O massacre ocorrido no departamento de Nariño (sul da Colômbia), que causou a morte de pelo menos 27 índios da etnia awá entre os dias 4 e 12 de fevereiro, suscitou no país dois importantes debates.
De um lado, a política de Segurança Democrática do governo Alvaro Uribe – que recebe ajuda financeira dos Estados Unidos desde que foi implantada, em 2002, e representa um investimento de 6,5% do PIB colombiano em estratégias militares – tem sido criticada por colocar comunidades indígenas no fogo cruzado do conflito com as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia). De outro, analistas sugerem debilidade moral da guerrilha, acusada de cometer violentos crimes contra a população civil, após ter sido enfraquecida com os ataques e baixas sofridos em 2008 e com a libertação de importantes reféns políticos, como Ingrid Betancourt.
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Mesmo tendo responsabilizado as Farc desde o princípio, a Organização Nacional dos Indígenas da Colômbia (Onic) culpa também o Exército pelo massacre. “O que podem fazer os indígenas, que estão indefesos, quando um grupo como o Exército chega com armas às suas casas buscando informação e tratando de associá-los à guerrilha?”, questiona Luis Fernando Arias, secretário geral da entidade, ao Opera Mundi.
“A Segurança Democrática significou até hoje para a Colômbia uma política de morte. Nos últimos sete anos, assassinaram 1.333 índios, dos quais 58 morreram somente este ano. O conflito armado está acontecendo nos nossos territórios, não nas terras do Uribe. Temos uma posição de autonomia, mas o governo insiste que entremos em seu jogo de estratégia militar”, diz.
Para Luis Eduardo Celis, especialista em Direitos Humanos, a população colombiana deveria questionar a política de segurança. “O plano até hoje não apresentou resultados contundentes. Não consegue cobrir todo o território nacional e, pior, afeta os civis”.
Farc, a “melhor campanha eleitoral do governo”
A discussão sobre uma possível crise moral das Farc foi despertada pela atitude aparentemente paradoxal da guerrilha, que cedeu na libertação de seis seqüestrados entre 1º e 5 de fevereiro e, por outro lado, arremeteu contra os indígenas em Nariño.
Para Alberto Cienfuegos, analista político e membro do grupo Colombianos pela Paz, articulador das libertações, “as Farc devem uma explicação ao país, o que implica reconhecer a autonomia das comunidades indígenas e afrocolombianas”. “O que aconteceu é um absurdo”, declarou ao Opera Mundi.
Um dos agravantes é o fato de os assassinatos terem sido realizados, segundo testemunhas, com “crueldade excessiva”. Segundo Luis Fernando Arias, da Onic, “usaram facas para não alertar o Exército. Há informação de que riam enquanto executavam os indígenas”.
Para muitos, a dualidade que apresenta a guerrilha hoje é prova de seu enfraquecimento, mas não deixa de ser reflexo de uma guerra midiática. “Havia um melhor ambiente, que foi ameaçado. Isso justifica uma reação militar por parte do governo, e os acordos obviamente voltam a caminhar a passos lentos. Não que Uribe não tire proveito disso: as Farc são a melhor campanha eleitoral do governo”, resume Luis Eduardo Celis.
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