“Viva a Itália antifascista” foi a frase dita pelo jornalista Marco Vizzardelli, de 65 anos, durante a abertura oficial do Teatro alla Scala, em Milão, na noite desta quinta-feira (07/12) após perceber a “controvérsia” que o evento abrigava: a presença da senadora italiana Liliana Segre, sobrevivente de Auschwitz, e do vice-primeiro-ministro do governo de extrema-direita da Itália, Matteo Salvini, e também do presidente do Senado, Ignazio La Russa, um dos fundadores do partido radical e governista Irmãos da Itália.
Diante de tal situação, Vizzardelli não foi o único a se manifestar. Gritos como “não ao fascismo”, vindos de outras pessoas, também ecoaram no recinto, durante o espetáculo Don Carlo, de Giuseppe Verdi.
Apesar de proferir palavras óbvias, que inclusive são constitucionalmente legais no país europeu, o espectador do evento foi prontamente identificado pela polícia, como se houvesse cometido um ato criminoso.
Em três momentos, a Constituição da Itália menciona atitudes antifascistas: “É proibida a reorganização, sob qualquer forma, do dissolvido partido fascista”; “Em derrogação ao artigo 48, são estabelecidas pela lei, por não mais de cinquenta anos da entrada em vigor da Constituição, limitações temporárias ao direito de voto e à elegibilidade para os chefes responsáveis dos regime fascista” e na escolha de senadores e deputados ” que tenham expiado uma pena de reclusão não inferior a cinco anos a seguir a uma condenação tribunal especial fascista para a defesa do Estado”. Apesar disso, Vizzardelli foi abordado pela polícia italiana após gritar que a Itália era antifascista.
Segundo relato do cidadão à agência italiana Ansa, durante a metade do primeiro ato teatral um policial disfarçado se aproximou e pediu que mantivesse a calma. Quando o ato acabou, pediu que se identificasse a ele. No entanto, Vizzardelli argumentou que não havia feito nenhum ato errado.
“Eu ri disso, disse aos policiais que eles teriam que me amarrar e me prender se eu dissesse 'viva a Itália fascista'. Eles começaram a rir também, mas me disseram que tinham que fazer assim. E então tiraram uma fotografia da minha carteira de identidade” contou o jornalista `à Ansa.
O jornalista ainda declarou que “não esperava todo esse clamor”, uma vez que é “evidente e constitucional” a Itália ser antifascista. “Não fiz nada de errado nem cometi nenhum crime. Eu disse 'viva a Itália antifascista', uma frase muito normal”.
Apesar das aparências amenas da situação, Vizzardelli reconhece que a necessidade de sua identificação foi “perturbadora”, fazendo-o questionar o clima político da ´Itália: “não posso deixar de duvidar que estejamos no limiar de um Estado parafascista”.
Identificando-se como “no máximo um liberal de esquerda”, Vizzardelli afirmou que “não suporta qualquer vago cheiro de fascismo e racismo”, criticando Salvini e La Russa.
Apesar de La Russa não se pronunciar sobre as manifestações antifascistas, chegando até mesmo afirmar que não ouviu nenhum grito, Salvini declarou que “se alguém vai ao La Scala para gritar ou assobiar, há um problema uma vez que o teatro você vai para ouvir, não para gritar”, segundo o portal Barcelos na Net.
Sobre a resposta de Salvini, Vizzardelli afirmou que foi “um serviço prestado inesperado”. “Sua reação me convenceu de que fiz a coisa certa e faria de novo”, declarou à Ansa.
Ignazio La Russa/Twitter
Políticos italianos em ´´ópera, entre eles senadora Liliana Segre, sobrevivente do Holocausto, e la Russa, fundador de partido radical
Reações
Diante do esforço da Polícia de Milão em identificar Vizzardelli, alguns políticos italianos pautaram a estabilidade da democracia no país europeu.
“Só uma curiosidade, mas era mesmo necessário “identificar” alguém que grita “viva a Itália antifascista?” Digo isso com muito respeito por quem fez o pedido”, afirmou por meio das redes sociais o deputado Ettore Rosato.
Solo una curiosità, ma era proprio necessario “identificare” uno che grida “viva l’Italia antifascista?” Lo dico con grande rispetto per chi ha eseguito l’ordine… pic.twitter.com/LPt9Cc1Y9o
— Ettore Rosato (@Ettore_Rosato) December 8, 2023
O senador do Partido Democrata, Francesco Verducci disse: “No La Scala, após o hino nacional, Loggione cantou ‘Viva a Itália Antifascista!’ Eu pensei: ‘É isso! é a nossa República!’ Depois li que o homem foi identificado pelo Digos [Polícia de Milão]. Espero que ele receba um pedido de desculpas. Viva a Itália antifascista é dizer viva a República”.
Alla Scala dopo l’inno nazionale dal Loggione è stato scandito ‘Viva l’Italia Antifascista!’ Ho pensato: ‘È così! è la nostra Repubblica!’ Poi leggo che l’uomo è stato identificato da Digos. Spero gli siano fatte delle scuse. Viva l’Italia antifascista è dire viva la Repubblica.
— Francesco Verducci (@cescverducci) December 8, 2023
Já secretário do partido Mais Europa, Riccardo Magi, falou sobre “um declive preocupante” quando identificam “aqueles que expressam as suas ideias como em um slogan pacífico e constitucional”. “Eu chamo isso de intimidação”, finalizou.
Ieri mattina gli attivisti di @Piu_Europa e @LegaleMeglio sono stati identificati dalla Digos dopo la manifestazione davanti piazza Montecitorio, piazza che siamo riusciti a ottenere dopo una trattativa in loco con la questura e solo grazie alla presenza di parlamentari, visto…
— Riccardo Magi (@riccardomagi) December 8, 2023