Centenas de argentinos compareceram hoje (1º) ao Parlamento argentino, em Buenos Aires, onde está sendo velado o ex-presidente Raúl Anfonsín (1983-1989), primeiro a ser eleito após a última e mais dura fase da ditadura militar (1976-1983) e que faleceu ontem à noite, vítima de uma pneumonia agravada por um câncer pulmonar que o afligia desde 2007. Ele tinha 82 anos.
Imediatamente depois de anunciada a morte de Alfonsín, o ex-presidente Néstor Kirchner, além de vários líderes e ex-líderes estrangeiros, como o presidente do Senado brasileiro, José Sarney, que ocupou a presidência do Brasil na mesma época que o argentino, entraram em contato com a família.
Enquanto isso, centenas de pessoas, muitas chorando, carregando bandeiras argentinas e da União Cívica Radical, partido de Alfonsín, se concentraram diante da casa do ex-presidente, localizada na avenida Santa Fe, no bairro Recoleta. A multidão acendeu velas, aplaudiu e gritou o nome de Alfonsín, estrofes do Hino Nacional, além de críticas ao governo peronista de Cristina Kirchner.
Ao chegar a Londres para a reunião do G20, a presidente enviou condolências à família do ex-presidente. “A figura de Alfonsín está vinculada à recuperação democrática após uma trágica ditadura militar”, disse.
Cristina recordou que Alfonsín era um homem com “muitas convicções e que muitas vezes diferentes às nossas, mas tinha convicções e isso é digno de respeito: um homem que defendia suas ideias”.
O governo da Argentina decretou três dias de luto nacional pela morte de Alfonsín, que será enterrado amanhã na capital argentina.
Argentinos se reúnem em frente à casa de Alfonsín, em Buenos Aires
Biografia
Alfonsín, nascido em 12 março de 1927, na cidade de Chascomús (província de Buenos Aires), foi o primeiro presidente democrático da Argentina após sete anos de ditadura militar.
Numa era repleta de breves períodos democráticos interrompidos por golpes militares, ele foi um dos fundadores da Assembléia Permanente pelos Direitos Humanos (APDH), pioneira na luta contra o autoritarismo e a repressão ilegal.
Além disso, conseguiu algo que poucos de seus correligionários conseguiram: vencer nas urnas o Partido Justicialista (PJ, peronista), e com quase 52% dos votos, nas eleições que marcaram o fim da ditadura.
Apesar de ter enfrentado obstáculos e pressões para consolidar a democracia na Argentina, Alfonsín conseguiu com que, em 1985, fosse realizado um histórico julgamento, que terminou com duras penas para os hierarcas do regime que seqüestrou, torturou e deixou cerca de 30 mil mortos e desaparecidos em 26 anos.
Em virtude do avanço nas investigações sobre os crimes cometidos nos chamados “anos de chumbo”, o governo de Alfonsín enfrentou rebeliões e levantes militares, que foram sufocados por tropas leais e com a presença popular nas ruas.
Nesse contexto, entre 1986 e 1987, o Executivo impulsionou a aprovação parlamentar das leis de Obediência Devida e Ponto Final, que isentaram de responsabilidade mais de mil de acusados de crimes de lesa-humanidade.
Também conhecidas como “leis do perdão”, foram revogadas no governo Néstor Kirchner (2003-2007).
Foto tirada em 1983 de discurso de Alfonsín na Praça de Maio
O governo de Raúl Alfonsín, no entanto, também ficou marcado por uma profunda crise econômica na Argentina. A grande dívida externa herdada pelos anos de ditadura e políticas econômica malsucedida fizeram com que a Argentina mergulhasse em uma profunda crise.
Treze greves gerais foram registradas no período, ao mesmo tempo em que o presidente tinha dificuldade nas relações com empresários e banqueiros. No último ano do governo Alfonsín, a inflação na Argentina atingiu a marca dos 4.923%.
As eleições de maio de 1989 deram vitória à chapa peronista liderada por Carlos Menem (1989-1999). No mesmo mês, Alfonsín renunciou, antecipando a transferência do poder.
Simpatizantes fazem fila para prestar homenagens a Alfonsín
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