Com as potências ocidentais, lideradas pelos Estados Unidos, cada vez mais inclinadas em direção a uma ação militar contra a Síria, centenas de manifestantes foram às ruas de Londres na tarde desta quarta-feira (28/08) para protestar contra o possível ataque ao país árabe. O ato foi idealizado pelo grupo pacifista Stop the War Coalition (Coalizão Pare com a Guerra, em tradução livre). Houve manifestações também em Edimburgo, na Escócia.
Uma pesquisa do instituto YouGov, feita a pedido do jornal The Sun e publicada na última quarta-feira (28), mostrou que 74% dos britânicos se opõem a um ataque militar na Síria. Um dos maiores entusiastas da ação militar contra a Síria, o primeiro-ministro David Cameron, do Partido Conservador, anunciou também nesta quarta-feira, em sua conta no Twitter, que Londres vai apresentar uma resolução ao Conselho de Segurança das Nações Unidas para autorizar “as medidas necessárias para proteger os civis” do país árabe, em mais um movimento diplomático que indica um ataque iminente.
Renato Brandão
Ativistas protestaram em Londres contra possível intervenção na Síria
O grupo convocou um novo protesto para esta quinta (29), em frente ao Palácio de Westminster, durante a reunião dos parlamentares britânicos para discutir os planos de intervenção militar de Cameron. Outra manifestação, de escala nacional, foi anunciada pelo Stop the War Coalition para este sábado (31/08), na Trafalgar Square, também na capital do Reino Unido.
Em Londres, o protesto ocorreu em frente à entrada da Downing Street, onde se localiza a residência oficial do premiê britânico. A rua, que é protegida por portões de aço, foi vigiada por dezenas de policias. Os ativistas se concentraram primeiramente na calçada do lado oposto de Downing Street e depois ocuparam os dois sentidos da Whitehall, via na qual estão alguns dos principais prédios governamentais do Reino Unido.
A maioria da multidão empunhava cartazes antiguerra com mensagens como “Hands off Syria” (“Tire as mãos da Síria”) e “Don't Attack Syria” (“Não ataque a Síria”). Alguns poucos portavam bandeiras sírias. A cerca de 100 metros dali, um pequeno grupo se manifestava a favor da intervenção militar ocidental, de onde se podiam avistar manifestantes segurando a antiga bandeira síria –utilizada pelo Exército Livre da Síria (ELS), um dos grupos insurgentes que luta contra o governo de Damasco. O ELS é reconhecido e apoiado pelo Ocidente e países do Golfo Pérsico (como Arábia Saudita, Qatar e Turquia), mas não compõe a maioria na oposição síria (atualmente dominada por grupos extremistas islâmicos).
“Estamos novamente nas ruas para protestar contra uma guerra. Mas nós damos voz a uma maioria que não se sente representada pelo Parlamento. Nós somos a oposição no Parlamento”, disse o escritor e ativista Tariq Ali, que participou da manifestação. Ele criticou os Estados Unidos e citou que o país jamais foi punido por ter utilizado armas químicas nas guerras contra o Vietnã e o Iraque.
“Quem foi o único país do mundo ter usado armas nucleares em um conflito? Quem é o dono do maior arsenal militar do planeta?”, indagou, sob muitos aplausos. “Precisamos construir um movimento para impedir esta intervenção. Eles (as potências ocidentais) insistem em não articular uma solução política para o conflito na Síria.”
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Alguns parlamentares também discursaram e prometeram que iriam votar contra ataques militares na quinta-feira. “É inacreditável que estamos aqui, pela quarta vez, para pedir um 'não' à guerra. E este governo [de Cameron] está cometendo os mesmos erros do anterior [dos ex-trabalhistas Tony Blair e Gordon Brown]”, expressou Jenny Jones, do Partido Verde. Para Jeremy Corbyn, do Partido Trabalhista, o verdadeiro motivo de um ataque militar patrocinado por Washington, Paris e Londres é derrubar o governo do sírio Bashar al-Assad. “Fico feliz em ver tanta gente aqui nesta tarde, porque estamos aqui para afirmar que queremos uma solução política, não uma guerra”, disse o político, que também é um dos ativistas do Stop the War Coalition.
Armas britânicas na Síria
Em julho, o Comitê de Controle de Exportação de Armas do parlamento britânico divulgou que o governo de David Cameron havia autorizado ou renovado 3 mil licenças de exportação com fins militares para 25 dos 27 países pertencentes a sua própria lista, feita pela Secretaria do Exterior, de nações que violam direitos humanos.
Entre os contratos revelados, havia um acordo no valor de 143 mil libras com o governo de Bashar al-Assad. De acordo a comissão multipartidária, Londres vendeu ao país árabe materiais industriais, como fluoreto de sódio, que poderiam ser usados na fabricação de armas químicas. Também foram fornecidos equipamentos de sonar e veículos todo-o-terreno. Logo após a divulgação do relatório, o próprio David Cameron autorizou o fornecimento de material de proteção contra armas químicas à oposição síria.
Renato Brandão
Manifestantes são contra possível ataque na Síria
Em novembro do ano passado, o premiê conservador havia defendido que o Reino Unido possui “a mais rigorosa política de controle de armas do mundo – e que assim permanecerá” e acrescentado que cada país tinha “o direito de se autodefender, e não se pode esperar que todos os países sejam autossuficientes em prover os tanques, navios e aviões necessários.” Cameron, que costuma fazer viagens internacionais com representantes da indústria bélica do Reino Unido para garantir contratos de defesa para as empresas britânicas, alega que o setor gera bilhões de libras e 300 mil postos de trabalho no país.
A resolução preparada pelo Reino Unido condenará o suposto uso de armamento químico por parte do governo de Bashar al Assad e pedirá que a ONU assuma sua responsabilidade na Síria.
A guerra civil na Síria completou dois anos e já vitimou mais de 100 mil pessoas, além de ter forçado a abandonar o país cerca de 2 milhões de habitantes – entre os quais, 1 milhão de crianças -, que buscaram refúgio em nações vizinhas, como o Iraque, a Jordânia e o Líbano. Há ainda outros três milhões de deslocados internamente pelo interior sírio.