Três dias após ter enviado tropas para ocupar todas as fábricas processadoras de arroz da Venezuela, em represália pela produção baixa, o presidente Hugo Chávez anunciou ontem (3) a criação de cotas de produção para uma série de bens básicos com preços tabelados.
O confronto com os produtores de arroz foi justamente provocado pela questão do controle dos preços, introduzido em 2003 para travar a inflação e aumentar o acesso das camadas mais pobres da população à alimentação. Segundo a lei venezuelana, um quilo de arroz branco tem de ser comercializado nos mercados a 2,18 bolívares fortes*, cerca de um dólar – em janeiro, o preço médio do quilo do arroz branco tipo 1, o mais barato, estava um pouco mais caro que isso no estado de São Paulo (2,64 reais, ou cerca de 1,1 dólar) e mais barato no Rio Grande do Sul (2,02 reais, ou 0,83 dólar), segundo o site Arroz Brasileiro.
Produtores venezuelanos asseguram que custa o dobro do valor de 2,18 bolívares fortes só para fazer o produto chegar aos supermercados. O governo argumenta que a lei combate a especulação e protege os pobres da alta nos preços dos produtos de primeira necessidade.
Para se esquivar da lei, as empresas privilegiam produtos mais elaborados, ausentes da lista governamental. No caso do arroz, basta, por exemplo, produzir variedades com sabores variados para fugir do tabelamento. O ministro da Agricultura, Elias Jaua, alega que essa é a estratégia da fábrica de alimentos Polar, a maior do país, acusada de produzir somente 10% de arroz branco.
Mais 11 produtos
De hoje em diante, as empresas não terão mais esta liberdade. O arroz branco terá de representar pelo menos 80% da produção deste cereal. A medida inclui 11 outros produtos (macarrão, molho de tomate, açúcar, queijo, café, óleo comestível, leite em pó e pasteurizado, margarina, maionese e farinha de milho), com cotas variando entre 70% e 95%. No caso de empresas que produzem exclusivamente variedades fora do tabelamento, como leite com chocolate, será necessário obter uma permissão especial para continuar produzindo.
O anúncio foi recebido com críticas pelo setor empresarial, que denuncia a falta de reajuste para acompanhar a inflação, a mais alta da América Latina: cerca de 30% ao ano. Só em 2008, o preço dos alimentos subiu 43%, em média.
Em resposta, Hugo Chávez advertiu que caso as empresas resistam a cumprir a nova lei, poderá expropriá-las. “Se eles pararem a produção, eu exproprio, sem problema, mas pago com títulos da dívida, não com dinheiro vivo”.
A Venezuela enfrenta crescente dificuldade para cumprir suas obrigações financeiras em um contexto de queda dos preços do petróleo. Ao contrário de crises anteriores, o governo hoje tem um colchão de mais de 40 bilhões de dólares em reservas. Mas o preço do petróleo, que representa 93% das receitas do país, não para de cair. O barril do óleo venezuelano fechou a semana passada em 36,80 dólares, contra um preço médio em 2008 de 86,81 (e, ainda, 64,74 em 2007 e 56,45 em 2006).
“A magnitude da queda das receitas do petróleo em 2009 será entre 60% e 75%, o que significaria uma contribuição fiscal de 10 a 15 bilhões de dólares, para um orçamento de 35,9 bilhões”, calcula o economista venezuelano Orlando Ochoa. Crítico das políticas do governo, ele considera que a decisão de estabelecer cotas é “defasada” e não resolve o problema da baixa produção de alimentos.
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Veja entrevista com Orlando Ochoa.
* Há um ano, o governo venezuelano cortou três zeros do bolívar, numa tentativa de fortalecer a moeda, portanto 1000 bolívares equivalem a 1 bolívar forte. As duas moedas ainda estão em circulação.
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