O forte clima de tensão está se acalmando aos poucos no Senegal, onde os confrontos, mesmo de menor intensidade agora, ainda fizeram uma nova vítima no sábado (03/06), elevando o número oficial de mortos para 16 desde a condenação, na quinta-feira (01/06), do oponente senegalês Ousmane Sonko a dois anos de prisão.
Os senegaleses continuam temendo a prisão do pré-candidato à corrida presidencial de 2024. Enquanto os campos de Sonko e do presidente Macky Sall se culpam mutuamente pela violência e pelas mortes, o governo decidiu cortar “temporariamente” o acesso à internet por telefone.
Em um comunicado de imprensa divulgado no domingo (04/06), o Pastef, partido de Sonko, condenou “a repressão assassina das forças de defesa e segurança” e acusou as autoridades de usarem “milícias privadas” para “subjugar” a população civil. O texto afirma que o número de mortos chega a 19 entre os manifestantes.
A oposição continua exortando os senegaleses “a se defenderem por todos os meios e a revidar”.
O governo, por sua vez, denuncia “atos de vandalismo e banditismo”, obra dos partidários do Sonko apoiados por “forças ilegais”, “estrangeiros” que vêm “desestabilizar o país” e “mergulhá-lo no caos”.
Muitos prédios e estabelecimentos comerciais foram destruídos em Dacar, mas também em Ziguinchor, cidade do sul do país onde Ousmane Sonko é prefeito. Uma unidade da Aliança Francesa foi incendiada e vandalizada, assim como o centro cultural regional e algumas escolas.
Manifestantes armados
O diretor de Segurança Pública, Ibrahim Diop, declarou na noite de domingo que os manifestantes detidos estavam armados com coquetéis molotov, facas e armas de guerra. O ministro do Interior anunciou no sábado cerca de 500 detenções.
Em um comunicado de imprensa divulgado no domingo, a Cruz Vermelha anunciou que resgatou 357 manifestantes feridos, incluindo uma mulher grávida, e 36 membros das forças de defesa e segurança desde o início dos distúrbios. Entre eles, 78 estavam gravemente feridos.
Juristas e sociedade civil denunciam abusos. O advogado Abdy Nar Ndiaye defende diversas pessoas presas nos últimos dias. “São jovens, adultos ou até idosos. Eles são acusados de participar de manifestações não-autorizadas e de perturbar a ordem pública”, explica.
A Liga Senegalesa de Direitos Humanos denuncia violações de direitos. De acordo com a organização, houve excesso de brutalidade durante as prisões e custódia policial. “É verdade que as manifestações saíram de controle, mas isso não autoriza abusos, o que estamos documentando e que não vamos deixar impune”, afirma um porta-voz.
Twitter/Ousmane Sonko
Pré-candidato à corrida presidencial de 2024 e acusado por corrupção de menor, Ousmane Sonko
Desconectados
O governo suspendeu, no domingo, o acesso à internet a partir de telefones “devido à disseminação de mensagens odiosas e subversivas”. As redes sociais, como WhatsApp, Facebook e Twitter, já estavam indisponíveis.
“A Internet de dados móveis está temporariamente suspensa durante determinados horários”, informava o comunicado de imprensa do Ministério das Comunicações.
As manifestações começaram na quinta-feira em resposta à condenação a dois anos de prisão do opositor Ousmane Sonko, declarado candidato presidencial para 2024. Ele foi acusado de ter induzido uma jovem com menos de 21 anos à “depravação”.
Esta decisão o torna inelegível por enquanto. Sonko, popular entre os jovens, tem clamado desde o início do caso por uma conspiração do presidente Macky Sall para eliminá-lo politicamente.
O ministro senegalês da Justiça, Ismaila Madior Fall, declarou que Sonko pode ser preso “a qualquer momento”. Essa prisão poderia relançar o ciclo de violência.
Ousmane Sonko afirma estar “isolado” em sua residência em Dacar por forças de segurança que impedem a aproximação de qualquer pessoa. Ele não falou publicamente desde sua condenação.
Representante dos jovens
Na noite de sábado, um dos líderes da coalizão de oposição, o prefeito de Dacar, Barthélémy Dias, pediu ao presidente Macky Sall que se manifestasse e desistisse de uma candidatura para um terceiro mandato.
Depois de diversas declarações em que afirmou que não iria concorrer em 2024, Macky Sall lança agora dúvidas sobre uma candidatura.
“[Esta situação] Era previsível”, avalia Elimane Haby Kane, presidente do think tank Legs Africa, em entrevista à RFI. “Os sinais de alerta já existiam há muito tempo. O pano de fundo é a situação dos jovens, abandonados [no país]”, explica.
Hoje, 25% da população do Senegal tem menos de 35 anos. “A raiva social se sente representada por Ousmane Sonko, o líder político mais virulento contra o poder”, afirma Kane.
Os apelos à calma e ao diálogo se multiplicaram nos últimos dois dias por parte de diversos países, como França e Estados Unidos, e de organismos internacionais.