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Alguns setores industriais e econômicos vão lucrar com o aquecimento do planeta
Apesar da maior parte dos climatologistas afirmarem que as mudanças climáticas causadas pela humanidade são um fato, quase 25% dos norte-americanos ainda acreditam que o aquecimento global é uma grande lorota.
Nos Estados Unidos, as principais empresas petrolíferas internacionais destinam uma grande quantidade de dinheiro para alimentar o ceticismo sobre o clima. Mas, embora elas tentem manter o público ignorante, os grandes grupos deste setor estão bem informados e se preparam para lucrar com um planeta mais quente. E não são os únicos. As mudanças climáticas causadas pela humanidade, provocadas pela queima de combustíveis fósseis e a decorrente emissão desenfreada de dióxido de carbono na atmosfera, podem ser uma catástrofe para a maioria das espécies, humanas e não humanas, do planeta. No entanto, para alguns setores industriais e econômicos, o aquecimento global representa apenas uma nova oportunidade de ganhar dinheiro.
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Aqui estão alguns deles:
1. Grandes Petroleiras
Em seu site, a empresa ExxonMobil diz acreditar “que é prudente desenvolver e implementar estratégias voltadas para os riscos de a sociedade produzir uma quantidade cada vez maior de emissões (de gases do efeito estufa)”. Esta não parece ser uma empresa negando que as mudanças climáticas existem.
De um modo semelhante, a Shell, já nos anos 1980, começou a se planejar para o fim da era dos combustíveis fósseis. ”Parecia inevitável que nós iríamos descarbonizar por diversas razões”, disse Peter Schwartz, que na época era diretor de ações da Shell voltadas para o futuro. Em 1998, depois de um estudo interno, a Shell de fato estabeleceu a meta de reduzir suas emissões de gases do efeito estufa em até 10% dentro de quatro anos. Dez anos depois, chegou a defender a fixação de um imposto sobre o carbono em vez de uma estratégia de limitação de vendas, que considerou mais prejudicial aos lucros da empresa.
Agora o mundo mais quente apresentou às grandes petroleiras novas maneiras de ganhar dinheiro. A Exxon firmou uma parceria com a Rússia para buscar novos lugares de prospecção de petróleo nos mares do Ártico. Com o gelo do mar derretendo rapidamente, os verões estão ficando mais longos e é mais fácil procurar combustível fóssil nas terras anteriormente congeladas. A Shell investiu mais de 6 bilhões de dólares até o momento em perfurações no Ártico. Com cerca de 27 bilhões de barris de petróleo repentinamente mais acessíveis, as grandes petroleiras se preparam para lucrar com o mundo mais quente que ajudaram a criar. “Serei uma das pessoas mais animadas com um verão interminável no Alasca”, chegou a dizer um ex-executivo da Shell em uma conferência de comércio exterior.
2. Biotecnologia
Uma espécie que não vai se incomodar com um planeta mais quente é o mosquito. Por ter o clima quente e abafado como uma condição ideal, o mosquito e as doenças que ele transmite vão proliferar nas próximas décadas.
Empresas de biotecnologia esperam ganhar dinheiro com a crise causada pelo clima. A companhia britânica Oxitec criou um mosquito macho geneticamente modificado que gera descendentes que requerem certos nutrientes indisponíveis na vida selvagem, resultando na morte dos mosquitos jovens. Embora a meta de eliminar, ou pelo menos reduzir drasticamente, o número de mosquitos transmissores de doenças seja louvável, o método não é popular entre muitos ambientalistas, que temem as consequências não previstas com o lançamento de milhões de mosquitos transgênicos na natureza.
3. Controle de enchentes
Há anos os climatologistas alertavam para a elevação do nível dos mares e a ameaça para as cidades costeiras, mas em grande parte a advertência não era ouvida. Os furacões Katrina e Sandy, que atingiram os EUA nos últimos anos, mudaram isso. O Katrina submergiu 80% da cidade de Nova Orleans em 2005, enquanto o Sandy inundou bairros inteiros e túneis do metrô em Nova York em 2012. Estas catástrofes climáticas custaram bilhões de dólares aos EUA e, mesmo passados alguns anos, as cidades afetadas ainda não se recuperaram completamente.
[A cidade de Venice, na Louisiana, debaixo d'água após a passagem do furacão Katrina. Foto: NOAA / Flickr CC]
Daí entra a indústria de “adaptação às mudanças climáticas”, incluindo empresas como a Flood Control America (FCA), que constrói paredes invisíveis de aço que as cidades podem erguer rapidamente diante da ameaça de grandes tempestades. “Há dinheiro demais investido em imóveis costeiros – comerciais, municipais e residenciais – para que propriedades sejam abandonadas em razão da elevação do nível dos mares”, disse Bryan Fryklund, um executivo da FCA. A empresa construiu barreiras de contenção de águas de enchentes ao redor da sede da gigante de comunicações Verizon e do Belleuve Hospital, em Nova York, e da Autoridade Portuária de Nova Jersey.
