O pior dia na vida de Olaniyi Emiola foi 17 de março de 1998. Pelo menos para Olaniyi Emiola, 22, o comerciante de autopeças. Para Olaniyi Emiola, o assaltante, foi um golpe de sorte, uma vez que outro homem com o mesmo nome havia sido injustamente sentenciado à morte pelo crime que ele cometeu.
Neste dia, enquanto Emiola estava no banco dos réus do agora extinto Tribunal para Roubos com Armas de Fogo na cidade nigeriana de Ibadan, estado de Oyo, no sudoeste do país, ele não conseguia acreditar no que estava acontecendo. “Vários membros da minha família… estavam todos chorando. Eu estava chorando também. A coisa toda parecia um pesadelo para mim”, contou à IPS Emiola, hoje com 35 anos.
O seu calvário começou três anos antes quando a polícia o prendeu por assalto, um crime que na Nigéria acarreta a pena de morte. Isso aconteceu apesar de seu cúmplice ter contado repetidas vezes à polícia que eles haviam prendido o homem errado. “Mas a polícia … disse que o assaltante estava tentando me acobertar”.
Em 2004, depois de passar seis anos no corredor da morte, Emiola ficou cara a cara com o assaltante cuja sentença ele estava cumprindo. O homem, que havia sido sentenciado à morte por outro roubo, aceitou a responsabilidade sobre o crime pelo qual o comerciante de autopeças era acusado. Emiola escreveu uma carta para o procurador-geral e para o governador do estado de Oyo pedindo uma revisão de seu caso, mas não teve resposta.
Não tivesse sido pelo Pastor Hezekiah Olujobi, chefe do Centro para Justiça, Misericórdia e Reconciliação, instalado em Ibadan, que luta pela libertação de prisioneiros inocentes, Emiola provavelmente ainda estaria no corredor da morte, ou provavelmente morto.
O caso de Emiola destaca o estado do sistema de justiça criminal da Nigéria assim como os grupos de direitos humanos dizem que o sistema não pode garantir um julgamento justo em casos de pena capital. “Ao longo dos anos, nós temos visto que o sistema de justiça nigeriano não é confiável”, relatou à IPS Princewill Akpakpan, chefe das reformas penais da Organização das Liberdades Civis, em Lagos, um dos principais grupos de direitos humanos da Nigéria.
Ele afirmou que as razões para isso incluem o fato de que a polícia faz prisões arbitrárias e força as pessoas a assumirem a responsabilidade por crimes que elas não cometeram. Ele acrescentou que a investigação policial em matéria criminal é deficiente. “Apenas quando você corrige essas falhas você pode garantir um sistema de justiça transparente e confiável”, disse Akpakpan.
Levou três anos, mas finalmente Emiola foi solto em janeiro. “Você pode imaginar o que teria acontecido a este homem se nós não tivéssemos intervindo”, disse Olujobi. Ele lembrou que o caso de Emiola é um reflexo de como pessoas inocentes são condenadas à morte na Nigéria. “Na Prisão Federal de Abeokuta (uma das prisões onde Emiola cumpriu pena), nós identificamos outras seis pessoas no corredor da morte que parecem ter sido injustamente condenadas”, observou. “Em um dos casos, um homem que lutou com a esposa de um policial foi preso, acusado por assalto e sentenciado à morte.” Refletindo sobre a sua sentença de morte, Emiola pensa que essa é a pior forma de injustiça.
“O tribunal prescinde de qualquer forma de justiça. Foi uma coisa pré-arranjada, eles simplesmente entraram com um processo de condenação contra mim”, analisou. “Este é um país onde o criminoso segue livre enquanto a pessoa inocente é não apenas considerada culpada como também sentenciada à morte.” Emiola não pode recorrer da condenação porque os Tribunais para Roubo com Armas de Fogo, que se instauraram durante o período militar, não tinham processo de apelação.
Números alarmantes
Vigilante dos direitos globais, a Anistia Internacional apurou que mais de 2.600 sentenças de morte foram conduzidas sob o regime militar entre 1970 e 1999, com os Tribunais para Roubo com Armas de Fogo aprovando a maioria das sentenças de morte.
Embora os tribunais tenham sido abolidos com a volta do governo civil em 1999 e os direitos de apelação restabelecidos, a Anistia Internacional apurou que várias pessoas foram executadas sem terem sido informadas sobre o seu direito de recurso. O grupo de direitos humanos disse que muitos dos 700 prisioneiros atualmente no corredor da morte na Nigéria foram condenados por esses tribunais. “Existe uma forte conexão entre pobreza e essas condenações. Na maioria das vezes os parentes das pessoas acusadas não têm dinheiro para se defender”, contou Olujobi.
Em 2004, o Grupo Nacional de Estudos sobre a Pena de Morte, que foi criado pelo governo nigeriano, admitiu que há falhas no sistema judiciário do país. “Um sistema que tira uma vida deve antes oferecer justiça”, afirmou o grupo em um relatório. Este recomendou a suspensão da pena de morte até que “o sistema de justiça criminal possa garantir imparcialidade e o devido processo em casos de pena capital e minimizar os riscos de que pessoas inocentes venham a ser executadas”. A Nigéria tem observado uma moratória não oficial das execuções desde 1999. Mas a Anistia Internacional ressaltou que as execuções têm sido realizadas no país apesar disso. O grupo de direitos humanos contou que descobriu evidências de ao menos sete execuções entre 2009 e 2010. E temia que mais pudessem ocorrer.
Advogados de direitos humanos como Akpakpan dizem que até que o sistema judiciário seja revisto “haverá sempre uma chance de que pessoas inocentes acabem sendo executadas por crimes que elas não cometeram”.
*Artigo originalmente publicado pela IPS
NULL
NULL
NULL