Os enfermeiros britânicos deram início nesta quinta-feira (15/12) a uma greve sem precedentes para reivindicar melhores salários. O movimento ocorre diante da crise do custo de vida, que provoca um crescente descontentamento social no Reino Unido.
Até 100 mil integrantes do sindicato Royal College of Nursing (RCN) da Inglaterra, País de Gales e Irlanda do Norte não trabalharão das 8h às 20h. Essa é a primeira greve nacional nos 106 anos de história da organização e será acompanhada por outro dia de paralisação, em 20 de dezembro.
Manifestantes se reuniram nesta manhã diante do St Thomas’ Hospital, no centro de Londres. A categoria pede um acréscimo salarial de pouco mais de 19% para compensar anos sem correção salarial. A reivindicação é considerada “inadmissível” pelo governo.
“Não decidimos entrar em greve de maneira leviana”, declarou Ameera, uma enfermeira londrina participante da mobilização. “Estamos exaustas. Estamos fartas. Precisamos de um aumento salarial para sobreviver”, acrescentou.
O enfermeiro de emergência Mark Boothroyd afirma que o elevado custo de vida provoca dificuldades para pagar as contas, o transporte e o aluguel. Empregado do St Thomas’ Hospital, ele diz que os baixos salários fazem com que os profissionais recém-formados trabalhem na área por apenas um ou dois anos antes de abandonar a profissão.
Estas vagas não são preenchidas, o que aumenta a pressão sobre os demais funcionários. Muitos enfrentam problemas psicológicos devido ao estresse. As condições são “horríveis e não podem continuar”, protesta Boothroyd.
Segundo o RCN, a Inglaterra tem 47 mil postos de enfermagem vagos, em parte devido à “má remuneração”. Muitas enfermeiras e enfermeiros de outros países da Europa deixaram o Reino Unido após o Brexit.
Bancos de alimentos para enfermeiros
Autoridades de saúde pública britânica afirmaram em setembro que alguns enfermeiros começaram a pular refeições para conseguir alimentar e vestir seus filhos. Um em cada quatro hospitais na Inglaterra criou bancos de comida para os funcionários.
O RCN denuncia que os salários da categoria caíram 20% em termos reais desde 2010, resultado de vários anos de reajustes abaixo da inflação. Neste ano, apesar de uma desaceleração de 11,1% em outubro para 10,7% em novembro, a inflação no Reino Unido, permanece no nível mais elevado em quatro décadas.
Royal College of Nursing/Twitter
Manifestantes se reuniram nesta manhã diante do St Thomas’ Hospital, no centro de Londres
A greve acontece enquanto o Serviço Nacional de Saúde (NHS) do Reino Unido sobrevive a base de um financiamento considerado insuficiente há vários anos. Desde a pandemia de Covid-19, as filas são cada vez maiores para os exames médicos, inclusive os relacionados ao câncer.
As autoridades de saúde alertaram os sindicatos que os tratamentos podem ser afetados pela greve, no momento em que as infecções respiratórias sazonais, como a gripe, aumentam a pressão nos hospitais já superlotados.
Onda de insatisfação
Apesar de ser inédita, a paralisação do RCN é a mais recente em uma crescente onda de greves dos setores público e privado, do transporte ferroviário aos policiais de alfândega, passando por paramédicos e professores.
Mas o governo do primeiro-ministro conservador Rishi Sunak afirma que as demandas salariais dos enfermeiros, que pedem a recuperação do poder aquisitivo, não podem ser financiadas com os cofres públicos que foram abalados pela pandemia.
“Nossos enfermeiros são incrivelmente dedicados a seu trabalho e é lamentável que alguns membros do sindicato sigam adiante com a greve”, afirmou o ministro britânico da Saúde, Steve Barclay.
Depois de insistir que negociou com “profissionais de saúde de fora do setor público para garantir níveis seguros de funcionários”, o ministro se declarou “preocupado com o risco que as greves representam para os pacientes”.