Filipazzi e José Agustín Potenza e pelo desaparecimento da professora uruguaia Elena Quinteros, militante do Partido da Vitória do Povo (PVP).
Deveriam depor Aléx Lebel, Rosa Barreix e Cristina Finn, mas tanto a audiência desta segunda quanto a que estava programada para novembro foram adiadas para fevereiro de 2024. Segundo a presidente da Corte, a juíza Antonella Capri, as testemunhas não haviam confirmado presença com o Ministério Público italiano e o governo da Argentina ainda não havia respondido a carta rogatória da Itália, enviada em 4 de setembro, na qual se intimava testemunhas a depor.
Segundo Hermínio Amélio Carmelio, procurador responsável pelo caso, “a praxe das rogatórias já é longa porque passa através de canais diplomáticos, e ainda é preciso lembrar que a Argentina está em plena eleição presidencial”.
Com ou sem eleição, o fato é que esta não é a primeira vez que o governo argentino não responde ao pedido italiano de colaboração para que as testemunhas de processos italianos possam depor por videoconferência.
Outro caso, que julgava a participação de ex-agentes da ditadura brasileira, foi adiado por quase um ano devido a “problemas” com as rogatórias enviadas à Argentina. Conclusão: Átila Rohrsetzer, o único brasileiro ainda vivo entre os quatro denunciados, morreu três meses antes da justiça italiana proferir a sentença, em outubro de 2021.
Troccoli está com 81 anos e tem alguns problemas de saúde.
O depoimento mais esperado do dia era o do capitão uruguaio Álex Lebel. Em 17 de novembro de 2000, ele afirmou ao tribunal de honra do Uruguai que a professora Elena Quinteros estava presa no Fusna antes de seu desaparecimento, confirmando a participação de Troccoli no caso.
Janaina Cesar
Julgamento do repressor uruguaio Néstor Troccoli será retomado somente em 2024
Este é o segundo processo contra o ex-coronel na justiça italiana. Troccoli está preso desde julho de 2021, na penitenciária Gian Battista Novelli, em Carinola, na província de Caserta.
Ele e outros torturadores de ditaduras do Cone Sul foram condenados à prisão perpétua por terem participado de assassinatos de cidadãos italianos durante os Anos 70 e 80, sob a batuta da Operação Condor.
As vítimas
Elena Quinteros foi sequestrada em Montevidéu em 24 de junho de 1976 e levada para um centro de detenção clandestino. Em 28 de junho, ela fingiu que entregaria um companheiro numa zona próxima à embaixada da Venezuela. Quinteros conseguiu escapar e entrar nos jardins da sede diplomática, onde pediu asilo, mas oficiais uruguaios entraram na embaixada e a prenderam.
O fato gerou uma ruptura das relações diplomáticas entre os dois países. Quinteros era militante do Partido Vitória do Povo (PVP) e foi levada para o centro de tortura chamado “300 Carlos – o Inferno Grande”. Depois disso, nunca mais foi encontrada. Em uma ficha dos arquivos do Fusna está registrado o seu nome e a informação de que ela teria morrido entre os dias 2 e 3 de novembro de 1976.
O casal Filipazzi e Potenza foram sequestrados em Montevidéu em 27 de maio de 1977, no Hotel Hermitage, e entregue à unidade S2 dos Fuzileiros Navais (Fusna). Tempos depois, foram transportados de avião para Assunção, capital do Paraguai, onde foram recebidos por agentes da ditadura de Alfredo Stroessner.
Segundo as investigações, eles foram assassinados no Paraguai, onde seus restos mortais foram encontrados, em março de 2013.
Opera Mundi é o único veículo da imprensa brasileira, que desde 2015, acompanha os julgamentos na Itália dos crimes cometidos por torturadores do Cone Sul no âmbito da Operação Condor.