No dia do orgulho LGBTQIA+, que se comemora nessa quarta-feira (28/06), parte da população mundial está lutando para não perder direitos arduamente adquiridos, em face do crescimento de movimentos conservadores que só aceitam um modelo de família. Outros tantos estão celebrando as conquistas obtidas por meio de suas batalhas e facilitadas por governos que entendem a necessidade de ampliar o acesso a direitos e à igualdade.
O Brasil de Fato levantou alguns pontos de inflexão recentes sobre esse assunto em diversas partes do mundo, que mostram avanços e retrocessos nas esferas jurídica e legislativa.
Taiwan
No mês passado, Taiwan promoveu um considerável avanço ao permitir que casais do mesmo sexo tenham o direito de adotar. O casamento entre pessoas do mesmo sexo já era permitido desde 2019, mas pela lei aprovada naquele ano, a adoção só era permitida se a criança fosse filha biológica de um dos integrantes do casal. Caso contrário, só o pai ou mãe biológico(a) poderia ser tutor(a) legalmente.
Numa postagem no Twitter, o parlamentar Hung Sun-han, do Partido Progressista Democrático, afirmou que a legalização da adoção era a peça que faltava do quebra-cabeça da universalização dos direitos humanos e da igualdade na ilha.
Estônia
A Estônia se tornou na semana passada o primeiro país da Europa Central a legalizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo. A lei foi aprovada graças ao voto de 55 parlamentares (de um total de 101) da coalizão de liberais e social-democratas formada pela primeira-ministra Kaja Kallas, eleita em 2023. “Minha mensagem (para a Europa Central) é de que essa luta é árdua, mas o casamento e o amor são coisas que devemos promover”, afirmou após a votação.
“Sinto como se o Estado estivesse finalmente me aceitando”, disse a lésbica Annely Lepamaa, de 46 anos, que precisou recorrer à justiça para poder adotar seus filhos. “Agora, sou um ser humano com direitos”.
Na Europa Central, formada por países da antiga União Soviética, os direitos civis relacionados ao gênero costumam caminhar mais devagar do que nas porções norte e oeste do continente. Porém, retrocessos recentes na Itália e na Espanha trazem nuances para essa lógica comparativa.
Itália
Na Itália, o governo da ultradireitista Georgia Meloni ordenou que o município de Milão pare de registrar crianças de casais formados por pessoas do mesmo sexo, reacendendo o debate a respeito de sua agenda conservadora em assuntos de família e aumentando o temor de famílias e organizações da comunidade LGBTQIA+ acerca do futuro das minorias e do campo democrático no país.
Casais italianos formados por pessoas do mesmo sexo têm direito à união civil desde 2016, mas não à adoção legal. Além disso, uma lei de 2004 proíbe o acesso à reprodução assistida, como em casos de fertilização in vitro, e à chamada barriga de aluguel, que é ilegal na Itália. Infratores podem ser presos e multados em até 1 milhão de euros (cerca de R$ 5,3 milhões).
Por falta de uma legislação clara sobre o tema, cabe às autoridades locais a decisão de registrar ou não as crianças nascidas dessa forma. Em 2021, um tribunal de Milão deu parecer favorável ao registro de uma criança gerada por meio de barriga de aluguel, argumentando que ela não teria controle sobre as circunstâncias de seu nascimento. A cidade, vanguardista nesse aspecto, vem registrando crianças de pais do mesmo sexo. Agora, o governo de Meloni está considerando tais registros como legalmente ilegítimos e proibiu que fossem emitidas novas certidões.
Neste mês de junho, famílias com núcleos homoafetivos passaram a receber pelo correio uma notificação do Ministério Público de Pádua, na região do Vêneto, com o aviso de que as certidões de nascimento emitidas na cidade com os nomes de ambas as mães estavam sendo contestadas na Justiça, e marcando data para uma audiência em que será decidido se as certidões são legítimas ou se devem ser anuladas e refeitas sem o nome da mãe não biológica.
Na Itália, crianças provenientes de barriga de aluguel podem ter um único genitor, o biológico. O adulto que não for o pai biológico pode obter direitos de parentalidade por meio de um processo especial de adoção, o qual segundo defensores dos direitos LGBTQIA+, é caro, moroso e emocionalmente danoso para as famílias. O assunto foi parar na Corte Europeia de Direitos Humanos, que na semana passada rejeitou vários recursos de casais contra as restrições existentes na Itália. O tribunal considerou que a lei do país “garante plenamente” o relacionamento entre uma criança e o parceiro de seu pai biológico.
Espanha
Após a vitória da direita nas eleições regionais de maio último, a Espanha começou a viver novos sinais de revés dos direitos civis. Num vilarejo de Valência, um acordo entre os partidos Vox (ultradireita) e PP (centro-direita) decidiu banir o uso da bandeira do arco-íris em prédios públicos, assim como substituir a expressão “violência de gênero” por violência, de maneira genérica, na imprensa oficial. Tal decisão levantou temores de que esse tipo de restrição de direitos ganhe contornos nacionais caso o PP vença as eleições gerais de 23 de julho e forme uma aliança com o Vox.
Recentemente, o Vox colocou um outdoor enorme num prédio de Madri, que mostra os símbolos do feminismo, do comunismo, da independência catalã, da Agenda 2030, além do arco-íris, sendo atirados numa lata de lixo com a mensagem “Decida o que importa” e, ao lado, os temas que, segundo o partido, importam: liberdade, segurança, fronteiras, família, campo, indústria.
A Comissão Europeia, braço executivo da União Europeia, afirma seguir diretrizes claras sobre igualdade de gênero e sobre a proteção de mulheres e meninas contra violência. No passado, o órgão já puniu cidades polonesas que se declararam livres de pessoas LGBTQIA+.
Breve história dessa data marcante
Na madrugada de 28 de junho de 1969, portanto há 54 anos, policiais à paisana fizeram uma batida no bar Stonewall Inn, em Nova York, um dos mais populares entre a comunidade LGBTQIA+ da região. Numa época em que todos os estados estadunidenses tinham leis que proibiam a homossexualidade, o alvo da operação eram locais frequentados por “doentes mentais”, como pessoas LGBTQIA+ eram descritas pela Associação Americana de Psicanálise.
Um grupo resolveu resistir e deu origem a uma manifestação que durou cinco dias. Um ano depois, em 28 de junho de 1970, uma manifestação partiu do local do bar e caminhou em direção ao Central Park, cartão-postal de Nova York, naquela que é considerada a primeira marcha do orgulho LGBTQIA+ no país e, provocou ecos em outros países.
Wikicommons
Dia do orgulho LGBTQIA+ é comemorado nessa quarta-feira (28/06)