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Não era para ser um livro polêmico, mas acabou gerando rebuliço no Chile durante o lançamento. 1962, El Mito del Mundial Chileno, escrito pelo jornalista Daniel Matamala, mexeu com um ícone do orgulho nacional chileno: a Copa do Mundo de 1962.
[Cartaz ilustrativo com os times participantes]
O maior evento esportivo organizado pelo país em sua história foi, segundo números levantados pelo autor, o pior de todos os Mundiais da Fifa.
A teoria de Matamala se baseia no levantamento de números e relatos oficiais de todas as copas até a da Alemanha em 2006, comparando estatísticas sobre aspectos organizacionais (quantidade de cidades-sede, quantidade de público, maior e menor público) e também esportivos (média de gols, expulsões, rendimento dos goleadores e dos principais jogadores), além de considerar relatos da época sobre a qualidade técnica das partidas e o envolvimento de cada país sede com o evento.
Por exemplo, a Copa de 1962 foi a segunda com menor número de cidades-sede: quatro (Arica, Rancagua, Viña del Mar e Santiago), sendo que apenas uma tinha um estádio com capacidade para mais de 20 mil pessoas (Santiago, com 77 mil lugares no Estádio Nacional). Nesse caso, o evento ficou atrás apenas da Copa de 1930, quando o Uruguai organizou todos os jogos em Montevidéu.
Porém, os chilenos tiveram uma boa justificativa: no ano anterior, o pior terremoto da história do país — de 9,5º na escala Richter — abalou a cidade de Valdivia. A catástrofe foi tamanha que prejudicou a infraestrutura de todas as principais cidades do sul do Chile.
Também lá foi o primeiro Mundial da história cuja média de gols foi de menos de três gols por partida: 2,78. Por outro lado, foi a Copa com maior quantidade de jogadores empatados no primeiro lugar da artilharia. Foram seis: o chileno Leonel Sánchez, o iugoslavo Dražan Jerković, o húngaro Flórián Albert, o soviético Valentin Ivanov e os brasileiros Vavá e Garrincha. Isso porque todos eles alcançaram a menor quantidade de gols marcados por um artilheiro na história do evento: quatro gols para cada um.
Antes que os detalhes dos números viessem à tona, o livro sofreu uma onda de críticas de pessoas ligadas ao universo futebolístico chileno — tanto pelo título, quanto pela proposta. Matamala defendeu a pesquisa, garantindo que não pretendia desqualificar o Chile nem a Copa de 1962. Segundo ele, o livro “não nega a importância do evento para a nação” e que os chilenos podem se “orgulhar de terem feito a melhor Copa possível, com as limitações de um país subdesenvolvido”.
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De fato, quando o livro começou a ser lido — e avaliado — as críticas diminuíram. Tanto que um dos eventos de apresentação contou com a presença de Pablo Dittborn, filho do presidente do comitê organizador da Copa de 1962, Carlos Dittborn.
O mito do tapetão pró Garrincha
O livro de Matamala também confirma uma das lendas que envolvem a Copa do Mundo de 1962, e que diz respeito ao craque daquele torneio: o brasileiro Garrincha. Isso porque o jogador – que comandou o time desde a primeira fase, depois da lesão de Pelé –, foi expulso na semifinal (4×2 contra o anfitrião Chile), nos últimos minutos, depois de ser o destaque daquela partida.
Victor Farinelli/Opera Mundi
Matala: livro “não nega a importância do evento” e que os chilenos podem se “orgulhar de terem feito a melhor Copa possível”
Apesar da expulsão, Garrincha pode jogar a final contra a Tchecoslováquia. Isso porque o árbitro da semifinal, o peruano Arturo Yamasaki, e o bandeirinha uruguaio Esteban Marino, não apareceram no dia seguinte ao Tribunal de Disciplina da Fifa, para formalizar a súmula, e assim não foi decretada a situação irregular do atacante brasileiro.
A suspeita sobre o sumiço dos árbitros é maior pelos relatos de um livro do jornalista Ernesto Rodrigues, onde se conta a intervenção da delegação brasileira para negociar o desaparecimento. A versão de Rodrigues, replicada por Matamala, diz que Yamasaki foi visto em Copacabana no dia em que o Brasil jogava a final daquela Copa.