O planejamento para desastres causados por inundações é um setor que atualmente movimenta quase 1 bilhão de dólares nos EUA e a expectativa é que dobre de valor até 2020. “A questão não é se esse setor vai explodir, mas em qual dimensão”, disse Grant Ferrier, o fundador da empresa de marketing Environmental Business International. Enquanto isso, empresas holandesas como a Dutch Docklands, localizadas em um país abaixo do nível do mar e especialistas em manter o oceano à distância, estão felizes por compartilhar seus conhecimentos – por um preço.
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Tim J Keegan / Flickr CC
Lago Hume, na Austrália, reduzido a 4% de sua capacidade durante grande seca em 2007
4. Ar condicionado
É algo lógico que à medida que a Terra ficar mais quente, os seres humanos vão fazer esforços para se refrescarem. O vencedor nesse cenário é a indústria do ar condicionado. Em muitas áreas dos EUA estes aparelhos são relativamente desnecessários. Não será assim em um planeta aquecido pelo dióxido de carbono. Quando a temperatura subir em partes do mundo antes confortavelmente frescas, a indústria dos condicionadores de ar vai lucrar bastante.
5. Agronegócio
A Monsanto, gigante do agronegócio, é odiada pela maioria dos ambientalistas. Isso, no entanto, nunca a impediu de ganhar rios de dinheiro – e nem as mudanças climáticas conseguirão isso. “Seca” é apenas uma nova palavra para “oportunidade” na língua do agronegócio. Como uma das líderes na controversa indústria dos transgênicos, a Monsanto está trabalhando duro no desenvolvimento de sementes geneticamente modificadas resistentes à seca. E apesar de haver métodos convencionais que resultam em sementes tão ou mais resistentes à seca do que a variedade transgênica, a Monsanto mantém a venda de seus produtos na África e outros mercados propensos à seca, obtendo enorme lucro.
6. Mercado financeiro
Bons tempos, tempos ruins: nada importa para o mercado financeiro, sempre capaz de se adaptar para descobrir novas maneiras de ganhar dinheiro praticamente a partir de qualquer coisa. Empresas de Wall Street investem em fundos que negociam com derivativos climáticos, apostando a favor ou contra desastres ambientais. Outras companhias estão comprando o acesso a água, antecipando-se à escassez mundial. Algumas, como a Goldman Sachs e a Morgan Stanley, estão orientando clientes ricos a adquirirem terras agrícolas, apostando que um mundo mais quente vai precisar de produção confiável de alimentos.
7. Transportes marítimos
Grandes empresas de navegação tradicionalmente tinham de atravessar o Canal de Suez ou fazer percursos ainda maiores para entregar mercadorias. A Passagem do Nordeste, rota que conecta os oceanos Pacífico e Atlântico através do oceano Ártico, não era uma opção de tráfego marítimo por causa do gelo. Graças ao aquecimento global, porém, o que anteriormente era uma rota que somente podia ser usada com um quebrador de gelo abrindo caminho para os cargueiros tornou-se mar aberto com poucos blocos de gelo facilmente contornáveis. Quebradores de gelo já não são necessários. Economizando cerca de 300 mil dólares por navio, as empresas do setor esperam milhões de dólares anuais de lucro.
[Oficiais da Guarda Costeira dos EUA analisam efeitos das mudanças climáticas e derretimento do Ártico. Foto: NASA]
8. Dessalinização
Onde alguns veem desastre, outros veem oportunidades. É o caso da Israel Desalination Enterprises. Observando as tendências em estações de esqui em todo o mundo e o aumento das temperaturas e o decréscimo na quantidade de neve natural, o IDE se mexeu rapidamente e, usando seus métodos de osmose reversa que permitem fabricar neve em clima quente, tem mantido os esquiadores deslizando pelas pistas. O IDE também fabrica usinas de dessalinização que transformam água salgada em água potável, uma necessidade que algumas cidades já estão estudando num mundo cada vez mais seco.
9. Mineração
Em 2012, 97% da cobertura de gelo na Groenlândia derreteu durante os meses de verão – foi a primeira vez que isso aconteceu em 123 anos. Essa foi uma notícia arrasadora para climatologistas e para o mundo em geral, mas uma boa ocasião para companhias mineradoras, que agora têm a chance de cavar em áreas do Ártico antes cobertas por uma espessa camada de gelo em busca de minerais valiosos como zinco, ferro, urânio, cobre e ouro. Apesar das preocupações ambientais com relação à mineração e a poluição que ela acarreta, a Groenlândia abriu as portas para as mineradoras para dar emprego à população. Enquanto isso, a Alcoa, gigantesca empresa de alumínio, espera construir uma imensa fundição na região, alimentada pelo fluxo de água proveniente do derretimento do gelo.
Tradução: Maria Teresa de Souza
Matéria original publicada no site norte-americano AlterNet.